Em 25 de março de 2019, o presidente do Brasil Jair Bolsonaro, recém-eleito e empossado com uma agenda de extrema-direita, indicou aos quartéis que fizessem a « devida comemoração » do golpe militar de 1964. Não é nenhuma surpresa, considerando que durante anos sustentou na porta de seu gabinete de deputado federal um cartaz onde dizia que « quem procura osso é cachorro », referindo-se de forma pusilânime ao périplo árduo e sofrido de famílias e amigos em busca dos mortos e desaparecidos produzidos pelo regime. Após o elogio à Carlos Alberto Brilhante Ustra, coronel que esteve à frente da tortura nos porões da ditadura militar, por ocasião do voto pelo impeachment da presidenta Dilma Roussef, realizado então pelo deputado, não se poderia esperar outra coisa. Até o presidente atual do Chile, Sebastian Piñera, insuspeito de esquerdismo, considerou « infelizes » as declarações bizarras e agressivas proferidas por Bolsonaro e sua equipe em visita recente àquele país. Ali morreram, sumiram ou foram torturadas 38.254 pessoas, oficialmente constatadas por três Comissões da Verdade institucionais. Sua memória é relembrada no impressionante Museo de la Memoria y los Derechos Humanos[1], e em inúmeros memoriais espalhados pelo país em lugares onde se constatou a tortura e a violência do regime de exceção de Augusto Pinochet, que depôs Salvador Allende com bombas sobre o Palácio de La Moneda, sendo que este último foi democraticamente eleito com uma plataforma socialista[2]. Enquanto escrevo essas linhas, a Procuradoria Geral da República no Brasil considerou que a declaração e incitação presidenciais constituem crime contra a legalidade e merecem todo o repúdio, já que contrariam a Constituição de 1988, que reinstaurou a ordem democrática no país.
Enquanto o governo e seus porta vozes no Congresso querem reduzir a questão a uma mera « disputa de narrativas », neste breve artigo, pretendo argumentar no sentido contrário ao da falsificação histórica, e da barbárie e violência subjacentes a essa direção que se busca imprimir ao Brasil no presente. Um projeto fantasmático que assombra exatamente porque no Brasil a memória e a verdade não foram devidamente cultivadas, os responsáveis não foram devidamente punidos, e a democracia é mais exceção que regra. Quero falar das inúmeras razões para que se diga em alto e bom som – nunca mais!
« Salve os caboclos de junho, quem foi de aço nos Anos de Chumbo »[3]
O Brasil tem uma auto imagem regida pelo mito fundador do povo ordeiro e pacífico, da terra em que « se plantando tudo dá », da “democracia racial“, do « país do futuro », da alegria do carnaval e do futebol. Mito fundador que embala o verde-amarelismo de ocasião, e que no mesmo passo encobre a imensa violência sobre a qual se fundou e se reproduz ainda hoje a sociabilidade no país. Quando revisitamos há dezenove anos atrás os 500 anos de descobrimento, a filósofa Marilena Chauí (2000) escreveu um libelo desvelando esse mito (este sim, o verdadeiro mito !) e o quanto de violência, exploração, discriminação e opressão ele escamoteou historicamente. Especialmente a violência que vem de cima, das classes dominantes e do Estado, que expressa relações sociais extremamente arbitrárias para que se faça a expropriação da terra, a superexploração da força de trabalho e a contenção e encarceramento dos trabalhadores pobres, numa das sociedades mais desiguais e ricas do planeta – hoje, nona potência, tendo caído da posição de sexta economia do mundo que detinha em 2011. Relações sociais, portanto, profundamente antidemocráticas e que envolvem Estado e Sociedade Civil. Machado de Assis, um dos nossos maiores romancistas, falava da falta de remorsos das elites brasileiras frente aos seus métodos. Florestan Fernandes, expoente do pensamento social crítico brasileiro, dizia da ausência de projeto nacional autônomo, da heteronomia, do desprezo para com os de baixo e a dificuldade de convivência democrática com qualquer oposição, como marcas das classes dominantes no país. Diga-se, das tendências à autocracia. Ele escreveu, especialmente, sobre outra característica central e importante do Brasil : sua modernização capitalista conservadora, conduzida pelo alto, sem rupturas e revoluções, com mão de ferro e fortes conluios entre burguesia e Estado. Como bem diz o enredo da Mangueira 2019, « desde 1500 tem mais invasão do que descobrimento ». Ou seja, desenvolvimento capitalista dependente se deu à revelia de qualquer perspectiva republicana e democrática, conduzido por uma burguesia sem projeto nacional e soberano, anti-pública, anti-democrática e anti-popular. Com os « de baixo », apenas relações de mando, tutela e favor (uma mediação universal, como nos ensina Roberto Schwarz, 1977 e 1990), típicas da herança escravocrata, nosso traço visceral, e também mediadas pelo patriarcado, com forte e violentas implicações para as mulheres.
