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  11/04/2024 - por Lucas Milhomens



Elon Musk e o futuro da Amazônia



 

Imaginem a seguinte situação: você é um dos homens mais ricos do mundo, nascido no continente africano, filho de um empresário que começou a vida explorando esmeraldas na África do Sul (apoiado pelo execrável regime de segregação racial, o Apartheid). Coleciona investimentos bem-sucedidos (e alguns fracassos pouco publicizados) em várias áreas ligadas à tecnologia, de pagamentos online, carros elétricos, satélites para conexão de internet, criação de plataforma de inteligência artificial (IA), compra de famosa rede social – que ninguém consegue chamar pelo nome atual de “X” – e a aplicação comercial de foguetes em viagens espaciais e tudo que puder ser explorado pelo capitalismo selvagem – e tecnológico – do século XXI.

 

Gosta de aparecer e de emitir opiniões contraditórias e polêmicas, como o questionamento sobre a pandemia de Covid-19 e a eficácia das vacinas, emana uma posição conservadora na política há anos, apoiando um crescente movimento de extrema-direita mundial, com especial atenção para o Brasil e seu ex-presidente, o genocida Jair Bolsonaro.

 

No entanto, é pragmático na economia e esquece de questões ideológicas quando se trata de ganhar dinheiro em países notoriamente autoritários como a China. A maior potência econômica do mundo é também parceira comercial essencial para a produção de seus carros elétricos. Musk só esqueceu de dizer que lá seu “X” é proibido para a toda população, atentando contra a “liberdade de expressão” tão defendida dissimuladamente pelo sul-africano.

 

Nos últimos dias o bilionário tem atacado veementemente o Supremo Tribunal Federal (STF), mais especificamente o ministro Alexandre de Moraes, questionando o bloqueio de perfis de sua rede social, os mesmos que sistematicamente cometeram crimes divulgando informações falsas que culminaram no atentado à democracia brasileira com a invasão das sedes dos três poderes da República no dia 8 de janeiro de 2023.

 

Mas, afinal, qual o interesse de Elon Musk na Amazônia?

 

Eu diria, muitos. Mas, principalmente, a mola propulsora de qualquer empresário capitalista: o lucro. Em maio de 2022 o bilionário esteve no Brasil e se encontrou com várias autoridades, dentre elas o ministro das comunicações à época, Fábio Faria, e o então presidente Bolsonaro. Na pauta, projetos de “inclusão digital” capitaneados pela SpaceX e seu braço na fabricação de satélites, a StarLink, empresa que ficaria responsável por viabilizar internet de alta velocidade em regiões remotas do país, principalmente na Amazônia.

 

Concomitante a vinda de Musk ao Brasil, um acordo secreto e de longo prazo segundo o Observatório da Mineração, foi firmado entre a Tesla (outra empresa do bilionário) e a Vale S/A (multinacional sediada no Brasil) para compra de níquel, mineral utilizado na produção de baterias de longa durabilidade, essenciais para o funcionamento de seus carros elétricos. A análise da entidade é a de que o setor de produção mineral é fundamental para o futuro dos negócios de Musk, que inclui além da compra de níquel, a exploração de cobalto e lítio, substâncias que também são utilizadas na produção de baterias e outros compostos eletrônicos.

 

O Comitê Nacional em Defesa dos Territórios Frente à Mineração produziu uma série de reportagens sobre o tema onde avalia que a demanda global por minerais estratégicos para uma “transição energética” (tais como o níquel e lítio) já está intensificando a pressão em regiões com grande potencial de exploração, muitas delas localizadas em território amazônico.

 

Logo após o encontro com Musk, o Governo Federal à época, por meio da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) aprovou a operação comercial da frota de satélites da Starlink, o que gerou um verdadeiro “boom” da empresa região, tornando a Amazônia seu principal mercado no Brasil. Segundo informações da BBC Brasil, a Starlink já cobre 90% dos municípios da Amazônia Legal.

 

O argumento é atrativo: disponibilizar internet de alta velocidade a uma região historicamente excluída digitalmente onde o Estado não consegue chegar, possibilitando acesso a qualquer um que possa comprar a “antena da Starlink”. Mas, na prática, a promessa está longe de ser uma realidade, já que só quem pode comprá-la são empresários e outras organizações com grande poder aquisitivo, como, por exemplo, o crime organizado ligado ao garimpo ilegal.

 

Segundo reportagem do Brasil de Fato, a internet disponibilizada por Elon Musk foi vital para o crescimento do garimpo ilegal na Amazônia, que em menos de um ano cresceu exponencialmente, principalmente em terras indígenas. Como no caso de garimpeiros que atuam na terra Yanomami, no estado de Roraima.

 

Segundo dados do Ministério Público Federal, o que deveria ser uma vantagem acaba sendo um problema porque o uso da internet tem dificultado as operações policiais em regiões de garimpo com difícil acesso, já que os criminosos agora podem se comunicar instantaneamente – por meio de aplicativos e grupos de mensagens – visado alertar seus comparsas de possíveis operações policiais.

 

Além disso, a conexão ajudou a aumentar a ‘produtividade’ desse tipo de crime em comparação com os anos anteriores. Para se ter uma ideia, em grupos de WhatsApp e no Facebook são oferecidos serviços como o transporte até a área de exploração ilegal, contratação de profissionais diversos para atuar no garimpo e até a venda de mercúrio, substância altamente tóxica utilizada para a mineração de ouro. Interessante destacar que há diversas imagens feitas por equipes federais das apreensões de equipamentos onde funcionavam esses garimpos, colocando lado a lado antenas da Starlink, roteadores, armas e balas, ou seja, um verdadeiro “kit de destruição do meio ambiente”.

 

A ausência de uma fiscalização eficiente por parte do poder estatal e a estratégia jurídica das empresas de Musk de não se responsabilizar pelos possíveis crimes cometidos por parte de usuários da Starlink deixa claro que o bilionário não está nem um pouco preocupado com as consequências nefastas geradas pela utilização de seu serviço de internet por garimpeiros ilegais e outros criminosos.

 

Além disso, seu recente acordo com a Vale e interesse crescente pela exploração mineral deixa claro quais são suas prioridades no Brasil. Fica nítido então que os métodos do bilionário remontam ao começo da fortuna de sua família. No entanto, em vez de explorar esmeraldas na África do Sul apoiado pelo governo segregacionista, concentra hoje seu poderio em estratégias corporativas para dragar a terra em território nacional (e no jardim amazônico) com as bênçãos do Estado e de grande parte da opinião pública.

 

* Lucas Milhomens é jornalista e professor da Ufam

 

Imagens na fotomontagem: Starlink; Theo Wargo/WireImage via Getty Images; Chico Batata/ Greenpeace







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