Data: 29/11/2018
Foi realizado nos dias 23 e 24 de novembro, em Campinas (SP), o "3º Seminário de Ciência e Tecnologia do ANDES – Sindicato Nacional" que tratou como temática central o “Marco Legal e a privatização da Ciência e Tecnologia no Brasil”. O evento foi sediado pela Associação dos Docentes da Universidade de Campinas (Adunicamp) e cumpriu uma das resoluções do 63º CONAD com o objetivo de adensar a crítica ao projeto de privatização da C&T no país, diante dos recentes dispositivos legais que buscam regulamentar o Marco Legal de CT&I, destacando a importância de avançar nas ações de enfrentamento a esse projeto com as demais entidades e movimentos defensores de uma ciência pública e autônoma.
O Seminário contou com a participação de representações de várias seções sindicais, além de entidades que compõem o Movimento pela Ciência e Tecnologia Pública (MCTP), como o GAPI e o SINVAP Seção Sindical de Campinas e Jaguariúna. A temática do evento foi abordada em três mesas-debate e grupos mistos.
O ex-presidente do ANDES-SN, Ciro Correia (USP), e o advogado Adovaldo Medeiros Filho, representando a Assessoria Jurídica Nacional do ANDES-SN, na manhã do dia 23 de novembro, debateram sobre as implicações jurídicas e os enfrentamentos políticos diante da regulamentação do Marco Legal de C&TI.
Ciro Correia abriu os trabalhos destacando as atuais ofensivas do setor privado sobre a estrutura das universidades públicas e dos institutos de pesquisa públicos, onde se dá a produção de ciência e tecnologia no Brasil, traduzidas nas sucessivas mudanças na legislação visando à implementação e institucionalização do marco legal. Nessa direção, Ciro enfatizou a luta histórica que o ANDES-SN realiza sobre a interferência das Fundações de Apoio a Pesquisa no interior das Universidades Públicas como os principais agentes de fortalecimento do modus operandido setor privado no interior do espaço público.
Por fim, Ciro indicou a leitura e uso do Caderno 28 do ANDES-SN como importante ferramenta para fortalecer a resistência no que toca aos ataques no marco da Ciência e Tecnologia, destacando que “todo o nosso esforço, que deve continuar no sentido de esclarecer o que de fato está em jogo nesse processo de progressivamente colocar os Institutos e as Universidades Públicas a serviço dos interesses mercadológicos, não foi suficiente para impedir que se chegasse numa situação tão limítrofe. E, efetivamente, no discurso oficial das instituições públicas está presente uma perspectiva mercadológica e empresarial, muitas vezes de forma mais grosseira e tacanha do que quando vocalizada pelos próprios interesses empresariais”.
Em seguida, Adovaldo Medeiros Filho apresentou os elementos jurídicos para se pensar o impacto do novo Marco Legal de CT&I no interior das instituições públicas de ensino superior. Direcionou especial atenção para demonstrar a interferência da nova base jurídica de Ciência & Tecnologia para a Carreira Docente, com destaque, inclusive, para a necessidade de se considerar a inconstitucionalidade da Lei nº 13.243/2016 uma vez que a mesma fere os artigos 37 e 39 da Constituição Federal de 1988.
O Advogado destacou, ainda, o forte incentivo que o novo Marco Legal de CT&I traz para o espaço público das Universidades ampliando as relações privadas, ou de relações público/privadas. O Marco Legal de CT&I altera as relações de trabalho dos docentes em regime de Dedicação Exclusiva e permite que parte de sua atuação, do tempo do seu vínculo empregatício, seja destinada para a execução de trabalho junto ao setor privado. Isto incluiria cobrança de cursos, da restrição dos resultados das pesquisas aos seus financiadores, ou seja, o uso da infraestrutura pública com finalidades privadas.
Sistema de avaliação da pós-graduação e produção científica
Luciana Ferreira (EGPA e UNAMA) e Simone Silva (UFRJ) foram as debatedoras na segunda mesa, que ocorreu na parte da tarde do primeiro do evento, abordando os impactos do sistema de avaliação da pós-graduação na produção científica do Brasil.
Simone Silva realizou um resgate da história da construção e consolidação das instituições responsáveis pela organização e financiamento da Ciência e Tecnologia no Brasil, particularmente da pós-graduação stricto sensu, com forte influência dos EUA, a partir da Reforma Universitária de 1968. Após esse percurso histórico, apresentou as atuais configurações da estrutura de pesquisa e de avaliação da pós-graduação, a partir das orientações das agências de fomento e a lógica do atual modelo de avaliação regulada pela CAPES.
A pesquisadora destacou ainda a particularidade que o Brasil possui no que diz respeito ao lócus de produção de pesquisa centrado nas Universidades Públicas, portanto, uma construção que tem se dado por meio do financiamento público. Chamou atenção para manutenção da luta em defesa do espaço público, para que, apesar da vinculação que as universidades públicas já apresentam com o setor privado e seus interesses, não se perca a responsabilidade com a resolução das contradições e problemas da sociedade que se dão por meio das pesquisas oriundas desse espaço.
Na continuidade da produção de ciência no Brasil, Luciana Ferreira tratou da política de formação de mestres e doutores a partir das orientações dos Planos Nacionais de Pós-Graduação (PNPG), com centralidade para o atual plano (2011-2020). Destacou que, nessa atual etapa da história da formação de pesquisadores e da produção de Ciência e Tecnologia, a indução da pesquisa tem sido feita por meio dos editais das agências de fomento, da lógica produtivista como orientador da difusão do conhecimento científico e do financiamento centrado a partir das orientações políticas expressas nos PNPG.
Destacou a redução do financiamento para a pós-graduação nos últimos anos, depois de um período de grande crescimento, inversamente proporcional a expansão das matrículas e dos programas de pós-graduação no mesmo período, o que expressa um quadro de aprofundamento da precarização das condições de ensino e trabalho nesse espaço e de forçar as instituições formadoras à busca de financiamento fora das agências de fomento públicas.
Marco Legal de CT&I
Já no segundo dia de evento, Epitácio Macário (UECE), ex-diretor do ANDES-SN, abordou as implicações para o trabalho docente do Marco Legal de CT&I. Destacou o papel que parte dos pesquisadores cumprem ao captar recursos para as próprias pesquisas ou, a partir da cobrança das gestões, captar recursos diretamente para as instituições. Considerou que, esse movimento, em larga escala, ganha naturalização por parte dos pesquisadores nas universidades públicas e, o que está expresso pelo Marco Legal de CT&I e sua regulamentação, garante maior respaldo jurídico para essa prática.
Ainda na parte da tarde do dia 24 de novembro, foram realizados debates nos grupos mistos entre os participantes do Seminário, a fim de aprofundar os temas abordados nas três mesas e construir linhas de ações para o Grupo de Trabalho de Ciência & Tecnologia do ANDES-SN. Os encaminhamentos do Seminário serão importantes para subsidiar as propostas a serem apresentadas e apreciadas pela categoria no 38º Congresso buscando estabelecer as resoluções necessárias para armar a categorias para as próximas lutas no próximo período, que anuncia grandes retrocessos na política de Ciência e Tecnologia.
Foto: Rogério Bezerra
Fonte: ANDES-SN |