Assim como ocorreu nas mudanças nas leis trabalhista e da aposentadoria, o governo Bolsonaro tem justificado a Reforma Administrativa (PEC 32) apoiando-se em falsos argumentos e mentiras deslavadas.
Por trás do “combate aos privilégios”, “aumento da produtividade” e do “necessário ajuste fiscal” estão as verdadeiras intensões do Planalto. Como um cavalo de Tróia, a PEC 32 tem embutida ataques que poderão simplesmente acabar com o serviço público no Brasil.
O fim da estabilidade para determinados cargos, por exemplo, terá inúmeros desdobramentos. Ao contrário do que Bolsonaro e sua equipe quer que as pessoas acreditem, a estabilidade é importante não só para o servidor, mas para toda população.
Sem essa forma de proteção, trabalhadores do setor público estarão completamente suscetíveis às pressões e ao assédio dos políticos. A ameaça da demissão poderá ser usada para que o servidor não realize sua tarefa corretamente.
Trabalhadores do Ibama, por exemplo, poderão ser pressionados a não fiscalizarem situações criminosas como as queimadas, que sob o comando de Jair Bolsonaro aumentaram exponencialmente nos últimos anos.
Esquemas de corrupção também terão caminho livre. Casos como o da compra de vacinas superfaturadas jamais chegariam ao conhecimento da população. Foi um concursado que trouxe à tona o esquema que poderia gerar um rombo de R$ 1,6 bilhão aos cofres públicos.
Desemprego e piora nos serviços
As possíveis demissões comprometem a própria oferta de serviços à população. Áreas sensíveis como a Saúde e a Educação, que já sofrem com a falta de profissionais, poderão enfrentar cenários ainda piores.
Nos últimos três anos, após a publicação do Teto de Gastos, a taxa de reposição de funcionários que se aposentam é a menor da série histórica. A consequência da falta de servidores penaliza os mais pobres, que deixam de ser atendidos.
Além disso, este cenário terá impacto nas economias das cidades, especialmente no interior do país. Segundo a Relação Anual de Informações Anuais (Rais), em mais de um terço dos municípios, a administração pública concentrava 50% ou mais dos empregos formais.
Apadrinhamento
A Reforma Administrativa também planeja mudanças na contratação dos funcionários públicos, equiparando ao que já é praticado na iniciativa privada. Um dos novos dispositivos abre margem para a efetivação baseada no apadrinhamento ou a famigerada “indicação”.
Assim, uma pessoa melhor classificada na prova de competência poderá ser preterida por outra que tenha algum conhecido na administração pública. A mudança trará uma queda na qualidade dos serviços prestados.
Uma nota técnica elaborada pela Consultoria de Orçamentos, Fiscalização e Controle do Senado defende que até 1 milhão de vagas acabem preenchidas pela “livre nomeação”, ou seja, ocupadas não por servidores concursados, mas por indicações políticas.
Bolsonaro é conhecido pelo seu nepotismo, envolvendo não somente os filhos, mas inúmeros amigos e parentes na política. Hoje o presidente da República pode nomear 6 mil pessoas para cargos comissionados. Com a reforma administrativa, esse número iria a 90 mil.
Outra mudança é a preferência pela contratação de servidores em processo simplificado e por contratos temporários. Especialistas em políticas públicas alertam que a alteração é “genérica” demais e abre brecha para a terceirização sem limites de serviços públicos.
Consequências na Saúde
Em meio a pandemia de covid-19, que já matou mais de 543 mil brasileiros, é fundamental evidenciar as consequências diretas da reforma Administrativa na Saúde. A situação que já é ruim poderia ser muito pior sem a oferta de um serviço gratuito como o SUS.
Além disso, os principais produtores de vacinas no Brasil, Instituto Butantan e a Fundação Oswaldo Cruz são órgãos governamentais. O nível de excelência praticado por ambos está diretamente ligado a estrutura do funcionalismo público.
O desenvolvimento da ciência, tão importante para dar respostas as crises sanitárias como a da covid-19, é comprometido pela PEC 32. Sem independência e à mercê dos interesses políticos, o desenvolvimento das pesquisas não mais atenderá as necessidades do povo.
Privatizações
Sob a reforma Administrativa, as privatizações vão ganhar ainda mais incentivo. Direitos como Saúde e Educação, garantidos pela Constituição, poderão virar mercadorias. Isso porque a PEC 32 radicalizará a relação entre o púbico e o privado.
Aprofundando as Participações Público Privado (PPP), os instrumentos de cooperação previstos permitirão que empresas executem serviços púbicos utilizando a estrutura já existente. Uma transferência explícita de riqueza pública ao setor privado.
*Claudia Costa é jornalista da CSP-Conlutas
**Texto publicado originalmente no site da CSP-Conlutas no dia 20.07.2021
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