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Minuta de resolução sobre carga horária preocupa docentes na Ufam



Data: 09/03/2017

Por Annyelle Bezerra

O recrudescimento da burocracia nos processos de progressão e promoção e a padronização do tempo de trabalho em cursos de áreas distintas imperam novamente na Universidade Federal do Amazonas (Ufam). Estes serão alguns dos prejuízos para a categoria docente caso seja aprovada a proposta de minuta de resolução que discute o tema, no Conselho de Administração (Consad). A avaliação é de professores que estão há meses se aprofundando no tema.

Candidata a substituir a Resolução 012/91, a propositura de autoria da Administração Superior gera questionamentos pertinentes. Afinal, o tempo dispensado para a preparação de aulas pode ser padronizado sem levar em consideração a especificidade de cada curso? Ou por que a ascensão profissional dos professores da Ufam não ocorre de forma automática ao invés de condicionada à apresentação de pilhas de documentos?
 
 Sergio Gianizella, vice-diretor do Instituto de Ciências Biológicas da Ufam (ICB) e responsável pelo pedido de vista do processo, já alerta que as respostas para ambas as questões incitam debate. Isso porque existem na universidade grandes especificidades, dependendo do curso, que, apesar da semelhança entre os regimes de trabalho ,demandam maior dedicação para a elaboração de aulas e práticas em laboratório.

 A necessidade de até dois dias de preparação para que uma aula experimental na área das Ciências Biológicas e Zoológicas ocorra, por envolver o uso de equipamentos e coletas de materiais, animais e até sangue em ambientes externos, assim como por demandarem dias para que os resultados possam ser aferidos, é um dos exemplos práticos de como há cursos que contam com dinâmicas de trabalho bastante particulares. Reduzir o tempo para o fomento deste tipo de atividade configura uma ameaça à existência de aulas experimentais e impõem aos docentes a necessidade de levar trabalho para casa.
 
 Ao não levar em consideração as particularidades de cada curso, a minuta abre precedentes ainda para que professores de áreas de ensino que requerem maior dedicação fiquem descobertos pela nova legislação, podendo inclusive perder pontos no cálculo obrigatório para progredirem na carreira. Ligada diretamente à Resolução 005/2016, que define os critérios para progressão e promoção e que vem sendo discutida de forma concomitante no Conselho Universitário da Ufam (Consuni) apesar de deter a mesma tabela de valores para fins de cálculo de carga horária, a minuta relativa ao regime de trabalho, na opinião dos docentes que propuseram mudanças ao texto, não deveria estar sendo discutida, neste momento, para prevenir que ambas as resoluções tenham determinações conflitantes.
 
Primeiro vice-presidente da Regional Norte 1 do ANDES-SN, Marcelo Vallina ressalta que o aprofundamento do processo de discussão está relacionado à autonomia, mas na gestão as discussões ocorrem no âmbito do Comitê Gestor, composto por diretores, e não no Consuni. “Isso significa um esvaziamento das discussões democráticas. Às vezes criticamos o sistema político, mas repetimos esse tipo de atitude institucionalmente. As coisas se definem muito rápido”, ressaltou.

A decisão do Consuni de que o Plano Individual de Trabalho (PIT) não seja mais um documento com apresentação obrigatória nos pedidos de promoção é apenas um exemplo dos conflitos que podem vir a ocorrer entre as duas resoluções, caso as discussões ora realizadas no Consad e Consuni não estejam afinadas. Enquanto na instância máxima deliberativa da universidade a proposta é excluir a apresentação do PIT mantendo apenas o Relatório Individual de Trabalho (RIT), há a possibilidade dos conselheiros do Consad não terem o mesmo entendimento e manterem a exigência do plano individual, documento em que o docente expõe as atividades que pretende realizar junto aos alunos ao longo do semestre.

Responsável por elaborar uma nova proposta de minuta para apresentação junto ao Consad por ter pedido vista do processo, Gianizella enfatiza ser importante ainda que as discussões sobre todos os aspectos propostos no documento sejam aprofundadas, dado o impacto direto da legislação no dia a dia dos professores, no âmbito das atividades de ensino, pesquisa e extensão.
Representante docente no Consuni e membro do Departamento de Parasitologia, um dos que discutiram internamente a proposta, a professora do ICB Andrea Belém manifesta a mesma preocupação, e vai além ao propor que a minuta saia da esfera do Conselho de Administração e passe a ser objeto de debate no Consuni. “Diretores muitas vezes só pensam na sua própria área. O Consuni, por sua vez, tem representantes docentes que podem levar o debate para suas unidades e trazer sugestões para melhorar. Por isso, o fórum adequado, na minha opinião, não é o Consad”, afirma Belém.

