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    Parecer Jurdico




Medida Provisória nº 922/20. Altera a Lei nº 8.745/93 e outras. Contratação por tempo determinado

  09/03/2020



Brasília(DF), 3 de março de 2020.

 

Ilustríssima Senhora Professora EBLIN JOSEPH FARAGE, Secretária-Geral do SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR- ANDES-SINDICATO NACIONAL. 

 

Ref.: Medida Provisória nº 922/20. Altera a Lei nº 8.745/93 e outras – Contratação por tempo determinado - Análise Jurídica. _________________________

 

Prezada Profª. Eblin,

 

1. Em atenção ao solicitado por esse Sindicato Nacional, vimos, por intermédio desta, apresentar nossa análise jurídica preliminar da Medida Provisória (MP) nº 922, de 28.2.20, que alterou as Leis nºs 8.745, de 9.12.93, 10.820, de 17.20.03, 13.334, de 13.9.16 e 13.844, de 18.6.19.

 

 2.  A MP nº 922/20, dentre outras medidas, altera as regras de contratação de mão de obra por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. E surge, sob a justificativa de fazer frente ao grave problema de falta de pessoal no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que atualmente não consegue atender aos pedidos de benefícios previdenciários. 

 

 3.  De imediato, verifica-se que a MP nº 922/20 ampliou consideravelmente o rol de atividades que podem ser consideradas de necessidade temporária de excepcional interesse público para contratação de pessoal, inclusive retirando limitações anteriormente existentes. O artigo 1º, da MP nº 922/20, incluiu/alterou as seguintes situações no artigo 2º, VI,

 

XI e XIII, da Lei nº 8.745/93: (a) para atender a projetos temporários na área industrial ou a encargos temporários de obras e serviços de engenharia; (b) no âmbito de projetos de cooperação com prazo determinado, implementados por meio de acordos internacionais, desde que haja, em seu desempenho, subordinação do contratado ao órgão ou à entidade pública; (c) necessárias à implantação de órgãos ou entidades ou de novas atribuições definidas para organizações existentes ou aquelas decorrentes de aumento transitório no volume de trabalho que não possam ser atendidas por meio da aplicação do disposto no art. 74, da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990; (d) de tecnologia da informação, de comunicação e de revisão de processos, não alcançadas pelo disposto na alínea “i” e que caracterizem demanda temporária; (e) de pesquisa e desenvolvimento de produtos e serviços, no âmbito de projetos com prazo determinado, com admissão de pesquisador ou de técnico com formação em área tecnológica de nível intermediário ou superior, nacional ou estrangeiro; (f) que se tornarão obsoletas no curto ou médio prazo em decorrência do contexto de transformação social, econômica ou tecnológica, que torne desvantajoso o provimento efetivo de cargos em relação às contratações de que trata a lei; (g) preventivas temporárias com objetivo de conter situações de grave e iminente risco à sociedade que possam ocasionar incidentes de calamidade pública ou danos e crimes ambientais, humanitários ou à saúde pública; (h) contratação de professor para suprir demandas excepcionais decorrentes de programas e projetos de aperfeiçoamento de médicos na área de Atenção Básica em saúde em regiões prioritárias para o Sistema Único de Saúde, por meio de integração ensino-serviço, observados os limites e as condições fixados em ato conjunto dos Ministros de Estado da Economia, da Saúde e da Educação; (i) assistência a situações de emergência humanitária que ocasionem aumento súbito do ingresso no País.

 

 4.  No que trata das formas de contratação, apesar de mantida a necessidade da realização de processo seletivo para o recrutamento de pessoal na forma do artigo 3º, da Lei nº 8.745/93, a MP nº 922/20 aumentou as possibilidades em que ele não será necessário para contratação, que passam a ser as seguintes (art.3º, § 1º): (a) calamidade pública; (b) emergência em saúde pública; (c) emergência e crime ambiental; (d) emergência humanitária; e (e) situações de iminente e risco à sociedade; e também quando poderá ser efetivada apenas em vista de notória capacidade técnica ou científica do profissional, mediante análise do curriculum vitae (artigo 3º, § 2º).

 

5. A grande inovação da MP nº 922/20 foi aquela introduzida na Lei nº 8.745/93, por intermédio do novel artigo 3º-A, estabelecendo que a necessidade temporária de excepcional interesse público poderá ser atendida por meio da contratação, por tempo determinado, de servidor aposentado pelo regime próprio de previdência social. 

 

6. Nessa modalidade de contratação temporária, o recrutamento será por meio de edital de chamamento público, não podendo dele participar aqueles servidores aposentados por incapacidade permanente ou com idade igual, ou superior a setenta e cinco anos

 

 7. O prazo do contrato não poderá extrapolar o prazo de dois anos, contadas as prorrogações, e aplicáveis aos contratados apenas as disposições dos Títulos IV (Do Regime Disciplinar) e V (Do Processo Administrativo Disciplinar) da Lei nº 8.112/90. 

 

8. As atividades exercidas por esses aposentados poderão ser específicas, quando se tratarem daquelas inerentes ao cargo em que se deu a aposentadoria, ou gerais, quando passíveis de serem exercidas por servidores aposentados de qualquer carreira ou cargo e a retribuição pecuniária não será incorporada aos proventos de aposentadoria, não servirá de base de cálculo para benefícios ou vantagens e não estará sujeita a contribuição previdenciária, limitando-se ao pagamento de diárias, auxílio-transporte e auxílio-alimentação. 

