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Mão de obra voluntária evidencia precarização na Ufam



Data: 01/10/2018

Por Annyelle Bezerra

Nos últimos três anos, 83 professores sem vínculo empregatício ingressaram na Ufam, em detrimento da contratação de profissionais de carreira. Os dados obtidos pela ADUA evidenciam o descaso com a educação superior pública e a precarização gerada pela Emenda Constitucional (EC) nº 95, que congelou por 20 anos os recursos destinados à Educação, dificultando a realização de concursos públicos.

Amparados pela Resolução nº 015/2018, recém aprovada pelo Conselho Superior de Administração da Ufam (Consad), que regulamenta o Programa de Prestação de Trabalho Voluntário e substitui a Resolução 005/2002, em vigor até então, os professores não remunerados, desenvolvem atividades de ensino, pesquisa e extensão e estão sujeitos ao cumprimento de todas normas institucionais relacionadas às atividades que desempenham.

Para aderir ao programa, a pessoa física precisa ter o Plano de Trabalho aprovado na unidade acadêmica interessada em contratar e assinar um Termo de Adesão com duração de um ano, podendo ser renovado por igual período.

Adesões

Com 57 solicitações, 2016 foi o ano com mais adesões ao programa no âmbito da universidade, no período analisado; seguido por 23 credenciamentos, em 2017, e três casos até fevereiro deste ano.

As Faculdades de Estudos Sociais (FES) e Medicina (FM) acumulam o maior quantitativo de professores voluntários: nove cada uma.

A Faculdade de Tecnologia (FT) que, em 2013 foi alvo de um protesto de estudantes contra a falta de professores de carreira no curso de Engenharia de Produção e amargava um déficit de 34 professores, segundo relatório elaborado, na época, pela diretoria da unidade, ocupa atualmente, junto com a Faculdade de Odontologia (FAO) o segundo lugar em número de voluntários, oito cada uma. Com 105 professores em exercício, naquele ano, a FT, precisava de 139 docentes para que os alunos não fossem prejudicados.

O uso de mão de obra voluntária também está presente no Instituto de Ciências Biológicas ICB (7), na Faculdade de Educação Física e Fisioterapia – FEFF (6), na Faculdade de Direito - FD (4), no Instituto de Ciência Exatas – ICE (4), na Faculdade de Ciências Agrárias – FCA (2), na Faculdade de Letras – FLet (2), na Faculdade de Psicologia – Fapsi (1) e na Faculdade de Ciências Farmacêuticas – FCF (1).

Assim como nas unidades de fora da sede: Instituto de Ciências Exatas e Tecnologia – ICET (5), Instituto de Ciências Sociais, Educação e Zootecnia – ICSEZ (4), Instituto de Natureza e Cultura – INC (5) e Instituto de Saúde e Biotecnologia – ISB (2).

Precarização

Aprovada pelo Consad no dia 16 de junho deste ano, a Resolução nº 015 prevê que a prestação de trabalho voluntário nas atividades de docência na Ufam não ultrapasse 20% do quadro efetivo de professores da instituição, fixado atualmente em 1.608 servidores, não entrando nesta conta os 266 professores substitutos, contratados via processo seletivo, em caráter temporário.

Para a 1ª secretária da ADUA e professora da Fapsi, Ana Cristina Martins, o percentual, que em números absolutos permitiria o credenciamento de 321 docentes voluntários, representa a precarização das condições de trabalho da categoria e o sucateamento da Ufam. Ao utilizar o expediente de contratação de professores e professoras voluntários, a Universidade, segundo Ana Cristina, age em consonância com a política do Ministério da Educação (MEC) em não ampliar vagas. “Afinal, para quê vagas para o provimento de concurso para professores de carreira, se podemos lançar mão de professores voluntários?”, questiona.

