Data: 16/06/2015
Na metafísica aristotélica, o filósofo de Estagira tece algumas comparações explicativas na perspectiva de conhecer a natureza humana comparando-a com as almas dos animais como “formas substanciais”. Significa dizer que as pessoas às vezes ou quase sempre parecem mais com determinados animais do que com a própria cultura marcada por suas qualidades inventivas orientadas por valores ajuizados em seus diversos campos semânticos. Estas formas substanciais dos animais são tipificadas de acordo com a natureza das espécies, em particular, a competência e habilidade genética da Águia e da Galinha.
Neste cenário das relações “natureza e cultura” muitos foram os autores que se valeram das fábulas para tirar lições e até mesmo pautar nova forma de governar, pensar, sentir e agir. É o caso da “Revolução dos Bichos” de George Orwell, que constrói uma narrativa política mostrando o quanto os bichos são capazes de se indignar rompendo com as forças da domesticação e domínio dos fazendeiros, instituindo desta feita, uma forma de governo revolucionário transformando a utopia em história.
Não satisfeito, recorro à citação do historiador italiano Carlo Ginzburg (Olhos de Madeira) para arrematar a importância das fábulas na formulação das interpretações relativa ao processo civilizatório. Segundo ele, “Chklovski ressalta que, no conto de Tolstoi ‘kholstomer’, os acontecimentos são narrados por um cavalo e a sensação de estranhamento não se dá pela nossa percepção, mas através da percepção do animal”. Mais ainda, no universo mítico dos povos indígenas e das culturas tradicionais da Amazônia, estas representações ganham formas povoando o nosso imaginário cultural.
Neste universo busca-se compreender a natureza da Águia, a especificidade da Galinha e a capacidade de dissimulação dos atores nos debates ocorridos na Assembleia da Associação dos Docentes da Universidade Federal do Amazonas (ADUA), que decidiu favorável à greve na UFAM. Neste campo, os interesses são múltiplos e por consequência as pessoas muitas vezes de forma dissimulada ou cinicamente lutam por seus privilégios e favores pessoais agregados a um projeto individual ou partidário, afrontando quase sempre interesse público e a salvaguarda da Universidade enquanto Instituição pública, gratuita e indutora do desenvolvimento humano.
A Águia por sua plumagem e magnitude alça voo às alturas sem se divorciar dos biomas terrestres. Qualifica-se, sobretudo, por sua visão holística, objetiva e precisa o que lhe permite exercer com competência e habilidade o mandamento que a natureza lhe determinou. Do mesmo modo agem os profissionais que com altivez e espírito público buscam defender suas propostas movidos pela responsabilidade do agir publicamente contra a precarização e o desmonte da Universidade Federal, contra o descaso do Governo Dilma Rousseff pela não valorização e respeito aos profissionais da educação.
A Galinha é prisioneira do mundo. Às vezes ensaia pequenos voos sem esperança nenhuma de ir além dos manuais. É presa fácil pros seus predadores vive a ciscar sem muito ânimo apenas para dar cabo da sua função. Nesta situação qualquer semelhança não é mera coincidência, pois, assim, também se comportaram alguns profissionais da educação, quando tramam contra a greve na UFAM, ciscando no terreiro e voando baixo, agindo na calada da noite, unicamente, para garantir seus interesses particulares, reproduzindo argumentos mirabolantes para dar calção às práticas eleitoreiras e corporativas que transpassam o projeto de poder desses “aloprados” em conluio com a base aliada.
No entanto, tanto a Galinha como a Águia, por força da natureza está condenada a ser o que é, mas estes “aloprados” que no passado levantavam bandeira a favor das lutas sociais contra o mandonismo do poder instituído, hoje, pedalam na educação por conveniência, contribuindo também para que a Universidade, ameaçada de todas as formas, seja de fato uma Instituição periférica, desvalida, como bem declarou uma de suas agentes contrária à greve. O fato está consumado compete à direção do Movimento Paredista articular força interna e externa e de forma firme e responsável definir com clareza e objetividade ações para sustentação da greve como instrumento legal de afirmação de Direito por uma Universidade livre das amarras partidárias comprometida com o desenvolvimento da nossa Amazônia.
Ademir Ramos é professor e antropólogo, coordenador do Núcleo de Cultura Política da UFAM e um dos coordenadores do Projeto Jaraqui. |