 

 9 Especificamente em relação ao prazo dos contratos da Lei nº 8.745/93, além dos ajustes decorrentes das alterações promovidas pela MP nº 922/20, foi estabelecido um novo limite de oito anos para a hipótese prevista na alínea “o” do inciso IV do artigo 2º, da Lei nº 8.745/93, que é a de pesquisa e desenvolvimento de produtos e serviços, com admissão de pesquisador ou de técnico com formação em área tecnológica de nível intermediário ou superior nacional ou estrangeiro. 

 

10. Além das disposições acima mencionadas, foram alterados os seguintes artigos da Lei nº 8.745/93: (a) art. 5º, para estabelecer a possibilidade de dispensa de prévia autorização ministerial para contratação nas hipóteses de calamidade, emergência e situações de risco previstas no § 1º do artigo 3º da Lei nº 8.745/93; art. 7º, I e § 2º, para ajustes na questão remuneratória em razão das modificações trazidas pela MP e estabelecimento de nova forma para fixação das tabelas remuneratórias; (b) art. 8º, para excluir os servidores aposentados do regime da Lei nº 8.647/93, que dispõe sobre a vinculação do servidor público, ocupante de cargo em comissão, ao Regime Geral de Previdência Social, (c) art. 9º, para abrir a possibilidade de nova contratação antes de decorrido o prazo de vinte e quatro meses contados da data de encerramento do primeiro contrato, desde que seja na hipótese de processo seletivo simplificado de provas ou de provas e títulos; e (d) art. 11, para estabelecer as disposições da Lei nº 8.112/90 aplicáveis ao pessoal contratado nos termos da Lei nº 8.745/93.

 

11.  No que pode atingir mais diretamente as Instituições Federais de Ensino (IFEs), cumpre destacar a hipótese prevista art. 2º, VI, “o”, que considera como necessidade temporária as atividades de pesquisa e desenvolvimento de produtos e serviços, no âmbito de projetos com prazo determinado, com admissão de pesquisador ou de técnico com formação em área tecnológica de nível intermediário ou superior, nacional ou estrangeiro, cuja contratação será em vista de notória capacidade técnica ou científica do profissional mediante análise de currículo e por até oito anos.

 

12. Cumpre ressaltar, que a MP nº 922/20, para além das questões relativas à contratação temporária, trouxe, em seu artigo 3º, a previsão de que para os fins do disposto na Lei nº 8.112/90, a avaliação pericial realizada pela perícia médica federal dispensa a necessidade de junta médica ou de perícia por cirurgião-dentista. Desse modo, a partir de agora, os servidores públicos federais afastados de suas atividades poderão passar pela mesma perícia que avalia os segurados do INSS.

 

13. A MP nº 992/20 também alterou a Lei nº 13.334, de 13.9.16, que criou o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), para transferir ao Poder Executivo a competência para dispor sobre o funcionamento e a composição de seu conselho diretivo. Antes, essas diretrizes estavam estabelecidas na própria lei. Cumpre ressaltar, que o PPI coordena as privatizações e as políticas de investimentos em infraestrutura por meio de parcerias com o setor privado.

 

14. E por fim, outra alteração legislativa trazida pela MP nº 992/20 foi na Lei nº 10.820, de 17.12.03, para autorizar a terceirização da prestação dos serviços de operacionalização de consignações pelo INSS, por meio de licitação ou contratação direta, por dispensa de licitação, quando se tratar de ente público 

 

15. Numa análise jurídica preliminar, sem olvidar-se que a contratação por tempo determinado encontra seu elemento fundante no artigo 37, IX, da Constituição, que estabelece a necessidade de lei para regular os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, é perceptível a extrapolação dessa finalidade com as alterações promovidas pela MP nº 992/20 na Lei nº 8.745/93.

 

16. Verdadeiramente, necessidade temporária de excepcional interesse deve ser entendida como aquela requerida em situações muito importantes que demandem atuação pública, porém pela transitoriedade, não requer a criação de cargo público, ou, se assim requerer, pela urgente necessidade, contrata-se temporariamente até que os cargos sejam criados e o concurso público seja realizado.

 

17.  Contudo, conforme relatado nos itens anteriores, além do aumento das possibilidades de contratação nessa modalidade, que não se encontram inseridas no conceito trazido no art. 37, IX, da Constituição, foram também retiradas limitações anteriormente existentes, que tornam o espectro de aplicação da Lei nº 8.745/93 infinitamente maior e que materializa uma burla a regra do concurso público estabelecida no art. 37, II, da Constituição. 

18. Somado ao fato de que os termos vagos e imprecisos trazidos em diversos dispositivos pela MP nº 992/20, certamente também suscitarão dúvidas acerca do alcance desse tipo de contratação, ampliando o debate acerca de sua inconstitucionalidade. Exemplo disso, é a disposição contida no artigo 2º, § 4º, da Lei nº 8.745/93, que transfere ao Poder Executivo a prerrogativa de definir quais cargos serão declarados obsoletos.

 

19. Deveras, a MP nº 992/20 revela a intenção do atual governo de substituir a contratação de servidores efetivos por concurso público, que permite o acesso a cargo público de modo amplo e democrático, pela contratação de trabalhadores temporários, cujas regras de seleção e dispensa não são rígidas e potencializam os riscos de favorecimento pessoal e indicação políticas. Logicamente, tudo dentro da atual política de desmonte do serviço público.

 

20. Nesse sentido, por esses motivos, vislumbramos a inconstitucionalidade da MP nº 992/20 e indicamos a necessidade de um aprofundamento da matéria para que possamos definir uma estratégia jurídica de enfrentamento.

 

21. Sendo o que tínhamos para o momento, subscrevemo-nos.

 

Rodrigo Peres Torelly OAB/DF n.º 12.557 Assessoria Jurídica Nacional

 

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