Vale a pena lembrar um documentário imprescindível para reavivar a memória e a verdade nesses tempos de elogio aos Anos de Chumbo, « Cidadão Boilesen » (2009, Direção de Chaim Litewsky), filme que toca profundamente nessas marcas naquele contexto singular da história brasileira, a ditadura civil-militar, no qual tais tendências profundas se impuseram de forma dolorosa. Um personagem como Henning Albert Boilesen encontrou no Brasil o ambiente ideal para seu anticomunismo exaltado e armado, sua psiquê doentia e sádica, para sua ascensão meteórica nos negócios e seus métodos pouco convencionais, antidemocráticos e violentos. Ele se sentiu à vontade porque encontrou uma cultura política que o acolhia entre os seus – as classes político-econômicas dominantes brasileiras. Ver este filme é se deparar com a burguesia brasileira e seus prepostos menores, todos nus. O filme mostra, por exemplo, o grande negócio de enriquecimento fácil entre a Petrobrás e a Ultragás de Boilesen, numa relação público-privada que deixaria lavajatistas sinceros boquiabertos. O conluio público-privado e os mecanismos de gambiarras, assalto ao fundo público e enriquecimento de pouquíssimos, em meio à interdição de controle democrático da ditadura, são também amplamente demonstrados pela detalhada investigação de Pedro Campos, no livro Estranhas Catedrais (2014), trabalho que nos mostra que os métodos das empreiteiras vêm deste tempo e permaneceram insinuantes na redemocratização.
Voltando ao Cidadão Boilesen, o filme relata a preparação do golpe desde antes de 1964, os eventos de 31 de março/1 de abril[4], até o Ato Institucional Nº 5 (AI-5). Depois vem o período mais duro do regime, que vai de 1968 até 1974, quando inicia seu ocaso, que ainda vai durar até 1984, numa transição lenta, gradual, sob controle. Boilesen desenvolve suas atividades desde a preparação do golpe até sua morte, em 1971. Esta foi desencadeada pelas organizações de esquerda que estavam na clandestinidade e enveredaram pela luta armada, empurrados pela radicalização do regime frente aos movimentos de rua de 1968, e com a adoção do AI-5. O Ato restringia profundamente as mais primárias liberdades democráticas, considerando todo o discenso como problema de segurança nacional. Nesse sentido, o filme é muito consistente, mostrando que apesar da opção pela luta armada por parte de segmentos da esquerda brasileira – hoje muito criticada e auto-criticada, e sobre essa autocrítica da esquerda vale a leitura da bela entrevista de Daniel Bensaid (Tout est encore possible – Ed. La Fabrique, 2010) -, esta não foi uma luta entre iguais, ao contrário. Diante disso, salta aos olhos a inconsistência da Lei de Anistia (1979) brasileira, que deixou impunes os torturadores, autores de um crime considerado hediondo, e todos os que cometeram violações aos Direitos Humanos no período. Condição diferente do que ocorreu na Argentina, Chile e Uruguai. Vale registrar que Boilesen foi um « inventor » de métodos de tortura, frequentava e financiava sessões de tortura, recolhia contribuições empresariais para manter os porões e, claro, angariou a fúria que o levou ao fim. O que considero a tese central deste filme, que ao fim e ao cabo documenta várias análises da historiografia, da ciência política, da economia e da sociologia brasileiras, é que não tivemos uma ditadura exclusivamente militar, mas civil-militar. O General Erasmo Dias é bastante enfático no filme: “era o meio civil se mobilizando, senão não se ganha guerra nenhuma”. Portanto, o Golpe civil-militar encontrou forte apoio em parte da sociedade civil brasileira, e para além do empresariado, sendo uma expressão disso a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”, realizada mais de uma vez entre março e junho de 1964, mas é absolutamente inverídica a afirmação militar que teria sido uma “revolução democrática”.
