Pensar só em si e no presente é uma fonte de erro na política (Jean de La Bruyère)
Você se considera uma pessoa pública? Esta pergunta pretende remeter a uma reflexão pessoal, já que, para os gregos, por exemplo, opunha-se ao conceito de “homem público” o de idiota, ou “sujeito privado”.
(pausa para reflexão)
Quanto tempo despendemos com atividades sociopolíticas? Que atitudes adotamos para contribuir com a melhoria do saneamento básico, da saúde pública, do sistema de transporte coletivo ou da educação (ainda que seja na escola em que estudam nossos filhos)? Que tipo de relação temos com nossos vizinhos e colegas de trabalho?
Constitui queixa frequente (e não descabida), por exemplo, a falta de opção, de bons candidatos nas eleições. A que se deve esta falta de boas opções? O que temos a ver com isso? O que podemos fazer para mudar este quadro? Para falar sobre isso, ao invés de adotar o caminho romântico, de decantar aquela sociedade ideal, mas inexistente (utopias), falemos do mundo concreto, das pessoas comuns, de carne e osso, próximas a nós e que, com suas ações, transformaram seu próprio contexto (heterotopias).
É fato que o poder econômico de corporações privadas é um monstro que consegue comprar a maioria das vagas em nossos legislativos municipais, estaduais e federais, mas, há exceções. Em Natal, por exemplo, a Professora Amanda Gurgel, que leciona Língua Portuguesa numa escola da rede pública e tornou-se bastante conhecida graças a um pronunciamento na Assembléia Legislativa do Rio Grande do Norte, assistido por mais de dois milhões de pessoas na página do “Youtube”,foi eleita vereadora. Candidatando-se pelo PSTU, obteve votação consagradora, a maior da história da capital potiguar, elegeu-se com mais de 30 mil votos e garantiu ainda, com esse recorde, a eleição de outros dois vereadores. No professorado manauara, dignas de menção são as votações do Professor Bibiano (PT), eleito vereador com 4.326 e os expressivos resultados dos Professores Jevaldo da Silva (PSOL), que obteve 1.762 votos e Edmilson Lima (PT), com 1.232 votos, obtidos a partir do engajamento voluntário de cidadãos que compartilhavam dos ideais encarnados nestas candidaturas populares.
Menos conhecida é a trajetória do “peão de obra”, operário da construção civil paraense Cléber Rabelo, eleito vereador em Belém, pelo PSTU, com quase 4.700 votos e cujo diferencial foi o fato de que seus cabos eleitorais, ao invés de militantes pagos, foram companheiros de trabalho e de partido. Estes, conhecendo a trajetória política de Cléber, apoiaram, com entusiasmo, sua candidatura, enfrentando sol e chuva para divulgar suas propostas pelas ruas da capital paraense.
Para aqueles que não são dados a esta militância político-partidária, emblemático é o caso de uma candidatura manauara ligada ao bairro de Petrópolis. Refiro-me a esta, em particular, por envolver também outro importante segmento social: o cidadão comum, o morador do bairro. Sob a coordenação de um núcleo político, o Núcleo do PT de Petrópolis, inicialmente às dezenas e, após cerca de três décadas de intensa discussão e ação política transformadora, milhares de moradores, que financiaram e apoiaram a vitoriosa candidatura do vereador Waldemir José, hoje consolidada também em outros bairros de Manaus. Em 2.012, na segunda legislatura consecutiva, este mandato popular obteve mais de 4.500 votos.
Vale ressaltar que, neste caso, não estamos falando aqui do ilusório assistencialismo praticado por oportunistas endinheirados, mas de ações diretamente planejadas e executadas pela coletividade, por cidadãos comuns que, ao longo deste período, com seu próprio esforço, organizaram biblioteca e pré-vestibular comunitário, envolveram-se em lutas pela melhoria das condições infra-estruturais do bairro e de toda a cidade, estiveram presentes em conselhos tutelares e outros fóruns deliberativos populares, etc.
Neste sentido cabe perguntar novamente: porque será que temos tão poucas opções para votar? Talvez porque, à exceção de raros casos, como o do referido bairro manauara do Petrópolis, faltam indivíduos e coletividades engajadas em projetos transformadores. Faltam candidatos de base popular e sobram candidatos de empreiteiros, indústrias, laboratórios farmacêuticos. Falta ação política do cidadão comum que, mais do que vítima, é cúmplice desse modus operandi.
Obviamente não estou propondo responsabilizar ou isentar os mais pobres que aceitam a corrupção passiva. Tampouco isentar a classe media, quer por sua apatia generalizada, quer por sua cumplicidade criminosa com os candidatos da burguesia.
Para atuar politicamente o cidadão precisa de condições materiais objetivas que garantam tempo, disposição e infra-estrutura mínimas. Quem ainda não dispõe delas não pode se vitimizar, precisa conquistá-las. Quem já dispõe... Tá esperando o que, mermão???
*Welton Oda é professor da Universidade Federal do Amazonas
|