Os ideólogos capitalistas colonialistas sabem muito bem, mas fingem ignorar, que a alienação é estrutural nas sociedades colonizadas, vinculadas à ordem capitalista dependente. Isso significa dizer que tanto as classes favorecidas quanto as classes desfavorecidas são alienadas para possibilitar as injustiças, as desigualdades, a cultura da ignorância, o regime de propriedade privada, a sacralização do mistério, o desprezo pela ciência e a naturalização da pobreza material e intelectual da maioria de homens e mulheres que vivem nos países colonizados.
As Ordenações dos reis de Portugal e as bulas dos papas da Igreja Católica Apostólica Romana contêm os preconceitos, o racismo e a xenofobia estruturais que os invasores europeus e seus descendentes deveriam adotar contra os seres humanos que, por ventura, fossem encontrados nos territórios invadidos da América, África e Ásia. Por sua vez, os capitalistas europeus financiaram a fabricação de embarcações para descoberta de novas terras e a invenção de armas de fogo para que os invasores se protegessem dos nativos que, por ventura, tentassem impedir a exploração dos recursos agrícolas e minerais e a espoliação da sua força de trabalho. É evidente que as classes privilegiadas europeias (capitalistas, os reis e as suas cortes, os dignatários eclesiásticos) esperavam auferir grandes lucros através das ações determinadas para as classes favorecidas (latifundiários) e desfavorecidas nas novas terras. Era através da violência que as classes favorecidas agiam contra as pessoas das classes desfavorecidas (nativos da América, África e Ásia) obrigando-as a trabalhar à força nas terras açambarcadas pelos invasores, impondo nessas terras as normas de propriedade criadas por capitalistas europeus a partir do século XVI.
No texto “Manifesto do Partido Comunista”, Marx e Engels declararam que “A história de todas as sociedades que existiram até nossos dias tem sido a história das lutas de classes”. ”Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, mestre de corporação e companheiro, numa palavra, opressores e oprimidos, em constante oposição têm vivido numa guerra ininterrupta, ora franca, ora disfarçada [...]”
Os autores informam que, na época moderna, a burguesia e o proletariado confrontam-se, para defender seus respectivos interesses. Eles deixam claro que a burguesia, através da grande indústria, ampliou seus negócios em todo mundo, determinando os modos e as relações de produção, impondo formas de governo, mais precisamente, de administração pública que beneficiam seus interesses. Desse modo, podemos inferir que a invasão do território brasileiro pelos portugueses, a apropriação das terras dos nativos, os genocídios praticados contra homens, mulheres e crianças nativos da América e da África, a escravização desses nativos atendeu os interesses gananciosos não só de colonos portugueses como das classes privilegiadas europeias que financiaram esses empreendimentos.
A proclamação da independência (1822), a abolição da escravatura (1888) e a proclamação da república (1889) não aboliram os modos e as relações de produção implantados pela colonização portuguesa a partir de 1500, haja vista que as lideranças políticas das classes favorecidas promulgaram em 1850, a Lei da Terra que reiterava que a aquisição de terras no Brasil deveria ser realizada através de compra diretamente do Governo Imperial., impedindo, desse modo, que os imigrantes pobres e as pessoas das classes desfavorecidas pudessem adquirir terras para produzir suas condições de vida, ao invés de se submeterem ao trabalho nas terras dos latifundiários.
Por sua vez, os políticos e militares, comprometidos com os interesses das classes favorecidas luso-brasileiras e das classes privilegiadas das metrópoles capitalistas europeias, continuaram administrando o país independente como se fosse uma feitoria de sua propriedade, mantendo suas ações e ideias medievais de dominação e de exploração das classes desfavorecidas. Os políticos continuaram a administrar a propriedade e a terra privadas em favor das classes possuidoras internacionais. Os militares e as forças de segurança (milícia, guarda nacional) continuaram considerando as pessoas das classes desfavorecidas como inimigas estrangeiras da nação, sem direitos, com a obrigação de cumprirem os deveres estabelecidos para elas. Os militares e as forças de segurança constituíram-se em forças mercenárias para garantir a lei e a ordem em favor das classes possuidoras nacionais e internacionais.
*Isaac é professor aposentado da Faculdade de Educação/UFAM
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