Documento sem título






     Artigos




  25/10/2021 - por Isaac W. Lewis





 

Sabemos que, ao longo da história da humanidade, temos vivido em dois mundos distintos. O mundo dos seres humanos exploradores de seres humanos e o mundo dos seres humanos explorados por seres humanos. No primeiro mundo, sempre houve pedagogos que negaram o acesso à verdade e ao conhecimento aos habitantes do mundo dos explorados. Diziam ser essa negação meramente educacional. Nunca declararam que suas teorias e ações pedagógicas eram políticas, porém quando alguém do mundo dos explorados postulava o direito de acesso à verdade e ao conhecimento por parte de todos os explorados, logo os pedagogos do mundo dos exploradores afirmavam ser essa postulação uma atividade política e não educacional.

 

Não precisamos rememorar as práticas educacionais discriminatórias na pré-história, nas civilizações egípcias, persas ou indianas, realizadas por sacerdotes a serviço das classes privilegiadas e favorecidas e que visavam manter a maioria da população ignorante, analfabeta e preconceituosa. Podemos começar com as disputas políticas no campo da educação a partir das descobertas de Nicolau Copérnico (1473-1543), Galileu Galilei (1564-1642), Johann Kepler (1571-1630). A partir dessas descobertas, os educadores, pedagogos, professores, filósofos perceberam que o ensino pré-histórico mantido pela Igreja Católica na Idade Média na Europa não servia para possibilitar aos seres humanos adquirir conhecimentos da realidade material, da realidade natural e da realidade humana.

 

Papas, bispos, padres e pastores lutaram contra a divulgação dos novos conhecimentos. Na verdade, tentaram negar, refutar que os conhecimentos científicos eram verdadeiros. O negacionismo não nasceu no Brasil e nem teoria é. Na verdade, é uma opinião de algumas pessoas privilegiadas, favorecidas e desfavorecidas que insistem em negar a existência da verdade científica para manter a ignorância, a estupidez e a hipocrisia religiosa em todo mundo. Católicos e protestantes fugiram da Europa para América, África e Ásia para inculcar suas opiniões pré-históricas e negar as novas descobertas científicas que estavam sendo realizadas na Europa. Ordens religiosas chegaram à América com os invasores portugueses e espanhóis e os peregrinos e invasores ingleses também chegaram à América. Todos massacraram povos pré-colombianos e batizaram os sobreviventes com o cabo de suas espadas imitando uma cruz. Entretanto o mundo mudou, a ciência avançou, a educação também mudou. Mas alguns descendentes de ingleses, portugueses e espanhóis insistem em defender opiniões medievais, negam que a terra, os planetas, os satélites, as estrelas giram, que todos os seres evoluem, que a educação também evoluiu e que a humanidade deseja mudanças e evolução. Por isso, não compreendem Paulo Freire, o educador reconhecido em todos os mundos.

 

Na Europa, a partir das descobertas cientificas no século XVI, das teses defendidas pelos filósofos do Iluminismo no século XVII e pelos revolucionários franceses no século XVIII, educadores e professores envidaram esforços para transformar as escolas e torná-las centros de construção e de difusão de conhecimentos científicos e tecnológicos. Nasce a Escola Nova. No Brasil, as ordens religiosas, as escolas particulares e os egressos dessas escolas continuaram mantendo a educação medieval, profissionalizante, que preparavam os filhos das classes favorecidas para cargos privilegiados e instruíam os filhos dos pobres para atividades domésticas ou manuais. A partir do século XIX, vários educadores começaram a refletir e a pensar numa educação que democratizasse o conhecimento científico e tecnológico para os filhos e filhas de todos os brasileiros. Vale ressaltar, nesse momento, a experiência da escritora negra que tentou criar uma turma mista (meninos e meninas) em Guimarães (Maranhão). A partir da década de 1930, vários educadores, professores e cientistas publicaram artigos e manifestos a favor de uma educação pública, igualitária para todas as crianças brasileiras. Entre esses educadores, vale ressaltar as propostas de reformas educacionais de Anísio Teixeira. Para esses educadores, a sociedade brasileira, constituída de classes favorecidas e desfavorecidas, ignorantes e analfabetas, precisava de uma educação nova para contribuir com o desenvolvimento cultural e científico do país. As Campanhas de Alfabetização realizadas pelos governos federais, até então, visavam ensinar os educandos a escreverem seu nome para votarem nos candidatos nas eleições, mantendo, dessa maneira, o país na estagnação, na miséria e no atraso educacional e cultural, ou seja, essas campanhas produziam, institucionalmente, analfabetos funcionais, analfabetos políticos e até doutores analfabetos, de interesse das classes favorecidas. Obviamente, as classes conservadoras não concordavam com a expansão de ensino e nem com a melhoria de sua qualidade, principalmente, para as classes desfavorecidas.

 

Nesse contexto, na década de 1960, Paulo Freire propôs uma forma de alfabetização que possibilitava aos alunos não só lerem letras, sílabas e palavras, como também compreenderem o significado das palavras e a mensagem do texto. Em março de 1964, ele foi preso pelas Forças Armadas por ensinar “alfabetização com conscientização”. Foi libertado setenta dias depois. Por sua contribuição à educação, Paulo Freire recebeu, em 1975, o Prêmio Internacional de Educação da UNESCO. Também recebeu o título de Doutor Honoris Causa por várias universidades estrangeiras. Em seu livro Pedagogia do oprimido, Paulo Freire, analisa e postula o direito de professores e alunos das classes oprimidas comprometerem-se, crítica e seriamente, com a construção de seu conhecimento tanto da realidade natural quanto da realidade social para sua libertação da opressão produzida por essa realidade.

 

*Isaac Warden Lewis é professor aposentado da Faculdade de Educação/Ufam.



Galeria de Fotos