Um discurso pouco esclarecedor foi ouvido do Secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Planejamento (MP), Duvanier Paiva, durante o seminário sobre a carreira do professor federal, realizado na última quinta-feira, 17, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O evento buscou avaliar as propostas de alteração da carreira apresentadas na reunião do grupo de trabalho em Brasília, no dia 11 de novembro.
A mesa foi composta ainda pelo Secretário Executivo da Associação Nacional dos Dirigentes (Andifes), Gustavo Balduino, pelo 1º vice-presidente do ANDES-SN, Luiz Henrique Schuch e pelo representante da reitoria da UFRJ, Pablo Benetti.
A participação do representante do governo no encontro pouco acrescentou ao debate. Com a desculpa de ter um vôo marcado para às 12h30, Paiva se limitou a ler, de forma pouco compreensível para quem o assistia, os artigos e parágrafos da minuta do projeto de lei que o governo quer enviar para o Congresso Nacional para alterar a atual carreira docente. No momento das intervenções da plateia, Duvanier deixou o seminário.
Andifes diz ter sido excluída das discussões
O secretário executivo da Andifes, Gustavo Balduino, agradeceu o convite da seção sindical e da administração da universidade. “Agradeço a oportunidade de participar desse debate na presença do secretário (Duvanier) aqui, ao vivo”. Balduino aproveitou o evento para lamentar o fato de o governo não ter chamado a entidade dos reitores para discutir a carreira docente. “É muito difícil imaginar que teremos uma carreira com qualidade se não houver a participação dos dirigentes nesse debate”.
O representante dos reitores afirmou que a carreira docente não poderia ser unificada pelo fato de haver “ganhos diferenciados” entre os profissionais. Para Balduino, a discussão estaria “de cabeça para baixo”, começando pela estrutura da carreira sendo tratada no âmbito do MP e não no Ministério da Educação (MEC). “Quando se discute carreira como salário, limitamos o projeto de uma carreira que reflita uma universidade de qualidade”, acrescentou.
Para a Andifes, a entrada somente de professores doutores, no modelo atual, “achata” a carreira docente e o governo usa do artifício de “esticá-la” criando novas classes como resposta salarial à categoria. Balduino lembrou ainda a urgência do governo em resolver essa questão, já que o PL 2134/11, que cria cargos efetivos, de direção e funções gratificadas nas Instituições Federais de Ensino já está tramitando na Câmara dos Deputados.
“Temos hoje um déficit de 6.000 docentes universidades federais e o PL dos concursos deve ser jogado para votação no primeiro semestre de 2012, com base no banco de professores equivalentes”, observou.
O secretário da Andifes expressou a preocupação dos reitores com a manutenção da qualidade nas universidades nas variadas regiões do país. “Como fazer uma universidade de qualidade no Amapá? Não temos resposta, mas temos clareza de que tem que ser discutida a flexibilização do perfil da carreira (de instituição para instituição) para alcançarmos os mesmos objetivos em todos os lugares”.
Balduino defendeu, ainda, o ócio intelectual para o desenvolvimento da educação superior no país. “Precisamos do ócio intelectual, e de tempo e remuneração. Para isso precisamos de uma nova carreira urgente”.
Projeto do ANDES-SN preza autonomia e qualidade nas universidades
O 1º vice-presidente do ANDES-SN, Luiz Henrique Schuch, ressaltou que a carreira do professor federal, proposta pela entidade, é resultado de anos de debate com a categoria nas várias instituições do país desde a década de 90.
A proposta do Sindicato Nacional é pautada pelo resgate das normas do Plano Único de Classificação e Retribuição de Cargos e Empregos (PUCRCE), fruto de um período de lutas históricas pela unificação das fundações, em 1985, e, posteriormente, destas com as autarquias, em 1987.
A construção deste projeto de lei se deu, segundo o professor, em um tempo de “heteronomia e de refluxo dos movimentos das categorias, abatidos pelas políticas neoliberais que resultaram na intensificação do trabalho docente”.
Essa “heteronomia”, para Schuch, “invadiu a autonomia das universidades”. Os governos, ao longo dos últimos quinze anos, trataram o problema do arrocho salarial dos professores federais criando “fetiches” que alteraram a carreira. As gratificações produtivistas são a melhor expressão desse processo de organização da carreira docente através de normas criadas à revelia da autonomia universitária.
A carreira do professor federal elaborada pelo ANDES-SN define um modelo de universidade que preza o vínculo entre ensino, pesquisa e extensão. O estabelecimento de um piso inicial cujo valor seria o do salário mínimo do Dieese (R$ 2.176, em janeiro de 2011), é uma garantia de qualidade da produção do professor. Esse piso, no PL do ANDES-SN, é referente ao professor auxiliar, em regime de 20 horas semanais, com graduação.
O diretor do Sindicato Nacional também destacou a objetividade da carreira proposta pela entidade que, da forma como está estruturada – unificando em uma só carreira os professores do magistério superior e da educação básica, técnica e tecnológica em apenas 13 níveis com interstícios de dois anos – tanto os docentes como os dirigentes da instituição teriam mais facilidade de estabelecer critérios de avaliação para a progressão funcional.
Projeto do Governo aprofunda distorções internas da carreira
Schuch também destacou que o projeto do governo, na lógica contrária ao do ANDES-SN, cria mais uma classe e seus quatro níveis (Sênior), dificultando ainda mais o acesso de todos os docentes ao topo da carreira.
“A proposta do governo cinde ainda mais a carreira. Cria duas partes bem distintas. A dos professores dedicados exclusivamente ao ensino, que ficarão congelados nas primeiras classes, assim como os atuais aposentados. A outra parte seria formada pelo atual contingente de professores que têm trabalhos na pós-graduação, vinculados a um programa institucional de pesquisa, requisito para o acesso às classes de associado e sênior”, avaliou.
Sobre essa questão, o projeto do Proifes guarda grande semelhança com o do governo, já que também mantém a estrutura de classes com variações entre níveis de 2,5% e entre classes, de 5%. E na passagem de Adjunto 4 para Associado a remuneração teria um acréscimo de 25%, bem maior do que as anteriores.
Essa remuneração, baseada em captação de recursos para a pesquisa, pode levar a uma nova reforma previdenciária para os docentes, segundo o diretor do ANDES-SN, na medida em os direitos adquiridos na atual carreira não são garantidos pelo governo que, em sua proposta, apresenta claramente uma mudança de regime de trabalho. “A única conexão com o passado (na carreira do governo) é que o tempo de serviço vai ser considerado”, alerta.
Posição unificada na UFRJ
O seminário foi uma iniciativa da Adufrj-SSind, em pareceria com a Pró-reitoria de Pessoal da universidade e aconteceu no Auditório Rodolpho Paulo Rocco (Quinhentão), no Centro de Ciências da Saúde (CCS).
O presidente da Adufrj - SSind, Mauro Iasi, e o Pró-reitor de Pessoal, Roberto Gambine, conduziram o evento. Ao final, Iasi disse que a seção sindical quer discutir a nova carreira docente com a reitoria e tentar um consenso sobre os pontos mais centrais da proposta.
A ideia é apresentar ao governo federal uma posição única do movimento docente e da instituição sobre alguns conceitos como isonomia, paridade e gestão democrática com o exercício pleno da autonomia universitária, por exemplo. “Queremos discutir com a reitoria e ir até o governo com uma posição única em termos de princípios”, afirmou.
Fonte: Adufrj-SS, com edição do Andes-SN
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