Prevista no artigo 6º, do capítulo 3 da minuta, a inclusão sem qualquer justificativa da possibilidade de extensão no turno de trabalho dos docentes da Ufam para até às 23h é outro ponto polêmico e que demanda atenção quano às possíveis intenções da mudança. Assim como na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que garante aos trabalhadores brasileiros cuja jornada se estenda após as 22h, o direito a um acréscimo na remuneração denominado de adicional noturno, a Lei 8.112/90 que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais prevê o adicional aos docentes, regidos pelo Regime Jurídico Único (RJU). Estaria a Ufam disposta a arcar com esse ônus?
 
Como se o aspecto financeiro não fosse suficiente, a permanência de professores e estudantes nas dependências do campus após as 22h perpassa por questões que nunca estiveram tão em evidência quanto no início deste ano: a fragilidade da oferta de segurança à comunidade acadêmica nas dependências da instituição e o ineficiente sistema de transporte público utilizado pela maior parte dos discentes, cujos ônibus não adentram o campus após as 22h. A minuta pretende estender também o horário do transporte público no campus? Como isso seria feito?

Burocratização

A burocratização presente no cômputo de pontos para o avanço na carreira, mantida na Resolução 005/2016, também é alvo de críticas dos docentes que se aprofundaram na análise da minuta, por considerarem a manutenção contraditória ao objetivo das discussões no Consad e Consuni: atualizar legislações defasadas.

 Enquanto em outras categorias a progressão e promoção, direitos previstos em lei, se dão em caráter automático em função de investimentos em sistemas digitais que captam e armazenam automaticamente as atividades desempenhadas pelos trabalhadores, na Ufam, que enquanto foi Universidade do Amazonas (UA) garantia os benefícios de forma automática, os pedidos do tipo, hoje, obrigam docentes a reunirem documentos referentes a até oito anos de trabalho para que os pedidos sejam deferidos, verdadeiros calhamaços de papel que prejudicam o meio ambiente e se repetem desnecessariamente, levando em conta que independente do posto ocupado na carreira o docente deve apresentar toda a trajetória acadêmica vivenciada até o momento da nova solicitação.

Se num primeiro momento o excesso de burocracia aos olhos dos mais desavisados se apresenta meramente como uma característica administrativa, quando associado à atual postura do governo federal marcada pela constante retirada de direitos dos trabalhadores e ataques à educação e a carreira docente, transforma-se num terreno fértil para que professores de universidades públicas federais enfrentem dificuldades em obter ascensão profissional, assim como para que haja o desestímulo de ingresso na carreira de servidor público federal docente.

Superadas as hipóteses sobre os possíveis objetivos do recrudescimento da burocratização na universidade, uma ação simples resolveria todo o problema gerado pela exigência da apresentação de pilhas de documentos sempre que um pedido de progressão ou promoção é provocado: cabe à Pró-reitoria de Gestão de Pessoas (Progesp) arquivar os processos de progressão e promoção dos docentes, por envolverem remuneração. O que não é feito, hoje, por falta de espaço.

A obrigatoriedade de que os docentes atuem nos campos do Ensino, Pesquisa, Extensão e Gestão Institucional e a possibilidade de compilação num item só do disposto no artigo 5º do documento, que lista de maneira separada todas as atividades próprias dos docentes, também integram o rol de preocupações dos membros dos departamentos de Biologia, Parasitologia, Ciências Fisiológicas e História da universidade que já discutiram a minuta e encaminharam à Gianizella contribuições para a confecção de um novo documento ainda em fase de elaboração.
Composta por uma tabela que estipula o valor em horas de cada atividade desenvolvida pelo professor, a proposta de resolução que sairá do Consad, caso compile o artigo 5º num item só, corre o risco de contribuir, no caso de uma hipotética falta de atenção, para que atividades deixem de ser incluídas na tabela, levando docentes a obterem pontuações inferiores à quantidade de atividades desempenhadas no período avaliado para fins de progressão e promoção.

A limitação do número de horas destinado às orientações de mestrado e doutorado também é contestada pelos professores. Enquanto na minuta é proposto o máximo de 12 horas em dois semestres para alunos de mestrado e 12 horas em quatro semestre para os de doutorado, os docentes sugerem que o tempo de orientação seja igual à duração dos cursos (4 semestres para mestrado e 8 semestres para doutorado).

A manutenção da carga horária no turno de 7h às 22h, o fim da exigência do PIT, a permanência de duas horas de preparação para aulas e atendimento aos alunos, manutenção da carga horária integral nas orientações de pós-graduação e a inserção da informação no cabeçalho da minuta que o PIT e RIT são apenas alguns temas do documento alvos de propostas de mudança pelos departamentos que discutiram a minuta.

Debatida até o artigo 17º, do capítulo 6, a minuta que institui normas relativas ao regime de trabalho e à alocação de carga horária do docente efetivo deve voltar a ser tratada no Consad, em data ainda a ser definida.

A relatora do processo e membro da comissão constituída para elaborar a minuta, professora da Faculdade de Enfermagem, Nair Chase da Silva foi procurada para comentar os pontos questionados pelos docentes, mas se limitou a informar que a “minuta de resolução sobre carga horária docente está em processo de análise no Consad para receber os ajustes necessários à sua aprovação”.

Fonte: Adua



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