O propósito deste artigo é analisar a política de recursos financeiros para a manutenção e o desenvolvimento da educação. Infelizmente, e mais uma vez, as escolas privadas foram privilegiadas. Como sempre, essas instituições poderão receber recursos públicos de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educacao Nacional, desde que comprovem finalidade não lucrativa e apliquem seus excedentes financeiros em educação.
Não foi fácil o empenho do movimento dos trabalhadores em educação que sempre se posicionaram, durante a construção da LDB, por reivindicações de verbas públicas somente para as escolas públicas. Como no Congresso Nacional existem parlamentares representantes dos interesses privatistas, as solicitações para que o dinheiro público fosse endereçada só para o ensino público não surtiu efeito.
Muitos deputados e senadores mais identificados com as confissões religiosas, apesar de se posicionarem de maneira progressista com relação a outros assuntos, sempre estiveram ao lado dos empresários do ensino, no que diz respeito a verbas para as instituições de cunho privado.
Historicamente, as escolas da rede privada de todos os níveis sempre tiveram isenções fiscais e previdenciárias (fontes indiretas), que são, no nosso entendimento, as mais importantes que as fontes diretas (bolsas de estudo, empréstimos, crédito educativo).
O favorecimento à escola particular pode ser encontrado em algumas constituições e leis ordinárias. Segundo Cury (1992), em A Educação Escolar como Concessão, afirma que "O artigo 8° do Decreto n07.247, do Império, permitiu subvenção às escolas privadas, desde que não houvesse escola pública por perto"(p.53). Já no período republicano, o artigo 71 do Decreto n° 981, de 8 de novembro de 1890 , permitiu a subvenção a "escolas particulares, que receberem e derem instrução gratuitamente a 15 alunos pobres, pelo menos". A primeira LDB (4.024 de 61e a Lei 5692 de 71" da ditadura militar, permitiram a concessao de recursos publicos para as instituicoes de carater privado, repetindo as disposicoes da Carta Magna de 1967.
Como se observa, não é novidade a concessão, por parte do Estado, de recursos públicos para o setor privado. O que mudou? Quem ganhou e quem perdeu com relação aos recursos financeiros para o setor educacional? Quem ganhou foi a escola privada e quem perdeu, ao nosso ver, foi a escola pública. As isenções fiscais e previdenciárias continuam.
De acordo com o artigo 150 da Constituição Federal (inciso VI, alínea C) é proibido a cobrança sobre "patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei".
Entendemos que essa exigência das instituições educacionais privadas de não terem fins lucrativos é uma estratégia para subtrair recursos do erário, posto que as que se autodenominam e são tidas como "sem fins lucrativos", escondem seus lucros sobre diferentes maneiras. Como diz Velloso (1988), em a nova Lei Diretrizes e Bases da Educação e o Financiamento do Ensino "os lucros são escondidos pelas rubricas de "contribuição a entidades mantenedoras".
E como isso ocorre na prática? Vejamos: as escolas consideradas como confessionais registram seus lucros como contribuição à ordem provincial; as escolas não-confessionais repassam seus lucros como despesa às mantenedoras". Neste caso, os lucros são utilizados para pagar altíssimos salários a seus proprietários e parentes, ampliação das instalações e "fartos gastos em lobby junto ao poder publico" p.15.
No que diz respeito à classificação de escolas comunitárias, confessionais e filantrópicas, que poderão receber recursos públicos de acordo com a Constituição de 1988, vejamos o que diz Davies (2002), em o Financiamento Público às Escolas Privadas. As escolas "comunitárias seriam aquelas com representantes da comunidade na entidade mantenedora [...]. Comunidade é tudo e nada ao mesmo tempo, não tendo nenhuma consistência social nem jurídica. A categoria das confessionais[-] não tem fundamento jurídico nenhum, pois elas dão lucro como qualquer empresa privada [...]. Esta categoria específica das confessionais (sobretudo da igreja católica), diz o autor, é interessante porque revela a imagem de santos que elas têm de si e que desejam projetar na sociedade. Já as filantrópicas, salienta o referido pensador, são as únicas com o fundamento jurídico definido, [...] embora sem nenhuma legitimidade social ou moral, sendo, por isso, conhecidas como pilantrópicas (p.76).
E as práticas fraudulentas? Melchior apud Davies (2002, p.87-88), apoiado num estudo realizado pelo FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento), diz como as fraudes eram feitas:
"a) as escolas recebiam as bolsas do salário-educação e, além disso, cobravam dos alunos a diferença que existia para integralizar as mensalidades (parática que era muito utlizada pelas escolas de iniciativa privada de Manaus);
b) as escolas recebiam bolsas do salário-educação e apresentavam uma relação de alunos "fantasma", isto é, eles não existiam;
c) as escolas recebiam mais bolsas de estudo do que sua capacidade de matricula". Muitas escolas só existiam no papel e o Governo fazia concessão de bolsas de estudo a essas instituições.
Pelo exposto, não temos dúvida em afirmar que a educação brasileira sempre esteje e sempre estará entregue ao setor privado. O governo continua injetando recursos públicos na escola particular. Como exemplo, citamos o PROUNI. Precisamos lutar para que o dinheiro público seja aplicado somente na escola pública. Temos que triplicar os gastos com a educação. Ou seja, aumentar o percentual do PIS. Para tal, é necessário uma pressão popular. Teremos coragem?
Como fomos escravos por um período de quatro séculos, a classe hegemonica não acredita na mobilização e organização do povo brasileiro para exigir a elaboração e implementação de políticas sociais consistentes no sentido de evitar a exclusão sistemática das classes populares da escola. Somos organizados para a pratica do pão e circo. Somos desorganizados e desmobilizados para exigir direitos.
* Rubens da Silva Castro e Jorge Gregório da Silva, professores da Faculdade de Educação da Ufam.
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