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Dia do Trabalhador. Não é dia do trabalho. É do trabalhador. A diferença é muito grande, diferença política, não de grafia.

O dia 1o de maio é feriado internacional. É dia de luta e luto em vários países do mundo, dia de lembrar dos trabalhadores operários de Chicago que foram assassinados por reivindicar uma jornada de trabalho de 8 horas diárias. Dia de lembrar que os setores privilegiados se utilizam de mecanismos variados para preservar suas benesses.



Emiliano Di Cavalcanti



Sem título (grupo de trabalhadores)


É preciso estarmos constantemente preocupados em preservar nossa memória, a memória social, a nossa história. Nesse caso a necessidade é maior ainda, uma vez que existe, há muito tempo, um movimento deliberado para distorcer essa memória; uma distorção lenta, subliminar, pois executada não só pelos setores mais reacionários da sociedade, mas muitas vezes por partidos de esquerda e por lideranças sindicais.

Para muitos o Primeiro de Maio é dia de show e de sorteio de prêmios, e durante essa manifestação, ninguém fala de exploração, organização, luta, ninguém fala da história que originou o feriado.


As Origens


"Declaramos que a limitação da jornada de trabalho é a condição prévia, sem a qual todas as demais aspirações de emancipação sofrerão inevitavelmente um fracasso"

Esta frase é de Karl Marx, "pai" do socialismo científico, quando da fundação da Associação Internacional dos Trabalhadores em 1866.

Há pelo menos duas décadas os trabalhadores europeus se organizavam e lutavam por reivindicações trabalhistas.
As primeiras e mais importantes lutas operárias se desenvolveram na Inglaterra, a partir do início do século 19, primeiro com o movimento Ludista e posteriormente com o movimento cartista, reunindo várias categorias profissionais e transformando a luta por reivindicações econômicas em lutas políticas. Foi nesse contexto que se desenvolveram os primeiros sindicatos e a primeira Federação de Trabalhadores Ingleses.

O "cartismo" nasceu em 1837, quando foi redigida a "Carta ao Povo", documento que continha seis pontos de reivindicação: sufrágio universal, igualdade dos distritos eleitorais, supressão do censo, eleições anuais, voto secreto, pagamento aos deputados do Parlamento.
Desde a década de 30 os cartistas fizeram conquistas consideráveis para a classe operária como: 1º lei de proteção ao trabalho infantil (1833), lei de imprensa (1836), reforma do Código Penal (1837), regulamentação do trabalho feminino e infantil (1842), lei de supressão dos direitos sobre os cereais e lei permitindo as associações políticas (1846), lei da jornada de trabalho de 10 horas (1847).

Em 1842, auge do movimento, foi feita uma petição que exigia o sufrágio universal e a resolução de problemas econômicos. Apesar dos 3 milhões de assinaturas que a acompanhavam, a petição foi recusada pelo Parlamento.
Em 1848, organizou-se nova manifestação de apoio à petição, com 5 milhões de assinaturas. Londres foi ocupada pelo exército, que impediu a manifestação. No entanto, até o ano de 1858 vários movimentos grevistas serviram para organizar e dar maior consciência à classe operária inglesa.
O ano de 1848 foi importante não só na Inglaterra, mas em vários países do mundo, marcado por uma onda revolucionária conhecida como a "Primavera dos Povos".


Tarsila do Amaral



Operários


Normalmente o movimento de 1848 é apresentado sob a ótica das idéias liberais e nacionalistas, particularmente nas regiões italianas e alemãs. Porém, como justificar então o nome dado ao movimento? Essa situação é bastante desigual nos países europeus. Se, é verdade que o sentimento nacionalista predomina na Alemanha e Itália, e que a burguesia lidera o movimento contra os governos absolutistas, a classe operária, mesmo de forma incipiente faz seu aparecimento de forma independente, com suas próprias reivindicações e formas de organização.

Na França a Revolução de 1848 foi um momento de importante ascensão e organização independente da classe operária, seu apogeu ocorreu quando do movimento conhecido como "Comuna de Paris" em 1871, porém não só o movimento operário inglês e francês estavam em ascensão, em outros países europeus e também nos EUA surgiam movimentos de trabalhadores, principalmente imigrantes, que viviam em condições de superexploração.


O 1o de Maio


As origens do 1° de maio se relacionam com a proposta dos trabalhadores organizados na Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT) de declarar um dia de luta pelas oito horas de trabalho. Também conhecida como "Primeira internacional", foi fundada em Londres, sob influência das idéias de Karl Marx. Porém foram os acontecimentos de Chicago, de 1886, que vieram a dar-lhe o seu definitivo significado de dia internacional de luta dos trabalhadores.

Nos Estados Unidos a classe operária era formada principalmente por imigrantes europeus, alemães, tchecos, irlandeses e de outras nacionalidades. A exploração do trabalho operário soma-se à exploração do imigrante, daquele que é considerado um não cidadão e, portanto, sem qualquer tipo de direitos. Foram essas condições que estimularam o desenvolvimento do movimento sindical no país. Grande parte dos operários era influenciada pelos ideais socialista ou anarquista.