Antes do Golpe Civil-Militar, a forma de ser das classes dominantes brasileiras e sua relação com o Estado vinham sendo crescentemente postos em questão pelos « de baixo », com as mobilizações pelas reformas de base (agrária, educacional e tributária), a presença das Ligas Camponesas e movimentos operários-sindicais, sociais e culturais urbanos importantes (os Centros Populares de Cultura da UNE, por exemplo), num processo que poderia ultrapassar-se a si mesmo, colocando em questão a ordem social. As classes dominantes em seus meios civis e militares desencadeiam o que Florestan Fernandes (1987) chama de uma contra-revolução preventiva. O golpe militar de 1964 veio para ceifar a possibilidade de radicalização do movimento dos trabalhadores do campo e da cidade, dos estudantes e do meio cultural efervescente e crítico, antecipando-se ao movimento das burguesias em toda a América Latina. Tanto que na sequência aconteceram movimentos semelhantes no Uruguai, Argentina, Chile e outros países do continente. A Revolução Cubana e seus desdobramentos, no contexto da Guerra Fria, colocava em alerta a hegemonia americana na região. Assim, a cultura política violenta local se associa ao hegemon norte-americano numa estratégia contra-revolucionária. Existem inúmeros registros históricos, arquivísticos e cinematográficos sobre a participação da CIA na contra-revolução preventiva no Brasil e na América Latina. Então, é constrangedor, em pleno 2019, presenciar o espetáculo grotesco da visita-surpresa do governo brasileiro à CIA, dialogando com torturadores e golpistas em nome da « guerra ao tráfico ».
O que efetivamente mobilizou o golpe foi um projeto de desenvolvimento capitalista associado ao capital estrangeiro, em especial norte-americano, com uma forte entrada dos grandes monopólios e transnacionais no país, e que foi facilitado enormemente pelo obscurantismo do regime ditatorial militar, resultando no chamado Milagre Brasileiro, naquele Brasil do « Ame-o ou Deixe-o ». Tratou-se de uma ditadura como regime político de exceção, associada à ditadura econômica do grande capital, como nos ensina o livro magistral de Octávio Ianni (1981), num país com direitos escassos e grande potencial de extração de superlucros. No início dos anos 60, estava em jogo o projeto de país. Era o desfecho de uma intensa luta política que vinha se desenvolvendo desde 1946, após a ditadura Vargas, no interregno de uma democracia limitada (com partidos de esquerda na ilegalidade, por exemplo). Tal luta política encarniçada se expressava em partidos como a UDN, o PSD e o PTB, por vezes em aliança com o PCB no contexto da orientação da formação de frentes populares, e personagens como Carlos Lacerda. Essa disputa gerou o suicídio de Vargas em 1954, a renúncia de Jânio em 1961 e o desfecho deste ciclo com o golpe de 1964. Houve então a destituição de João Goulart e seu projeto nacional-desenvolvimentista apoiado pelo PCB, expresso pelo Plano Trienal, o qual contou em sua elaboração com Celso Furtado e sua equipe inspirada nas orientações desenvolvimentistas da CEPAL. Tratava-se de um projeto reformista, que não advogava o socialismo, mas aspirava um desenvolvimento capitalista nacional com maior autonomia. Porém, a predadora burguesia brasileira associada ao imperialismo não comportou e não comporta esses laivos nacional-populares, o que se revelou também em seu trato para com o petismo no poder décadas depois. Estes últimos, distantes a meu ver de qualquer reformismo e desenvolvimentismo (mesmo um auto referido neodesenvolvimentismo), deixaram de realizar mudanças mais profundas quando havia condições políticas para tal, assinaram a Carta ao Povo Brasileiro (2002), atacaram também os direitos à previdência social. Mas implementaram políticas de recomposição do salário mínimo e que impactaram as transferências públicas de renda, com impactos no poder de consumo dos trabalhadores pobres. E deslocaram-se levemente em relação ao período anterior, com alguns programas geradores de emprego e renda, por dentro do PAC (Luz para Todos, Minha Casa, Minha Vida). Frente à mudança de ares do mercado mundial, foram colocados contra a parede para implementar um ajuste fiscal draconiano num ritmo inédito, o que resultou num golpe de novo tipo em 2016, cujos argumentos jurídicos e econômicos eram largamente insustentáveis. O sentido de falar disso aqui é exclusivamente o de dizer que a burgueisa brasileira não suporta o cheiro do povo, mesmo o mais diluído, querendo até passar desapercebido, nos aeroportos e, mais ainda, no poder. Menos que um pagamento pelos erros – e foram muitos – do Partido dos Trabalhadores em seus treze anos de governo federal, a razão profunda do encarceramento político de Lula, desrespeitando prerrogativas jurídicas elementares, se encontra aí.
