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    Parecer Jurdico




Análise da MP 934/20 que estabelece normas sobre o ano letivo da educação básica e do ensino superior para enfrentamento da situação de emergência de saúde pública

  07/04/2020



Brasília (DF), 1º de abril de 2020.

 

Ilustríssima Senhora Professora EBLIN JOSEPH FARAGE,

 

Secretária-Geral do SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR- ANDES-SINDICATO NACIONAL.

 

Ref.: Medida Provisória nº 934/20. Estabelece normas excepcionais sobre o ano letivo da educação básica e do ensino superior, decorrentes das medidas para enfrentamento da situação de emergência de saúde pública - Análise Jurídica.

 

Prezada Profª. Eblin Farage,

 

1. Cumprimentando-os cordialmente, e em atenção ao solicitado por esse Sindicato Nacional, vimos, por intermédio desta Nota Técnica, apresentar análise jurídica sobre a Medida Provisória nº 934, publicada no Diário Oficial da União de 1º de abril de 2020.

 

2. A MP nº 934/20 dispôs que o estabelecimento de ensino de educação básica fica dispensado, em caráter excepcional, da obrigatoriedade de observância ao mínimo de dias de efetivo trabalho escolar, desde que cumprida a carga horária mínima anual, observadas as normas a serem editadas pelos respectivos sistemas de ensino. º9.394/Da mesma maneira, quanto às Instituições de Ensino Superior, também se dispensou, em caráter excepcional, da obrigatoriedade de observância do mínimo de dias de efetivo trabalho acadêmico, também observadas as normas que serão editadas. Para melhor compreensão do significado desse Medida Provisória e das suas consequências, necessário compreender o que diz a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB, que corresponde à Lei n. 9.394/1996.

 

3. Quanto à educação básica, nela compreendida os níveis fundamental e médio, o inciso I do art. 24 da LDB diz que a carga horária mínima anual será de oitocentas horas para o ensino fundamental e para o ensino médio, que deverão ser distribuídas por um mínimo de duzentos dias de efetivo trabalho escolar. Nessa conta, não está incluído o tempo reservado para os exames finais, se houver. Com a edição da Medida Provisória nº 934, o estabelecimento de ensino não mais precisará cumprir com os 200 dias de efetivo trabalho escolar, mas a carga horária de 800 horas anuais foi mantida. Para a educação infantil, também foi excepcionado o cumprimento da totalidade de dias de trabalho educacional, mas mantida a carga horária mínima anual de 800 horas.

 

4. Já para as instituições de ensino superior, a LDB diz que a educação superior contempla duzentos dias de trabalho acadêmico efetivo e que o ano letivo regular é independente do ano civil. Ou seja, a MP 934 também excepciona o cumprimento dos dias de trabalho acadêmico, mas mantém a obrigatoriedade das 800 horas anuais. A despeito de haver um avanço positivo na medida que desobriga o cumprimento dos duzentos dias de trabalho acadêmico efetivo ou de efetivo trabalho escolar, entendemos que isso não é suficiente e que a Medida Provisória é omissa sobre pontos extremamente relevantes para o momento.

 

5. Como há uma diversidade de situações distintas em estabelecimentos de educação básica e superior no país, inclusive com regiões que sequer tiveram o início do ano letivo, e considerando que a realidade mundial da pandemia de coronavírus leva a crer que o isolamento social no Brasil será mantido por ainda muito tempo, impedindo-se a retomada regular e presencial do ensino, a MP desconsidera, de maneira precipitada, que o cumprimento de tamanha carga horária poderá ser prejudicada.

 

6. De que maneira essa carga horária poderá ser cumprida? Caso o isolamento se estenda para além do mês de maio, que já é uma previsão razoável em diversos estados brasileiros, haverá tempo suficiente para fazê-lo por meio de atividades complementares? Poderemos ter a instituição de educação integral para dar sequência a essa determinação? E como ficam os estados e municípios que não terão condições de estabelecer essa modalidade e que não possuem corpo docente suficiente? Quanto a eventual instituição de educação à distância, entende-se que essa não é uma medida viável, na medida em que a realidade brasileira não contempla acesso suficiente à tecnologia, como computadores e internet de banda larga, para grande parte dos estudantes brasileiros. Tampouco há treinamento didático-pedagógico para os docentes, de forma a habilita-los a promover a educação à distância em tão curto espaço de tempo.

 

7. Para os cursos de Medicina, Farmácia, Enfermagem e Fisioterapia, a MP 934 permite que a instituição de ensino superior poderá abreviar a duração dos cursos, desde que o aluno cumpra 75% da carga horária de internato para o curso de medicina e 75% da carga horária do estágio curricular obrigatório dos cursos de enfermagem, farmácia e fisioterapia. Essa previsão é uma inovação da MP, em relação à própria LDB e aos regulamentos dos cursos mencionados, haja vista que ela compreende a formatura antecipada desses alunos. Possivelmente, essa previsão foi adotada para eles possam ser chamados a fazer frente ao combate da pandemia, em novas medidas futuras.

 

8. A despeito da MP possuir um texto vago e não muito distante daquilo que a própria LDB já traduz quanto ao cumprimento de 75% do total de horas letivas para a aprovação do discente no ano letivo, há previsão expressa de que serão as próprias instituições de ensino que precisarão regulamentar a forma como o cumprimento da carga horária ocorrerá. Mas essa análise jurídica compreende que é necessário que haja também a flexibilização da carga horária no Congresso Nacional, para se permitir que as instituições de ensino também possam dar sequência ao calendário acadêmico de acordo com a sua realidade. É importante que cada instituição de ensino de cada localidade possa decidir da melhor maneira, inclusive baseado nos critérios de atingimento regional mais severo ou menos prejudicial pelo coronavírus e que todos os agentes envolvidos, inclusive familiares e corpo discente, participem da construção desse direcionamento.

 

9. Por fim, aqui não se sugere que as instituições de ensino devam descumprir as determinações da MP ou que os discentes sejam colocados em situação de prejuízo maior do que o que já enfrentam. Mas questiona-se a razoabilidade de uma medida como essa, desconectada da situação fática dos docentes e discentes, em um momento em que toda a sociedade está se adaptando a algo inédito.

 

10. Sendo o que tínhamos para o momento, subscrevemo-nos.

 

Leandro Madureira Silva OAB/DF n.º 24.298

Assessoria Jurídica Nacional