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  15/12/2021 - por Fernanda Kelen





 

Em 20 de maio deste ano, o Ministério da Economia emitiu a Instrução Normativa (IN) nº 54, que dispõe sobre os critérios e procedimentos gerais a serem observados pelos órgãos e entidades integrantes do Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal (Sipec), nas situações de paralisação decorrentes do exercício do direito de greve, trazendo orientações para o desconto da remuneração e para a elaboração do Termo de Acordo para compensação de horas não trabalhadas.

 

A referida Instrução Normativa obriga os órgãos e entidades a informarem ao Ministério a ocorrência de paralisação das atividades, seja total ou parcial, devendo ainda manter atualizadas as informações relativas ao número de aderentes e às datas de início e de fim da paralisação, registrando tais informações em um sistema eletrônico designado para esta finalidade.

 

Prevê a IN nº 54 que ‘‘a Administração Pública Federal deve proceder ao desconto da remuneração correspondente aos dias de paralisação decorrentes do exercício do direito de greve pelos servidores públicos’’.

 

Nesse ponto, destaca-se que a normativa basicamente reproduziu um trecho da tese de repercussão geral firmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no ano de 2016, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 693.456/RJ, no qual a Corte entendeu que a greve enseja a suspensão do vínculo funcional.

 

A mencionada decisão foi e continua sendo alvo de críticas por parte de entidades representativas dos direitos dos servidores públicos, uma vez que o direito de greve é um direito fundamental constitucionalmente assegurado, de modo que o desconto imediato dos dias parados esvazia o movimento, revelando-se uma penalidade ao servidor que adere à mobilização.

 

Além disso, o posicionamento do STF acaba por criar uma presunção de que toda greve é abusiva, impedindo o pleno exercício desse direito.

 

Cabe evidenciar que a Lei nº 7.783/89, a qual regula o exercício do direito de greve na iniciativa privada, aplicando-se também aos servidores públicos, conforme as balizas definidas pelo próprio STF, não traz previsão sobre o corte de ponto, apenas determina que as relações obrigacionais, durante o período, devem ser regidas por acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho.

 

A supracitada Instrução Normativa também faculta aos órgãos e entidades a celebração de Termo de Acordo, com o objetivo de permitir a compensação das horas não trabalhadas pelos servidores e a devolução dos valores já descontados a esse título, desde que com anuência do órgão central Sipec.

 

Assim, no caso das Universidades, por exemplo, tal disposição pode significar uma relativização da autonomia, visto que a celebração do acordo dependerá de um órgão externo.

 

Segundo a IN nº 54, a compensação deve ocorrer no início ou no final do expediente, sem prejuízo do cumprimento da jornada de trabalho a que estiver sujeito o servidor e dentro do horário de funcionamento da unidade.

 

Ademais, a normativa determina que a restituição dos valores descontados ocorrerá à medida que as horas sejam efetivamente compensadas.

 

Outro dispositivo que suscita debates é o Artigo 5º da IN nº 54, o qual estabelece que ‘‘o Termo de Acordo somente poderá ser estabelecido se a motivação da greve tiver conexão com aspectos abrangidos pelas relações de trabalho, no âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional’’.

 

Vislumbra-se que este artigo traz certa subjetividade na definição do que representaria uma greve motivada por aspectos abrangidos pelas relações de trabalho, chamando a atenção para movimentos fundamentados em projetos de lei ou propostas de Emenda à Constituição, por exemplo.

 

Portanto, longe de se esgotar a questão, propõe-se uma reflexão sobre o direito de greve do servidor, cujo exercício não pode ocasionar prejuízos, perseguições ou retaliações, pois que se trata de um instrumento legítimo de reivindicação por direitos, benefícios, melhores condições de trabalho e contra a retirada de conquistas históricas.

 

* Fernanda é advogada do Escritório Gomes e Bicharra Advogados Associados, que presta assessoria jurídica à ADUA.



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