« A história que a história não conta »
Cabem algumas informações sobre a apuração dos crimes da ditadura civil-militar brasileira, que foram muitos e ultrapassam a desaparição física de pessoas. Porém, é a eliminação das pessoas daquela geração heróica que demonstra tragicamente esses crimes[5]. A terceira versão do Plano Nacional de Direitos Humanos, em sua Diretriz 23, indicou a criação de uma Comissão Nacional da Verdade, com a tarefa de “promover a apuração e o esclarecimento público das violações de Direitos Humanos praticadas no contexto da repressão política ocorrida no Brasil”. Segmentos militares consideraram o Plano “insultuoso, agressivo e revanchista”, segundo matérias da imprensa na época. Apenas em 2011, 27 anos após o fim da ditadura, foi de fato criada por lei federal a Comissão Nacional da Verdade, com 7 membros indicados pela Presidência da República, e 14 assessores. A Comissão não partiu do zero, pois houve um trabalho de 16 anos da Comissão de Mortos e Desaparecidos e de 10 anos da Comissão de Anistia. Se a Lei que instituiu a Comissão da Verdade foi promulgada sob forte pressão dos militares, também houve críticas dos segmentos democráticos da sociedade civil que questionavam a estrutura de pouca envergadura da CNV para uma tarefa tão importante, embora considerassem um avanço sua criação. O Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU indicou que a Lei de Anistia brasileira deveria ser revista, já que desrespeita os acordos internacionais de Direitos Humanos, não prevendo punição para crimes hediondos cometidos no período da ditadura, o que criava entraves jurídicos bastante complexos para que a Comissão Nacional da Verdade atuasse. Sob tensão, a CNV realizou seu trabalho, mostrando parte da “história que a história não conta”, colhendo depoimentos, visitando centros clandestinos de tortura[6].
Foram identificados 434 mortos(as) e indiciadas 377 pessoas por crimes contra a humanidade, direcionados inclusive a crianças. O livro Cativeiro sem Fim (2019), de Eduardo Reina, relata 19 casos de crianças sequestradas, filhos de militantes (11 deles no Araguaia), adotados ilegalmente no período. O documentário Que Bom te Ver Viva (1989), de Lúcia Murat, mostra os relatos das mulheres que viveram a tortura e como elas reconstruíram suas vidas após tudo aquilo. Houve uma nítida subnotificação e inúmeras dificuldades para o trabalho da CNV no Brasil, que revelou não apenas parte dos mortos e desaparecidos, mas milhares de encarcerados(as) e perseguidos(as) pelo regime. Portanto, esses números podem ser considerados “menores”, se comparados aos de mortos e desaparecidos na Argentina, no Uruguai, no Chile e em outros países latino-americanos, especialmente por aqueles que desprezam o sofrimento subjacente a eles. Mas, a violência de uma ditadura não se mede pelos rios de sangue que correram, até porque muitos desses números altos nos demais países se relacionam com a forte resistência popular. Nossa ditadura foi muito violenta: foi no Brasil, pela Operação Bandeirantes, que se forjaram os métodos de tortura – inclusive a “pianola Boilesen” – que foram utilizados nos porões do Estádio Nacional chileno, e pela Operação Condor articulada entre a CIA e os governos militares na América Latina. A ditadura civil-militar “exportou” tecnologia e quadros para a repressão sangrenta que ocorreu nos demais países do Cone Sul. Tudo em nome da “lei e da ordem” do grande capital. Porém, é bom que se diga que esgotado o Milagre Brasileiro e as condições internacionais que o possibilitaram, o projeto econômico da ditadura entra num ciclo de decadência e suas contradições explodem na crise da dívida de 1980/1982, além das greves operárias no ABCD que vinham denunciando a carestia e a exploração na maior concentração operária do mundo, à época. Mas a partir daí adentramos num outro momento.
