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  00/00/0000 - por Nelson Noronha



Em 10 de dezembro de 1948, a Assembléia Geral das Nações Unidas proclamou um documento que entre nós parece estar sendo esquecido:

Em seu preâmbulo, diz aquele memorável documento:

A Assembléia Geral proclama

A presente Declaração Universal dos Diretos Humanos como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforce, através do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universais e efetivos, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição.

Hoje, neste dia triste, sem esquecer dos artigos onde se declaram os direitos à vida, à integridade física e à segurança pessoal, temos de recitar os artigos XVIII e XIX:

Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em público ou em particular.

e

Toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.

No dia 11 de maio de 2009, em sua sala de aula, no Instituto de Ciências Humanas e Letras, o Professor Gilson Monteiro, jornalista, candidato a Reitor nas eleições ocorridas na Universidade Federal do Amazonas no último mês de abril foi agredido com socos e pontapés, com palavras e gestos que o ameaçaram de morte. Um dos alunos presentes tentou socorrê-lo, mas foi advertido pelo agressor de que daquela forma seriam tratados todos os que mexerem com sua família. Nos dias seguintes, autoridades exercendo as mais altas funções no poder Legislativo e no Poder Executivo do Estado do Amazonas saíram em defesa do agressor e condenaram a vítima. O poder judiciário ainda não se manifestou.

Entre as declarações daquelas autoridades publicadas em jornais da cidade, encontram-se três que pretenderam ensinar o professor a se conduzir corretamente em sala de aula:

“No meu entendimento, isso serviu de lição para aqueles que não têm respeito no seu espaço de trabalho.”

“Muita gente está confundindo liberdade de expressão com o direito de caluniar e difamar. Não é isso não.”

“Há de se reconhecer a emoção do ato, que foi movido a exagero, mas não foi exagero do professor ao tentar imbuir fatos levianos ocorridos no passado?”

Disse o agressor, sem que nenhuma autoridade tenha até o momento se levantado para censurá-lo:

“Eu discordo de um professor de formar opinião dentro de uma universidade. Ele é pago para ensinar.

Não estamos aqui somente para lembrar os ensinamentos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Estamos aqui para denunciar o fato de que um Professor foi violentamente agredido no exercício da docência, humilhado na frente de seus alunos e ameaçado de morte por pessoa pertencente à família do Vice-Governador do Estado. Nossa denúncia aponta fato conhecido de todos, amplamente divulgada na cidade de Manaus e em jornais de circulação nacional. Denunciamos a agressão ocorrida no dia 11 de maio e temos de denunciar também a conivência e o apoio que autoridades do parlamento e do poder executivo deram ao agressor.

Conivência e apoio que atestam haver o Senhor Aziz dado uma lição que já fez escola. Uma lição da qual muitos dos que têm a obrigação de condená-la mostraram que, na verdade, não têm vergonha de disseminar as diferentes maneiras de a praticar.

O que queremos com esta denúncia? Somos professores, alunos, homens e mulheres, cidadãos brasileiros, estrangeiros no Brasil, cidadãos em outros países. Exigimos que o Estado onde vivemos e as autoridades que nele estão investidas das obrigações de defesa e promoção dos direitos individuais e coletivos dêem provas de que estão cumprindo seus deveres. Também exigimos a prova de que eles não est ão se lixando para o estado de direito.

Exigir-lhes que dêem prova de respeito à dignidade e a integridade moral e física dos que com eles não concordam parece, até agora, um desafio perigoso. O Professor Gilson Monteiro ousou lançar mão de exemplos que circularam na imprensa, comentados nos quatros cantos da cidade. O seu ensinamento dizia respeito à realidade onde vivemos. O que ele e nós aprendemos com a aula do Senhor Aziz? Que teremos, doravante, como Shakespeare, de falar do Reino da Dinamarca, onde algo de malcheiroso pode se espalhar pelo vento sem que ninguém, entre nós, seja infectado.

Esta denúncia será enviada à Ordem dos Advogados do Brasil, ao Presidente do Congresso Nacional, ao Presidente do Supremo Tribunal Federal, ao Presidente da República, a todos os sindicatos dos Professores no Brasil e no exterior e às Nações Unidas. Também será enviada ao Presidente da Câmara Municipal de Manaus, à Assembléia Legislativa e ao Excelentíssimo Senhor Governador do Estado.

Esperamos que estas autoridades se manifestem clara e publicamente sobre a Lição do Senhor Aziz. Ela não pode ser tratada como um acontecimento banal. Não se trata de uma ocorrência da vida privada. Homens públicos foram envolvidos em suas atividades públicas, profissionais e políticas. Todos os que respeitam a cidadania esperam que seus governantes lhes sirvam de exemplos.

Esperamos que estas autoridades ofereçam ao Professor Gilson Monteiro e aos que como ele pensam e se conduzem garantias de integridade física e moral, de liberdade de opinião e de livre exercício da docência. Sem este compromisso, acusaremos essas autoridades de cúmplices do Senhor Azis e de promoverem a violência como solução aceitável dos conflitos sociais.



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