“Trem sem maquinista não chega em seu destino. País sem gestão paga o preço. Estamos pagando o preço pelo governo ter ignorado e minimizado a Covid-19“, sentenciou o epidemiologista da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Jesem Orellana. O país chega a 114.772 mil mortos pela doença.
Em termos de contaminados, o Brasil soma 3.605.783 milhões. Isso, sem contar a subnotificação, estimada em dezenas de milhares de infectados e óbitos. “É muito provável que já tenhamos passado de 180 mil mortes diretas e indiretas devido à pandemia de Covid-19 no Brasil. É uma situação bastante triste”, denuncia Jesem. O país é um dos que menos realiza testes para o vírus no mundo.
A história da pandemia no Brasil se resume a uma sequência de erros e más condutas, especialmente por parte do governo Jair Bolsonaro. ” A condução tem total diferença. Menos de 100 dias depois do primeiro caso no país, estávamos no terceiro ministro da Saúde. Um time de futebol que troca de técnico três vezes em três meses é sério candidato ao rebaixamento. É um sinal claro do fracasso da gestão da pandemia no Brasil”, disse.
Fator Bolsonaro
Bolsonaro demitiu dois ministros da Saúde: Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich. As duas demissões tiveram motivação similar; os ex-ministros, com formação na área médica, rejeitaram a posição do presidente de ignorar e ridicularizar a ciência. Mas, Jesem não poupa críticas a Mandetta que, deputado pelo DEM, foi grande defensor da Emenda Constitucional (EC) 95, que impôs um teto para os investimentos públicos que sufoca o sistema de saúde.
“Faço questão também de apontar que o Mandetta foi fervoroso defensor da EC 95 e hoje, como uma raposa travestida de ovelha, defende o SUS como se fosse um membro da reforma sanitária brasileira. A emenda fragilizou demais nossa capacidade de resposta rápida para eventos de grande magnitude. Essa emenda tirou muita verba da saúde. Agora temos um projeto orçamentário que prevê o corte (em 2021) de mais de 30 bilhões da Saúde nos próximos anos. Isso nos faz entender o porquê de mil mortes diárias”, observou.
Enquanto retira dinheiro da Ciência e da Educação e direciona para a Defesa, Bolsonaro segue incentivando aglomerações, perseguiu governadores que adotaram posturas contrárias às suas e mantém a ideia de receitar o medicamento Cloroquina como “solução mágica” para a doença, sendo que inúmeros estudos apontam que a substância não é eficaz para o tratamento da Covid-19.
No início do surto, Bolsonaro chegou a dizer que a Covid-19 não passava de “uma gripezinha” e que o Brasil não teria mais de 2 mil mortos, número de vítimas da pandemia de H1N1 em seu pior ano, 2009. Agora, com o completo fracasso na contenção do vírus, Bolsonaro ataca governadores, prefeitos, juízes e partidos de oposição.
“O fracasso do Brasil tem sido atribuído de forma desonesta a prefeitos e governadores. Eles também erraram, mas qualquer orquestra não funciona sem um maestro. Faltou no Brasil, sem dúvida, a liderança do governo federal, do Ministério da Saúde”, resumiu.
Parte deste fracasso, além do desgoverno do presidente, consiste na falta de capacidade estratégica de prevenção. “Falhamos. Não conseguimos fazer o controle da disseminação. Até hoje temos enorme dificuldade em falar no padrão da pandemia em populações remotas”, afirma o cientista.
Medidas de controle de contágios, aliada à medicina preventiva, poderiam desafogar o sistema de saúde e evitar, inclusive, gastos adicionais com leitos. “Se você controla a disseminação do vírus na comunidade, nas cidades, nos bairros, nas fábricas, você não precisaria abrir um enorme número de leitos e hospitais de campanha. Mas não qualificamos a atenção básica. A atenção hospitalar foi uma bagunça. Não tínhamos quantitativo suficiente de profissionais especializados para trabalhar em UTIs”, afirmou o epidemiologista.
Jesem lembra que o Brasil não foi pego de surpresa. O continente sul-americano foi um dos últimos afetados pela Covid-19, que já mostrava seu potencial de letalidade na Ásia e na Europa. “Não foi falta de aviso. O que faltou para países, como o Brasil, foi planejamento, infraestrutura de vigilância, laboratorial. Faltou atuarmos de forma antecipada. Faltou pautarmos nossa atuação no princípio da precaução. O governo brasileiro minimizou a pandemia e tornou-se motivo de chacota”.
Foto: Michael Dantas/Reprodução
Fonte: Rede Brasil Atual com edição da ADUA
|