“É na luta que a gente se encontra”
Por todo o exposto, faz parte da luta atual contra a extrema direita no Brasil não permitir, não aceitar qualquer retrocesso das liberdades democráticas, denunciar a falsificação histórica dos fatos, repudiar a apologia do crime. Não estamos disputando narrativas ou interpretações, estamos nos referindo a comprovados crimes hediondos contra a humanidade, cuja impunidade deixou de herança o que ocorre hoje no trato que se dá aos pobres, negros e negras em maioria, em instituições do aparato jurídico-policial, nas ruas quando há protestos: a criminalização, a execução sumária, o abate e também a tortura. Todos os dias os direitos humanos e as liberdades democráticas são ofendidos e vilipendiados no Brasil. Essa é uma lógica que vem de longe, e que a redemocratização do país não foi capaz de conter. E pior, ganha força com esse projeto em curso, que elogia torturadores e anda de braços dados com milicianos paramilitares, difundindo a mentira e a força bruta. Daí a importância do contraponto, de cantar « Brasil, chegou a vez de ouvir as Marias, Mahins, Marielles, malês », de gritar basta : ditadura, tortura, censura, nunca mais!
[1] Para uma visita virtual ao Museo, dirigir-se ao site https://ww3.museodelamemoria.cl/
[2] Convido o leitor a conhecer o filme Nostalgia de la Luz (2010), documentário dirigido por Patrício Guzmán, que aborda de uma forma muito original a dor das famílias em busca dos desaparecidos no Chile.
[3] Todos os intertítulos deste artigo farão referência ao Samba Enredo da Mangueira, Escola Campeã do Carnaval do Rio de Janeiro em 2019, que considero um dos mais belos e engajados dos últimos anos, intitulado História para Ninar Gente Grande, composto por Danilo Firmino , Deivid Domênico , Mamá , Márcio Bola , Ronie Oliveira e Tomaz Miranda.
[4] Há uma literatura extensa e majoritariamente crítica disponível sobre o período da ditadura, mas recomendamos vivamente como uma excelente introdução o livro de José Paulo Netto, Pequena História da Ditadura Brasileira (1964-1985), de 2014, onde essa literatura é largamente mobilizada e que oferece um panorama didático sobre as três fases do regime: seu momento reacionário (1964 – 1968), seu período mais duro e repressivo (1968 – 1974) e seu ocaso (1975 – 1985). Ali Netto mostra factualmente que o golpe não ocorreu em 31 de março, mas em 1 de abril e que a referência dos militares a março foi para escapar à ironia do dia da mentira.
[5] Em 27 de março de 2019, a coluna de Anselmo Góis em O Globo fala da censura, outra face central do regime. Segundo o jornalista, a ditadura censurou 500 filmes, 450 peças de teatro, 200 livros e 500 músicas aproximadamente. Apenas uma grande miopia ideológica pode encontrar “vestígio de democracia” num ambiente como esse. Mais uma vez a prova cabal de que não se trata de “narrativa”.
[6] Este trabalho pode ser consultado nos volumes do Relatório Final da CNV disponíveis em http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/index.php/outros-destaques/574-conheca-e-acesse-o-relatorio-final-da-cnv. O importante projeto Memórias Reveladas, ligado à CNV e ao Arquivo Nacional, guarda o acervo documental do antigo SNI, que mostra a perseguição e a censura na época.
Artigo publicado originalmente no esquerdaonline.com.br
*Elaine é doutora em Serviço Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2002). Foi presidente da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS), na gestão 2009-2010 e do Conselho Federal de Serviço Social (1999-2002). É professora associada da UERJ, na Faculdade de Serviço Social, onde coordena o Grupo de Estudos e Pesquisas do Orçamento Público e da Seguridade Social (GOPSS), e o Centro de Estudos Octavio Ianni (CEOI). Tem publicações na área de política social, orçamento público, fundo público e serviço social.
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