A necessidade de aprofundar o debate e construir a unidade na luta pela negociação e contração coletiva no serviço público e em defesa do direito de greve no funcionalismo reuniu nesta terça-feira (19) diversas entidades dos servidores públicos dos três entes federativos em um seminário na Câmara dos Deputados. O evento contou com a presença de cerca de 600 participantes, das mais diversas categorias do serviço público.
O debate foi organizado pelo Fórum das Entidades Nacionais dos Servidores Públicos Federais e a mesa contou com a participação de representantes do Departamento Intersindical do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), Departamento Intersindical de Assuntos Parlamentares (DIAP), Advocacia Geral da União (AGU) e das centrais sindicais.
Nas falas de abertura, o 1º vice-presidente do ANDES-SN, Luiz Henrique Schuch, apresentou em nome do Fórum dos SPF o cartaz da campanha pela anulação da Reforma da Previdência.
“Nos unimos em torno desta causa e a campanha está nas ruas. Se sociedade não se mobilizar, dificilmente haverá conseqüência prática do julgamento do Mensalão, que repercuta na anulação da Reforma da Previdência. Conclamamos as entidades a promover o debate em seus estados e municípios e dar ampla divulgação à campanha”, disse Schuch.
Riscos
Falando em nome do Dieese, Nelson Karan, disse que a ausência de uma regulamentação da negociação coletiva e da convenção 151 da OIT cria um vazio perigoso para o direito dos servidores. “Corre-se o risco de se fazer como acontece no setor privado, em que a discussão centra em torno de um ponto de interesse do patronato e se ignora o conjunto que compõem o sistema de relações do trabalho”, alertou.
O coordenador do Dieese ressaltou também a necessidade das entidades representativas dos servidores buscarem seus pontos de unidade para defenderem o direito de greve e de negociação coletiva, com abrangência para os servidores dos três entes federativos.
Atraso brasileiro
Mário Guerreiro, da AGU, fez um resgate de como se deu a regulamentação do direito de greve e negociação coletiva em vários países como Portugal, Argentina e Itália, onde o processo aconteceu já em 1983, para apontar o atraso do Estado brasileiro no trato desta questão.
Guerreiro criticou a cobertura dos veículos de imprensa com o propósito de contribuir com a desvalorização da imagem do serviço público, incentivando ao argumento da terceirização como alternativa de economia do dinheiro público. Ele afirmou que tal argumento é falso e que muitas vezes, com a utilização de mão de obra terceirizada, a administração pública acaba pagando mais caro pelo serviço.
Retirada de direitos
O representante do Diap, Antônio Queiroz, lembrou que ao longo das últimas décadas as restrições aos direitos de negociação dos trabalhadores do setor público foram se aprofundando com medidas do governo, como a extinção da possibilidade de alterar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) por Medida Provisória (MP), a criação do dispositivo da LDO que fixa prazo de 31 de agosto para a apresentação de iniciativa sobre remuneração dos servidores públicos ao Congresso Nacional, até a explicita provocação por parte do governo federal no ano passado com o Decreto 7.777, com o objetivo de criminalizar e impedir a greve dos servidores.
“A regulamentação pode ajudar, pois se define um cronograma que o governo tem a obrigação de seguir. Mas ela só faz sentido se vier acompanhada de uma política salarial, com revisão geral anual, o que já está assegurado na Constituição Federal”, salientou, lembrando que é importante que os movimentos lutem também pela revogação do dispositivo de cobrança de contribuição previdenciária por parte dos inativos.
Cautela e consenso
O coordenador da CSP-Conlutas, José Maria de Almeida, fez um contraponto às falas da mesa lembrando que é necessário ter cuidado quando se discute propor, por parte do movimento sindical, um projeto de lei que regulamente o direito de greve.
“Acho que não podemos ser nós, os trabalhadores, a colocar obstáculos aos nossos direitos. Não dá para acreditar que a preocupação do governo num momento de greve do funcionalismo seja a garantia do serviço prestado à população. Senão, destinaria mais recursos à educação, saúde e transporte por exemplo. Nunca uma pessoa morreu em um hospital por causa de uma greve, mas centenas morrem todos os dias por conta do descaso dos governos com o serviço público”, analisou, criticando os projetos de lei apresentados pelo deputado Policarpo (PT-DF) e pelo coletivo das Centrais Sindicais - CUT, CTB, Força Sindical, NCST e UGT.
Para Almeida, os servidores devem defender a auto-regulamentação do direito de greve, uma vez que são muito mais responsáveis que os governos no trato aos usuários dos serviços públicos. Ele avaliou ainda que não há correlação de forças nesse momento para fazer o enfrentamento a disputa de projetos no Congresso.
Zé Maria ressaltou que neste momento é prioritário também lutar pela negociação coletiva aliada à contratação coletiva. Ou seja, que o acordado entre os entes federativos e as entidades sindicais tenha valor de lei.
Almeida refletiu ainda que os trabalhadores não podem aceitar a ideia imposta pelo governo de barganhar a possibilidade de negociação coletiva em troca de abrir mão do seu maior instrumento de pressão na negociação: o livre direito de exercício da greve. “Existe um movimento de se regulamentar a negociação coletiva em troca de limitar o direito de greve. Sem poder fazer greve, como os servidores irão pressionar para que negociação avance e suas reivindicações sejam atendidas?”, indagou.
O coordenador da CSP-Conlutas saudou a iniciativa do Fórum em promover o seminário para aprofundar o debate e disse ser possível construir a unidade entre as entidades e buscar “construir entre nós uma proposta de consenso sobre o direito de greve”.
Necessidade de avanço
Falando em nome da CUT e das outras quatro centrais sindicais que construíram um projeto de lei sobre o tema já apresentado ao Executivo, Pedro Armengol ressaltou que a judicialização do direito de greve no serviço público pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2007 já representa uma regulamentação do direito.
Para Armengol, ou as entidades avançam no debate de se tratar conflito de forma global ou correm o risco de ver direito de greve extinto. “Não dá para esperarmos isso acontecer. Esta é uma reflexão do ponto de vista tático. Temos que nos movimentar nesse processo de disputa e mostrar que temos capacidade de elaborar uma proposta, de dialogar com a sociedade. O resultado dessa disputa será proporcional à nossa capacidade de mobilização. Se não fizermos nada vai acontecer o pior”, considerou.
Levar para a base
Na avaliação de Luiz Henrique Schuch, do ANDES-SN, há um consenso de que é necessário avançar na institucionalização da negociação e contratação coletivas, preservando o direito irrestrito de greve. Permanecem, no entanto, diferenças de entendimento quanto às movimentações táticas.
“O seminário contribuiu muito para amadurecermos o debate. A expectativa agora é que os argumentos sejam levados às instâncias deliberativas das entidades participantes para que possam construir o consenso a partir da base, pois só assim teremos força para o enfrentamento”, ponderou Schuch, lembrando que o Fórum irá definir um calendário de debates sobre o tema nos estados.
Fonte: ANDES-SN |