A cada 10 pessoas mortas por policiais nas periferias do Brasil, oito são negras. A cada oito minutos, uma mulher é estuprada no país. Essa realidade que chama a atenção para o machismo e o racismo na sociedade brasileira foi revelada pelo Anuário de Segurança Pública de 2020. O levantamento foi feito com base em dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).
Em 2019, 79% das vítimas de assassinatos cometidos por policiais eram negras. Destas, 74% eram jovens com menos de 29 anos; três de cada quatro pessoas mortas tinham essa faixa etária. Se não são mortos pelas mãos da polícia, a população negra acaba sendo a maior vítima do sistema carcerário. Segundo o Anuário, mais de 755 mil pessoas foram presas, e dessas 66,7% eram negras e 32,3% brancas.
Machismo
O anuário revela um aumento de mortes de mulheres. A cada oito minutos, uma mulher é assassinada no país. Entre os homicídios dolosos (com intenção de matar), o número aumentou de 1.834 para 1.861 (aumento de 1,5%). As vítimas de feminicídio (assassinatos por violência doméstica ou discriminação de gênero) foram de 636 para 648 (aumento de 1,9%). Os casos de feminicídio aumentaram em 43% no período de 2016 a 2019.
As mulheres negras são as maiores vítimas neste contexto, de acordo com o Anuário. Dos assassinatos cometidos por violência doméstica ou discriminação de gênero, 66,6% tinham essa cor de pele.
Ainda de acordo com o levantamento, em 2018, a taxa de homicídio de mulheres negras foi quase o dobro da de mulheres não negras. Outro fato que aponta a intersecção entre machismo e racismo é de que o homicídio de mulheres não negras caiu 11,7% no período, a taxa entre as mulheres negras aumentou 12,4%.
A violência doméstica aumentou em 5% em 2019, em comparação com o mesmo período no ano anterior. Uma agressão física foi registrada a cada dois minutos em 2019, o que representa mais de 266 mil casos.
Para a integrante do Movimento Mulheres em Luta e da Secretaria Executiva Nacional da CSP-Conlutas, Marcela Azevedo, os dados atuais evidenciam a situação crítica que o país enfrenta. “É reflexo da combinação da falta de investimento em políticas públicas e do aumento do discurso permissivo e de naturalização da violência contra as mulheres. Infelizmente, estamos vendo essa postura nas diversas pessoas que se sentem tranquilas para defender o Robinho, por exemplo”, disse, citando o caso do jogador, que mesmo condenado por estupro na Itália foi convidado para jogar no Santos, transação desfeita, após repercussão negativa.
Governo Bolsonaro
O levantamento do Anuário com registros de 2019 apontam a necessidade do combate ao machismo e racismo no país. Ao contrário, o presidente Jair Bolsonaro, neste mesmo ano, reforçou discurso de ódio contra mulheres, gays e negros.
Em abril de 2019, em entrevista coletiva para a imprensa, Bolsonaro disse que o Brasil “não pode ser o país do turismo gay”. “Quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher, fique à vontade. Agora, não pode ficar conhecido como paraíso do mundo gay aqui dentro”, disse.
A declaração machista, sugerindo que as mulheres brasileiras poderiam servir de turismo sexual para os estrangeiros, somada à homofóbica, ao não respeitar a diversidade sexual no país, só confirmou sua postura preconceituosa e misógina. Além disso, reforçou a imagem já perpetuada do país como paraíso do turismo sexual, que serve de porta para a exploração de mulheres e crianças.
No mesmo período, Bolsonaro pediu a retirada de circulação de uma campanha publicitária em que jovens negros eram os protagonistas. A campanha lançada pelo Banco do Brasil trazia diversidade racial e sexual, e era voltada para o público jovem.
Ao comentar o assunto, Bolsonaro confirmou a decisão e novamente deu uma justificativa absurda e preconceituosa de que não quer dinheiro público usado em campanhas que tratem sobre diversidade.
LGBTfobia
Há ainda dados subnotificados no Anuário, cujos registros sobre discriminação e mortes por LGBTfobia e de injuria racial não foram devidamente informados. “Enquanto a violência machista salta aos olhos, apesar das dificuldades para denunciar durante a pandemia, outras formas de opressão seguem invisibilizadas nos registros oficiais, é preciso incorporar a tipificação de racismo e LGBTfobia nos crimes de violência”, alerta Marcela Azevedo.
A integrante do Setorial de Negras e Negros da Central e do Movimento Nacional Quilombo Raça e Classe, Maristela Farias, avalia que o crescimento do número de mortes de pessoas negras e mulheres no país “são fortalecidos pelo governo de Bolsonaro, que se elegeu com um discurso machista, racista e LGBTfóbico e se apoia neste discurso para cada vez mais oprimir e explorar a sociedade”, avalia.
Fontes: CSP-Conlutas e UOL
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