O ANDES-SN, que completará 40 anos em fevereiro de 2021, tem sua história de organização sindical pautada na democracia, autonomia e organização pela base. Esses princípios, que podem parecer retórica em tempos de crise de representatividade e de fragmentação da organização coletiva, foram decisivos, ao longo do tempo, para manter o Sindicato Nacional autônomo e combativo. Certamente os caminhos trilhados de forma coletiva e a partir das deliberações da categoria, em Congressos e Conads, não estão isentos de erros e atropelos. Alguns só perceptíveis com o passar do tempo, quando conseguiremos, então, olhar para trás e analisar, com outros elementos do processo histórico, as deliberações tomadas.
Mas, certamente, um erro que não faz parte desse sindicato é o de decidir pelas superestruturas. Até porque, a conformação da organização da categoria, ainda como a ANDES, foi impulsionada pelo princípio das deliberações coletivas, pela base, por local de trabalho e de forma autônoma de partidos, governos e administrações. Essas foram escolhas coletivas que, sem dúvida, deixaram marcas na trajetória do Sindicato Nacional e que, em inúmeros momentos, foram compreendidas por uma parte da categoria como isolacionismo ou radicalismo. Compreensões essas que não se firmam na realidade, pois todos os temas e posicionamentos no ANDES-SN são eivados de debates, reflexões, disputas, enfrentamentos, polêmicas e, ao final, deliberados pelas bases.
Assim, não poderíamos esperar outra coisa, nesse momento conjuntural de profunda crise econômica, social, cultural, agravado pela pandemia, em que somos desafiados a pensar os rumos do Sindicato Nacional. Não poderíamos esperar nada menos que discordâncias, debates e reflexões sobre os rumos a serem seguidos. Isso sim é um princípio desse sindicato: o debate, as reflexões e, ao final, o respeito às escolhas do(a)s sindicalizado(a)s.
É necessário registrar que a condição atual, imposta pela pandemia da Covid-19, que já matou mais de 135 mil e contaminou mais de 4,5 milhões de pessoas no país, entre elas professores e professoras, estudantes, parentes e amigos, nos coloca em uma realidade de absoluta excepcionalidade. Uma realidade que nos impôs o isolamento social que, para a área da educação, enquanto não houver condições sanitárias, deve ser por nós defendido como única alternativa para preservar a vida. Por isso, temos insistido que as vidas valem mais que os lucros! E que é possível “perder” o ano letivo, mas é necessário preservar vidas!
Na esteira das contradições postas pela conjuntura, que nos impôs uma realidade pessoal, laborativa e de militância absolutamente distinta da que estávamos acostumados, passamos a viver um período de absoluta excepcionalidade. Nessa conjuntura excepcional, somos também instados a dar respostas excepcionais, compreendendo que o fundamental, nesse momento, é defender a vida e garantir a democracia interna do Sindicato Nacional.
Assim, na nossa compreensão, o princípio intransponível para o ANDES-SN é ser um sindicato dirigido pelas bases, o que implica na garantia do direito do(a) s sindicalizado(a)s de definirem os rumos do sindicato, inclusive determinando quem desejam na direção de seu sindicato. A forma como faremos a mediação para a garantia do direito da categoria sindicalizada deve ser compreendida no bojo do contexto de excepcionalidade e, portanto, ancorada na legislação, também excepcional, criada para atender a uma realidade adversa. Por isso, mesmo sendo defensores de que as eleições devam ser PRESENCIAIS e por local de trabalho, avaliamos que a mediação da garantia de direito dos sindicalizados, de forma isonômica, nesse momento excepcional, deve ser o de realizar as eleições de forma telepresencial, ou seja, virtual. Essa avaliação tem como pressuposto que as eleições virtuais só são admissíveis no ANDES-SN para esse período de isolamento social, dado que, em momento de trabalho regular nas instituições de ensino, devemos primar pelos debates presenciais, pela interação, pela livre escolha do(a)s sindicalizado(a)s a partir da interação coletiva, como construímos na prática dessa entidade.
Compreendemos que as eleições do Sindicato Nacional, como princípio, devem ser pela base e que a prorrogação do mandato da atual diretoria, para além de 2020, se caracteriza como um rompimento de um preceito fundante da democracia sindical no campo da esquerda, que é o rodízio das direções. Politicamente consideramos inoportuno, em um momento em que várias categorias realizam eleições virtuais e em que até as eleições municipais estão mantidas, vetar ao(à)s sindicalizado(a)s a possibilidade de escolher a direção e o projeto que querem ver à frente de seu sindicato.
Por isso, por mais desafiante que seja, ao pensar uma modalidade de eleição que não tem previsão estatutária no ANDES-SN, mas que se torna legal por conta das leis 14.010/2020 e 14.030/2020, é necessário nos desafiarmos para que o chamado “novo normal”, o qual não devemos naturalizar, não se configure como uma desculpa para a perpetuação de uma direção sindical. A direção do ANDES-SN deve manter seu caráter executivo e o princípio de ser pautada pelas deliberações da base, portanto, jamais pode ser encarada como um “aparelho” que deve estar a serviço de correntes, partidos ou grupos políticos.
A forma como as eleições podem ocorrer, nesse momento excepcional, é apenas uma dimensão desse processo. A essência é saber se seremos ou não capazes de manter o princípio central de nosso Sindicato Nacional que é a deliberação e escolha pela base, mesmo que essa escolha não seja a mesma que a direção defende. Isso sim é primar pelos processos democráticos.
Assim, compreendemos que nesse momento em que a extrema-direita ganhou o planalto central e vários governos estaduais e municipais, e que a educação pública, gratuita, de qualidade, socialmente referenciada, antimachista, antissexista, antilgbtfóbica, anticapacitista e antirracista está no centro dos ataques, assim como o conjunto do funcionalismo público, temos que nos responsabilizar com os rumos de nosso sindicato, instrumento fundamental para as lutas e enfrentamentos.
Certamente, os desafios que vivemos hoje entre mobilização virtual x mobilização nas ruas; ensino remoto x defesa do isolamento social; prorrogação do mandato da diretoria x eleições para o Sindicato; defesa do conjunto do funcionalismo público x reconhecimento de privilégios de determinadas categorias, entre outros, devem ser compreendidos no âmbito das contradições. Assim, mediados pela necessidade de construirmos possibilidades reais de garantia de direitos para a classe trabalhadora, de participação, de experiências democráticas, temos que manter como horizonte a superação da sociabilidade opressora e desigual imposta pelo capitalismo.
Por isso, tão importante quanto pensar a forma como queremos eleger a nova direção do Sindicato Nacional é também pensar que projeto queremos que esteja à frente do ANDES-SN. Para isso, avaliamos ser fundamental nos pautarmos pelos princípios que construíram essa entidade, quais sejam: a democracia interna de deliberação pela base; a autonomia de partidos, governos e gestões; a participação e o projeto de Educação Pública Superior construído ao longo das últimas décadas. Assim como a capacidade de criar unidade de ação, sem com isso sucumbir a projetos particulares e/ou partidários, apontando as ruas como nosso principal espaço de luta e articulações com movimentos sociais e outras categorias da classe trabalhadora. O momento é excepcional, mas o princípio do debate democrático que sempre nos pautou há de construir o caminho para que o ANDES-SN siga defendendo os projetos de educação e sociedade onde a opressão não tenha mais vez.
*Eblin é secretária geral do ANDES-SN e professora de Serviço Social da Universidade Federal Fluminense (UFF).
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