A revista britânica The Economist publicou, em junho de 2009, uma matéria sobre educação no Brasil com o título Still a lot to learn (Ainda muito a aprender). A matéria não é séria porque os “pesquisadores” não se propuseram a aprofundar a discussão sobre o tema. Começam afirmando que deus pode ser brasileiro, porém não desempenhou nenhum papel no planejamento do sistema educacional brasileiro.
Aproveitamos a oportunidade para esclarecer aos autores e editores da referida matéria que o atual sistema educacional brasileiro foi delineado por ideólogos americanos e brasileiros por conta do Acordo MEC-USAID na década de 1960 e executado pelo Governo da Ditadura Militar (1964-1982) que teve não só apoio do governo dos Estados Unidos da América como também do governo britânico que forneceu armas para os órgãos de repressão e propiciou treinamento para que os agentes da repressão brasileira pudessem usar as referidas armas.
O sistema educacional brasileiro, segundo os ideólogos brasileiros e norte-americanos, deveria ser técnico-profissionalizante voltado para atender os interesses do mercado. Os males da Lei 5.692/71 e da Lei 5.540/68, instituídas pela Ditadura Militar, para a educação brasileira refletem-se ainda hoje nos três níveis de ensino – Fundamental, Médio e Superior.
A seguir, os produtores da matéria Still a lot to learn ressaltam que atualmente o Brasil apresenta uma política estável, uma sociedade aberta e harmoniosa, uma economia em desenvolvimento, mas no campo da educação o país está muito atrasado em comparação com outros países em desenvolvimento.
Precisamos destacar que a condição de países em desenvolvimento, subdesenvolvidos ou do Terceiro Mundo corresponde, segundo Eduardo Galeano, autor do livro As veias abertas da América Latina, ao lugar que o Imperialismo (britânico e norte americano, principalmente) relegou esses países por conta da espoliação de seus recursos materiais e humanos. Os termos política estável, sociedade aberta e harmoniosa, economia em crescimento correspondem às concepções ideológicas de interesse das classes dominantes dos países do Primeiro Mundo aliadas às classes dominantes dos países do Terceiro Mundo. Esses termos correspondem, por isso, à política econômico-social planejada pelos ideólogos a serviço do capitalismo e instituída através de ferro e fogo por governos de países subordinados aos interesses do capital internacional, como é o caso do Brasil.
Sobre educação, os editores da matéria Still a lot to learn não dizem nada aprofundadamente. Qualquer cidadão brasileiro pode saber sobre os problemas da educação brasileira através de artigos publicados na imprensa brasileira (jornais, revistas), reportagens na televisão e livros. A lista de autores de várias áreas, educadores, professores que já chamaram a atenção para as mazelas do ensino nas escolas e nas universidades brasileiras seria enorme para ser mencionada aqui. Esses autores, educadores e professores, além de fazerem críticas pertinentes ao ensino nas escolas e universidades brasileiras, também fizeram propostas que nunca foram assimiladas e consideradas seriamente pelos governos (federal, estaduais e municipais), com raríssimas exceções.
Estranhamente, não tanto por sabermos que os editores do The Economist devem ter apoiado as medidas adotadas pelos Governos Militares durante a ditadura no campo da educação com a edição das Leis 5.540 e 5.692, já citadas, a matéria Still a lot to learn reconhece os avanços realizados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao expandir as iniciativas do seu predecessor, Fernando Henrique Cardoso. Este foi saudado pelo primeiro ministro Tony Blair como César. Quem conhece História sabe que César instituiu e governou o Império romano. Historicamente, não foi esse o papel de Fernando Henrique Cardoso, o de governar um império. Este está mais para Cleópatra, pois efetuou projetos de interesse de banqueiros e empresários internacionais (norte americanos e britânicos, principalmente), continuando as políticas econômico-sociais iniciadas pelos Governos da Ditadura Militar a partir de 1964.
Os autores da matéria Still a lot to learn exaltam a transferência de renda efetuada pelo Programa Bolsa Família sem mencionar que esse projeto foi feito às custas de perdas de direitos dos trabalhadores, também pobres, do achatamento salarial e de rendas das classes médias baixas, da privatização acelerada dos serviços públicos (segurança, educação, saúde, rodovias). Esses autores devem saber e fingem não saber que Robin Hood foi mais original do que Lula da Silva, pois ele tirava dos ricos para dar aos pobres. O projeto do presidente Lula investe dinheiro público em grandes bancos e empresas privados às custas do suor e do sangue dos trabalhadores brasileiros.
Por fim, para serem coerentes, os editores da matéria Still a lot to learn atacam os professores brasileiros e seus sindicatos. Declaram que os professores faltam em demasia e que os sindicatos impedem a melhoria do ensino nas escolas e nas universidades brasileiras. Evidentemente que não concordamos com essa conclusão do The Economist.
Na verdade, a matéria Still a lot to learn revela que seus autores têm ainda muito a aprender sobre educação, sobre sociedade, sobre política. Entendemos que a educação e a discussão sobre educação são ações políticas. Os autores da matéria Still a lot to learn exerceram suas ações políticas em defesa de um projeto de ensino descompromissado com o conhecimento da história da sociedade onde esse ensino é realizado, do estudo das relações entre Império e Colônias e dos pressupostos para que o educando alcance consciência crítica sobre a sua sociedade e sobre a história dessa sociedade.
A propósito, gostaríamos de saber se os autores da matéria Still a lot to learn analisaram a formação e a educação recebidas nas escolas britânicas pelos policiais que assassinaram friamente o brasileiro Jean Charles de Menezes em um metrô em Londres e que têm agredido covardemente cidadãos britânicos e não-britânicos, desrespeitando a estabilidade política, a sociedade aberta e harmoniosa e de economia estável da Grã-Bretanha.
Isaac Lewis é docente da Faculdade de Educação e ex-presidente da Adua.
Leia aqui a matéria Still lota a learn da revista The Economist. |