O ANDES-SN também se posiciona de forma contrária a atuação de docentes em Instituição de Ensino Superior (IES) pública na referida modalidade. Postura embasada em parecer da Assessoria Jurídica Nacional (AJN) que aponta a atividade docente voluntária como “incompatível com os princípios que informam a administração pública, previstos no artigo 37, da Constituição Federal, em especial o da eficiência, da moralidade e do concurso público”. Na  análise da AJN, a contratação de professores voluntários para atenuar a carência de docentes em razão da falta de recursos públicos, não encontra amparo em legislação, “além de se constituir em nítida imoralidade administrativa”.

A utilização de professores voluntários em detrimento da contratação de profissionais de carreira veio à baila em reunião da Câmara de Ensino e Graduação (CEG/PROEG), no dia 18 de julho deste ano. Na ocasião, os conselheiros, por unanimidade e numa decisão histórica, indeferiram a homologação de três atos de contratação Ad referendum de docentes voluntárias para o curso de Fisioterapia em Coari.

O indeferimento, de acordo com Ana Cristina, que também é membro da CEG, se deu em razão da carga horária das docentes ser mais densa que a de professores substitutos, em relação à quantidade de disciplinas e turmas. “E, o mais agravante, é que 90% das atividades das três docentes, eram relacionadas a estágios supervisionados finais do respectivo curso, que exigem experiência e formação para o devido acompanhamento das intervenções dos futuros fisioterapeutas em instituições da rede pública de saúde de Coari”, ressalta a 1ª secretária da ADUA.

Ana Cristina destaca que, devido à distância da capital, as unidades de fora da sede sofrem ainda mais com a falta de professores efetivos. “Relatos feitos pela representante da Faculdade de Medicina, na reunião da CEG, dão conta de que, em Coari, o curso de Medicina, vem enfrentando dificuldades para obter professores. Para suprir a necessidade no curso, além do uso dos 20% de professores voluntários, docentes da área de Enfermagem estão sendo convidados para ministrar as aulas”, conta.

Segundo relatos da mesma representante, alguns professores mais comprometidos da capital costumam ir para o município, em caráter temporário.

Em março deste ano, estudantes da primeira turma do curso de Medicina do ISB, iniciada em 2016, paralisaram as aulas em protesto contra a falta de professores. Na época, dez alunos/as integravam a primeira turma, 26 a segunda e 48 novos/as discentes eram aguardados/as no segundo semestre deste ano. Em contrapartida, havia à disposição apenas três docentes.

Autorizado em setembro de 2017, pela Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior do MEC, via Portaria 962, o curso no município contratou 34 professores de carreira para compor seu quadro funcional, em novembro de 2015.

Impactos

Além de evidenciar o descaso com a educação pública e precarizar a mão de obra obtida sem remuneração, a quantidade expressiva de voluntários docentes traz impactos negativos para a qualidade do ensino e até para o funcionamento da instituição.

Durante a reunião da CEG, no dia 18 de julho, uma denúncia trazida por um professor representante do ICET, de Itacoatiara, dando conta de que um docente reprovado, em seleção para professor substituto, foi contratado como voluntário e aprovou todos os discentes para “resolver o problema de retenção na disciplina que ministrou” gerou, segundo Ana Cristina, preocupação aos presentes quanto à qualidade do ensino ofertado.

A preocupação, de acordo com a 1ª secretária da ADUA, estende-se também ao fato da Resolução nº 015/2018 ter retirado da CEG a atribuição de analisar e deliberar as solicitações de contratação de docente voluntário. “A retirada da CEG do processo trata a contratação de professores voluntários como um expediente meramente administrativo, sem consequências pedagógicas aos cursos, desrespeitando as competências atribuídas à Câmara previstas na regulamentação do Estatuto da Ufam”, destaca ela. O Consad delegou a atribuição à Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas (Progesp).

Segundo Ana Cristina, em reunião da CEG, realizada no dia 14 de agosto de 2018, o colegiado solicitou providências ao Presidente da Câmara, professor David Neto, entre elas o encaminhamento de solicitação de pauta sobre a questão no Conselho Universitário (Consuni), na perspectiva de reverter a decisão do Consad.

Fonte: ADUA


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