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  18/10/2016 - por Isaac W. Lewis



Falar de reforma da educação no país chamado Brasil implica falarmos radicalmente sobre muitas outras reformas necessárias, como, por exemplo, a reforma do serviço de saúde, da política de segurança e, principalmente, das instituições políticas e jurídicas que servem os interesses das classes privilegiadas e favorecidas nacionais e internacionais. Isso nos faz lembrar um velho conhecido, o qual afirmou que “ser radical é agarrar as coisas pela raiz”.
 
Para reformarmos uma casa, por exemplo, precisamos, primeiro, avaliarmos as condições dessa casa, seu alicerce, suas estruturas, sua funcionalidade e até o solo onde a casa está construída. Para reformarmos uma instituição social, a avaliação tem de ser mais complexa porque as instituições de uma sociedade são construídas histórica e socialmente, o que significa dizer que elas são construídas politicamente e dependem da correlação de forças entre os sujeitos privilegiados e os sujeitos desfavorecidos da sociedade num determinado momento.
 
A essa altura, convém indagarmos se cabe uma reforma dessa ou daquela instituição na sociedade brasileira ou se cabe revolucionarmos as estruturas sociais e políticas que sustentam as instituições sociais dessa sociedade. É como se tivéssemos de decidir se vale a pena remendarmos, retocarmos, pintarmos uma casa velha que não serve a finalidade de seus moradores ou se é preferível derrubarmos a casa velha e construirmos uma nova.
 
Afinal de contas reformar por reformar já se tornou tradição das classes privilegiadas há centenas de anos na sociedade brasileira. Temos visto, por exemplo, reformas e reformas de escolas e universidades públicas, sem que secretários e ministros da educação se preocupem em discutirem séria e profundamente a filosofia e a política educacionais implementadas pelas leis 5.692/71 e 5.540/68 pelos governos militares com assessoria de técnicos norte-americanos a serviço do Complexo Industrial-Militar dos Estados Unidos.  Os técnicos que elaboraram o Acordo MEC-USAID projetaram a educação brasileira como espaço de culto à pátria, de prática de esporte, de lazer e como vestíbulo de Departamentos de Recursos Humanos de empresas capitalistas nacionais e internacionais.
 
A preocupação de governadores, prefeitos e seus secretários de educação passou a ser o cumprimento dos trâmites burocráticos, estabelecidos pelas leis 5.692 e 5.540 e, quando muito, fechar as escolas para retocar paredes, ampliar os muros, pintar paredes e muros, mudar o piso, consertar o telhado e, por fim, inaugurar a reforma de mais uma escola. Às vezes, o banheiro e a cozinha permaneciam precários.
 
Não tem sido diferente a preocupação dos governos civis que sucederam os governos militares. Mantiveram-se fieis aos Acordos MEC-USAID assumidos pelos governos militares. Retocaram as leis 5.692 e 5.540 através de decretos, medidas provisórias e resoluções para aprofundar as propostas e objetivos das referidas leis. Financiaram a implantação e ampliação do ensino superior privado. Transferiram verbas do setor público para o setor privado. Sucatearam as instituições públicas de ensino e precarizaram o processo ensino-aprendizagem em todas as escolas e universidades públicas e privadas com a justificativa de que era mais importante aumentar a quantidade de diplomas do que melhorar o nível de aprendizagem dos educandos.
 
Todos os ajustes reformistas na educação, depois de 1984, foram realizados tanto por políticos de partidos conservadores quanto por políticos de partidos progressistas, tornando difícil, distinguirmos quem são, na realidade, conservadores ou progressistas nessa sociedade. Os estudiosos de gabinete, os jornalistas vinculados a grandes empresas jornalísticas e os políticos espertos rotulam os conservadores de direitistas e os progressistas de esquerdistas. Esquecem de dizer que, no Brasil pós-1984, os esquerdistas, em geral, são direitistas enrustidos.

Na prática, desde o fim da ditadura militar no Brasil (1984), os partidos políticos, apesar de portarem siglas diferentes, são, em sua maioria, partidos sociais democratas, pois pregam harmonia e conciliação entre capital e trabalho, entre exploradores e explorados. Por isso, os partidos políticos brasileiros, em sua maioria, competem entre si para realizarem os projetos políticos, econômicos, educacionais etc determinados pelos países do Primeiro Mundo para os países do Terceiro Mundo.

Para não perdemos a esperança, precisamos retornar às décadas 1940-1960, quando houve intensa mobilização, participação e discussões para reformar o setor educacional no Brasil. Para os conservadores, sua luta foi pela manutenção do sistema educacional criado no período colonial, que considerava a educação como privilégio de poucos, o objetivo educacional visava formar letrados para atender os interesses e o deleite das classes privilegiadas e favorecidas. O ensino-aprendizagem deveria permanecer através de memorização. Para os progressistas, a reforma da educação deveria democratizar o acesso ao conhecimento a todas as camadas da sociedade, o ensino deveria ser leigo e possibilitar o desenvolvimento científico e cultural dos educandos. Os educadores progressistas condenavam a memorização como processo de ensino-aprendizagem.

Isso nos faz lembrar um outro velho conhecido, o qual afirmou que memorização de conteúdo não significa necessariamente aprendizagem do conteúdo. Os educadores progressistas contribuíram enormemente através de seus estudos e suas pesquisas para implementação de uma pedagogia nacional que criasse programas e currículos para a formação de educandos comprometidos com um projeto de país autônomo e livre.

Para a elaboração da Lei 4.024 – Diretrizes e Bases da Educação Nacional, promulgada em 1961, participaram  políticos, educadores, padres, estudantes, pais de alunos, trabalhadores, jornalistas, profissionais liberais de todo o país desde a década de 1940. Apesar da participação ativa de setores progressistas, populares e de educadores que publicaram o Manifesto dos Educadores a favor do projeto original, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1961, aprovou inúmeras propostas de setores conservadores, mantendo o caráter elitista da educação para as classes privilegiadas e favorecidas, principalmente no interior e nas capitais mais atrasadas.

Em várias cidades do país, a mensagem universal de ensino e de acesso ao conhecimento foi adotada por algumas escolas públicas e privadas que passaram a preparar os educandos pobres ou ricos, através de ensino propedêutico para profissões variadas e, ao mesmo tempo, preparavam-nos  para ler e entender criticamente a história político-social de seu país, levando muitos jovens a se manifestarem e a lutarem a favor de mudanças na sociedade brasileira.  Foi contra esse projeto educacional que os técnicos brasileiros do Ministério da Educação juntamente com os técnicos norte-americanos elaboraram o Acordo MEC-USAID para desmontar um projeto político educacional construído por brasileiros comprometidos com um projeto de desenvolvimento autônomo e justo do país.
  
A proposta educacional construída através da política e filosofia educacionais contidas no Acordo MEC-USAID tem mostrado sobejamente que os educandos não aprendem por livre e espontânea vontade e nem a expedição de mais diplomas e certificados melhora o nível educacional e intelectual dos educandos.

Aprendemos através da história das reformas no Brasil que não somente educadores precisam ser educados para serem educadores, mas também os reformadores precisam ser educados para fazerem reformas em qualquer setor na sociedade brasileira.



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