Sr. Ministro
Inicio esta missiva invocando uma faceta sua, pouco conhecida do grande público: a de teórico da sexualidade. Li com grande interesse a obra “Sexo e Poder”, em que teorizaste junto a importantes pensadores do tema, como Olgária Matos, Maria Rita Kehl e Jean-Claude Bernardet, constelação que compôs a obra, inclusive, sob a tua batuta de coordenador.
Lembro-me de que o papel da sexualidade nas relações de poder é situado por ti no âmbito das relações mais sutis, invisíveis. Afirmaste ainda que o autoritarismo mais eficaz não é visto a olho nu, ainda que possa ser tão eficiente quanto a polícia ou as instituições judiciárias.
Sendo assim, no campo da sexualidade, tal autoritarismo é uma das várias manifestações deste poder invisível, subterrâneo, que age na penumbra, entranhando-se até mesmo nas sociedades de aparência a mais democrática. E, concluíste afirmando que a sexualidade tem estado comprometida com as relações de dominação existentes ao longo destes anos de civilização.
Em sua reflexão, no capítulo 1 do referido livro, utilizando-se de referencial marxista, criticaste Freud por estabelecer uma espécie de hierarquia do prazer, onde o gozo do trabalho agradável ou das obras de arte seriam menos intensos do que aqueles produzidos por instintos mais grosseiros e primários. Baseaste sua crítica na constatação de que faltava à teoria freudiana uma compreensão adequada e mais abrangente de trabalho, que pudesse dicotomizar a insatisfação com o exercício do trabalho alienado do incomensurável prazer que emana da atividade que é exercida por gosto, por vontade e não sob coação ou necessidade.
Pois bem, neste sentido, vossa fala, afirmando que o Plano Nacional de Educação (PNE) vai quebrar o Estado, está em clara consonância com a política educacional do Governo Dilma, colocando os formuladores do PNE – docentes, pesquisadores e parlamentares, inclusive do seu próprio partido – na condição de trabalhadores alienados, com braços, pernas e mentes comprimidos pelo torniquete da “austeridade fiscal”. O senhor reafirma, com esta fala, que os professores brasileiros, trabalhadores aviltados pelo Estado, continuarão a exercer sua atividade sob a pressão da mera necessidade de subsistência. Imagine o que estaria indicando o “orgasmograma” ficcional criado por você, em Sexo e Prazer, caso medisse a satisfação destes profissionais com as condições em que seu trabalho é exercido.
Sr. Mantega, não podemos sequer fingir orgasmo com os impotentes 3% do PIB destinados pelo Brasil à educação. E, cá pra nós, ainda que sejas um economista reconhecido e que tenhas feito esta bem sucedida incursão pelo campo da sexualidade, pergunto: porque acredita que possa fazer alguma inferência em relação às necessidades do campo educacional?
Meu caro economista do sexo, segundo José Marcelino Rezende Pintor, da USP, para cumprir efetivamente as metas do Plano Nacional de Educação (PNE), o investimento do PIB no setor deve chegar a 10,7% em 2020. Nelson Cardoso Amaral, da UFG, por sua vez, afirma, que se o País aplicar 10% do PIB, atingirá padrões próximos aos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que é de 6 mil dólares por aluno entre 2020 e 2030. O pesquisador afirma ainda que se forem aplicados 8% do PIB, esse patamar será atingido entre 2030 e 2040 e, se for aplicado 7%, só se aproximará dos valores investidos pelas nações ricas entre 2040 e 2050.
Caro Ministro, seu governo diz ter como meta do Ideb a nota 6 (desempenho da Comunidade Européia em 2005), embora aplique apenas 1/3 do montante investido pelos países europeus em ensino (R$3,5 mil por aluno, contra R$9 mil dos europeus). Seu governo, que diz preocupar-se com a educação, investe, nesta área, pouco mais da metade do que recomenda a UNESCO (6% do PIB), menos do que a média latinoamericana (4,6% do PIB), menos do que Bolívia, Argentina, México, Cuba. Enfim, no continente africano, até a pobre Botsuana investe mais do que o seu governo!
Por fim, nas já visíveis tramas das relações entre sexo e poder, Senhor Ministro, seu governo pratica conosco aquilo que V. Sa. cunha de sexualidade autoritária, castrando intelectualmente os docentes, negando-lhes a possibilidade do prazer no magistério. E, como diria o finado pensador Roberto Freire, meu caro economista, sem tesão não há solução.
Com estes argumentos despeço-me com um singelo pedido econômico-sexual:
- Exmo. Sr. Ministro, não f... mais com a Educação!
*Welton Oda é professor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) |