Data: 21/09/2018
O Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (Inpi), ligado ao Ministério da Indústria e Comércio do governo Temer, concedeu à farmacêutica norte-americana Gilead a patente sobre o Sofosbuvir, remédio capaz de curar a hepatite C em 95% dos casos.
Com a decisão, anunciada na terça-feira (18), a empresa passa ser a única em todo território nacional que pode vender o medicamento. A Fundação Oswaldo Cruz, através do instituto Farmanguinhos, que tinha o registro da Anvisa para fabricar o genérico do medicamento no país, não poderá mais fazê-lo.
A medida é totalmente prejudicial aos pacientes no país. O remédio vem revolucionando o tratamento da doença, contribuindo para a cura de muitos pacientes, ao evitar o transplante de fígado, cirrose e câncer hepático.
Contudo, o medicamente tem preço proibitivo quando produzido por empresas privadas. De acordo com nota publicada pelo próprio Ministério da Saúde, em agosto de 2018, o custo do tratamento de 84 dias com o Sofosbuvir praticado pela indústria privada girava em torno de 7 mil dólares por paciente. Com a produção do genérico pela Farmanguinhos/Fiocruz, o custo do medicamento seria de um quarto desse valor.
Em reunião no início de julho no Ministério da Saúde, a Gilead ofereceu o sofosbuvir a US$ 34,32 (R$ 140,40) por comprimido, e a Farmanguinhos ofertou o genérico a US$ 8,50 (R$ 34,80). Estima-se que o governo economizaria com o genérico em torno de R$ 1 bilhão a cada 50 mil tratamentos.
Segundo informações divulgadas pela imprensa, a Gilead já faturou US$ 55 bilhões desde 2015 com seus remédios contra hepatite C. Quando foi lançado, um comprimido do sofosbuvir custava US$ 84 mil. O custo de produção fica abaixo de US$ 10.
Repercussão
A medida causou repercussão negativa e muitas críticas por parte de várias organizações, médicos e especialistas. Não é por menos. Afinal, a concessão da patente favorece abertamente uma multinacional dos EUA em detrimento dos interesses de milhares de pacientes que necessitam do remédio e do próprio governo brasileiro.
A decisão do Inpi vai na contramão de países como o Egito, Argentina e China, que não concederam a patente, e como o Chile, que estuda quebrar a patente para garantir à população o tratamento.
Em nota, a Fiocruz afirmou que recebeu com surpresa a notícia do deferimento do pedido de patente e que não houve exposição das justificativas técnicas. A fundação avalia que o pedido não apresenta os requisitos de novidade e atividade inventiva. Também não teria sido apresentada a descrição de invenção de modo que um técnico consiga reproduzir o medicamento reivindicado. Tal descrição é um dos critérios que devem ser observados para a concessão de patente.
A organização humanitária Médicos Sem Fronteiras também emitiu nota lamentando a decisão do Inpi e avaliou que ela limita o acesso à cura da hepatite C. Segundo a entidade, há quase 700 mil pessoas com a doença no Brasil e havia argumentos sólidos, baseados no interesse público, para negar a concessão da patente. “Atualmente, a Gilead cobra cerca de US$ 4,2 mil por tratamento contra a doença. Em contraste, nos projetos em 13 países onde trata a doença, a Médicos Sem Fronteiras adquire medicamentos genéricos da mesma qualidade dos remédios de marca ao preço de US$ 120”, registra o texto.
A Rede Brasileira Pela Integração dos Povos, através do seu Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual, anunciou que vai entrar com recursos contra a patente. A rede é composta por diversas organizações, entre elas a Médicos Sem Fronteiras e a Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (Abia).
“Esse é um medicamento que salva vidas e não deve haver um monopólio sobre ele. Não podemos ficar nas mãos da ganância de uma transnacional que irá fixar altos preços. O Inpi fez uma escolha e colocou em risco um projeto de eliminação da hepatite C no Brasil”, disse Pedro Villardi, coordenador do grupo de trabalho.
A Comissão de Assuntos Econômicos convocou o ministro da Indústria Marcos Jorge para dar explicações sobre a decisão. Organizações também falam em entrar com medidas para quebrar a patente do medicamento.
Com informações: Agência Brasil
Fonte: CSP-Conlutas
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