As incipientes organizações operárias passaram a reivindicar dos patrões o respeito à lei, o fim do trabalho infantil e, principalmente, a redução da jornada para oito horas diárias e quatro horas aos domingos.

Na segunda metade do século 19 a organização sindical conheceu aumento expressivo e se processou de forma autônoma, independente do Estado e muitas vezes, contra o Estado. A proposta das 8 horas de jornada máxima, tornou-se um dos objetivos centrais das lutas operárias, e se tornou o eixo principal de reivindicação dos trabalhadores, tema de maior destaque na imprensa alternativa que se desenvolveu, formando a cultura operária durante décadas em que foi importante fator de mobilização. Ao mesmo tempo a luta pela redução da jornada de trabalho foi responsável por violenta repressão e marcada por prisões e morte de trabalhadores.

Apesar da pressão de governo e patrões, foi criada, nos Estados Unidos, em 1885, a Federação dos Grêmios e Sindicatos Operários, comandada por lideranças operárias inspiradas por idéias anarquistas ou socialistas. Sua primeira resolução foi convocar uma greve geral em todo o país para o dia 1º de maio de 1886, tendo como eixo a redução da jornada de trabalho. Em diversas cidades dos EUA a paralisação, principalmente na região nordeste, reuniu milhares de trabalhadores e foi acompanhada por comícios, sendo alvo da repressão policial.

Em Chicago a adesão à proposta da Federação foi massiva e cerca de 400 mil operários das fábricas cruzaram os braços. Aparentemente surpreendidos patrões e governo deixaram que o movimento transcorresse pacificamente. A repressão se inicou no dia seguinte e a partir de então foi marcada por fortes conflitos envolvendo a polícia, capangas de empresas e o própria justiça de Estado.

No dia 2 de maio, domingo, a polícia entrou em choque com os grevistas numa pequena cidade vizinha de Chicago, deixando um saldo de nove mortos.

No dia 3, os grevistas dirigiram-se à fábrica MacCormick, a única indústria da região que funcionava, pois os trabalhadores haviam sido demitidos e substituídos por desempregados fura-greves. Além disso, os empresários haviam contratado 300 agentes da Pinkerton para protegê-la. Os trabalhadores reagiram fazendo comícios do lado de fora dos portões, e mais uma vez houve confronto com a polícia, que disparou, provocando seis mortos e uma centena de feridos.

Ao mesmo tempo em que aumentava a repressão, aumentava o vigor da greve a o estado de ânimo dos trabalhadores. Um dos líderes da greve, o anarquista August Spies, convocou para o dia seguinte, dia 4 de maio, um ato público contra a repressão policial na Praça do Mercado de Feno, centro de Chicago, que reuniu cerca de 15 mil pessoas e foi cercada pela polícia, fortemente armada. Quando o último orador, Samuel Fielden, iniciava seu discurso, o chefe de polícia exigiu que ele descesse do palanque e enquanto discutiam, uma bomba explodiu entre os policiais, matando oito homens. A polícia revidou, abrindo fogo e provocando a tragédia: 80 operários foram assassinados e mais de uma centena ficou ferida no massacre de Chicago.

A (in) Justiça

Vários manifestantes, mas em especial os líders da greve e organizadores do comício foram presos. O processo, reconhecido posteriormente como uma grande farsa pela própria justiça estadunidense, voltou-se contra os militantes anarquistas August Spies, Adolf Fischer, Luis Lingg, Albert Parsons, George Engel, Michael Schwab, Oscar Neebe e Samuel Fielden, sendo que três deles, Spies, Parsons e Fielden, estavam entre os oradores do encontro.
A sentença, ditada a 20 de Agosto de 1886, condenou à morte os oito réus, embora posteriormente Schwab e Fielden vissem a pena comutada para prisão perpétua e Neebe para 15 anos de prisão. A execução dos condenados foi marcada para 11 de Novembro de 1887. Na antevéspera, Lingg suicidou-se, numa última tentativa de salvar a vida dos companheiros. Mas as autoridades não recuaram, os quatro ativistas foram executados, enquanto a tropa se encarregava de conter a multidão nas ruas.
O crime do Estado americano, idêntico ao de muitos outros Estados, que continuaram durante muitas décadas a reprimir as lutas operárias, inclusive as manifestações de 1° de maio, era produto de sociedades onde os interesses dominantes não necessitavam sequer ser dissimulados. Na época, o Chicago Times afirmava: "A prisão e os trabalhos forçados são a única solução adequada para a questão social", mas outros jornais eram ainda mais explícitos como o New York Tribune: "Estes brutos [os operários] só compreendem a força, uma força que possam recordar durante várias gerações..."
Seis anos mais tarde, em 1893, a condenação seria anulada e reconhecido o caráter político e persecutório do julgamento, sendo então libertados os réus ainda presos, numa manifestação comum do reconhecimento tardio do terror de Estado.



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