Data: 25/07/2018
Nesse mês de julho, considerado “Julho das Pretas” é celebrado no calendário de negritude o 25 de Julho como “Dia da Mulher Negra Latino, Americano e Caribenho”. No Brasil, desde 2014, esta data lembra a Mulher Negra e a líder Quilombola Tereza de Quariterê. No dia 31 de julho é referenciada a Mulher Africana. Reconhecer a importância dessas datas é fundamental para dar visibilidade a história de luta e resistência da mulher negra no Brasil e no mundo.
Crise capitalista e a Situação da Mulher Negra
Dados da Associação Rede de Mulheres Afro-Latinas, Afro-Caribenhas e da Diáspora (Mujeres Afro) apontam que cerca de 200 milhões de pessoas autodeclaradas como afrodescendentes vivem na América Latina e no Caribe, são cerca de 30% da população que tem em comum o desemprego, subemprego, discriminação e violência. Esta situação é consequência do capitalismo que combina racismo e machismo para explorar, excluir e estereotipar.
Nesta fase decadente do capitalismo em que ocorre a redução de salários, de direitos, aumento do desemprego, violência no mundo, sobretudo entre as mulheres negras, tem ocorrido também o aumento de fluxo migratório por conta da pobreza, miséria, perseguição política, e guerras. A ONU (Organização das Nações Unidas) estima que só em 2015 a população global de migrantes chegou a 3,3%. Desse percentual 48% são mulheres.
O Brasil é um dos países da América do Sul que mais tem recebido imigrantes não brancos, oriundos da Venezuela, Haiti, Senegal, Síria, Angola, Colômbia e Congo. Contudo, a imigração é vista como algo ilegal, um exemplo é a política repugnante de tolerância zero de Trump nos EUA que dentre outros aspectos separa os filhos dos pais.
Em todo o mundo há o crescimento de uma política para inibir a entrada de imigrantes: construção de muros, fiscalização de fronteiras, perseguição em alto mar, deportação, burocracia para tirar documentos. Os imigrantes são vistos como clandestinos, enfrentam em muitos lugares o tráfico laboral e sexual, tem baixa qualidade de vida, além de integrar o quadro de mão de obra barata e sem direitos.
Nesta ordem, evidencia-se que há um processo de exploração e opressão que tem se ampliado. Não é à toa que há cortes nas políticas sociais de diversos países, aprovação de reformas trabalhistas e previdenciárias, aumento do grau de exploração, jornada de trabalho e diminuição de salários.
Os poderosos e todos os seus agentes, sejam governos ou suas instituições como Banco Mundial, ONU e burguesias locais, são inimigos da classe trabalhadora e atuam contra essa parcela da sociedade.
A ONU, por exemplo, estabelece parcerias com várias empresas sob a alegação de promover a igualdade de gênero e raça. A Coca-Cola e as lojas Renner estão nessa parceria. São empresas conhecidas por práticas de racismo e violação de direitos humanos.
Vale lembrar que foi a ONU, sob a liderança do governo petista, que invadiu o Haiti em 2004, sendo, portanto, responsável pelos casos de abuso sexual cometido pelos soldados da MINUSTAH [Tropas enviadas ao Haiti] contra mais de 2 mil mulheres negras.
A forma como a ONU trata a questão da opressão da mulher negra serve apenas para desviar a atenção dos problemas reais provocados pelo capitalismo. Nesta lógica, basta dar visibilidade às personalidades negras para que racismo e o machismo sejam superados. Não se trata apenas de identidade, do saber e do poder individual, nem tão pouco do “respeito”, transferindo esse tema para o campo da moral burguesa e das relações interpessoais. É preciso aprofundar os problemas que atingem o povo negro como desemprego, feminicídio, genocídio, encarceramento e racismo.
Reflexões
Em unidade, os governos e empresários, que carregam uma herança da oligarquia escravocrata e subordinada ao mercado mundial, demonstram a sua natureza conservadora, destilando todo o seu racismo e ódio ao povo negro, ao mesmo tempo em que propaga o mito da democracia racial. Esta é uma das formas que tem utilizado para mantem seus privilégios às custas da superexploração dos trabalhadores.
Jair Bolsonaro (PSL), um legítimo representante dessa burguesia, é um bom exemplo dessa política. Esse senhor defende o retorno da ditadura militar, fala em privatizar as empresas públicas se for eleito e votou a favor da reforma trabalhista. Tem repetidas vezes reproduzido discursos racista, machista e Lgbfóbico. Pronunciou que quilombolas e indígenas são fedorentos, mal-educados, atrapalham a economia. Disse também que visitou um quilombo e que constatou que o “afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas” e não fazem nada, não serve nem para procriar. Chamou os haitianos, senegaleses, bolivianos e sírios, de “escória” do mundo. É um racista confesso, defende a precarização do trabalho, destila veneno e ódio racial ao nosso maior símbolo de resistência que são os quilombos, está a serviço da burguesia e do imperialismo.
Foi Temer, senhor da Casa Grande que decretou guerra aos negros e pobres no Rio de Janeiro. Não vamos esquecer que o PMDB de Temer, Cabral e Pezão foi responsável por quebrar o Rio de Janeiro, enriqueceram se apropriando do dinheiro público e agora culpabilizam os trabalhadores tentando jogar para as costas a intervenção militar que gera mais violência, encarceramento e mortes nesse Estado. Com Temer aumentou o desemprego. Ele aprovou a reforma racista que desregulamenta as leis trabalhistas, instituindo o trabalho semi-escravo.
Morte de mulheres negras
Os dados sobre feminicídio, encarceramento e desemprego são alarmantes e o que é mais grave, cresceram absurdamente durante os últimos 16 anos, segundo o último Mapa da Violência, ou seja nesse período passando por governos do PSDB, PT/PMDB e MDB cresceu o feminicídio entre as mulheres negras, diminuindo entre as não negras em quase 10%, o que nos leva a concluir que existe seletividade racial da violência e no seu combate.
A própria ONU e a Cepal (Comissão para a América Latina e Caribe) destacam que entre os 25 países com maiores índices de feminicídio no mundo, 15 estão na América Latina, sendo o Brasil o campeão em 2013, seguido do México, Honduras e Argentina. Isso corresponde aos dados do Mapa da Violência de 2015 que apontou que entre 1980 e 2013, 106.093 mulheres foram mortas no Brasil. Foi por isso que o feminicídio foi tipificado como crime no Código Penal em 2015, uma vitória, porém restrita ao âmbito da violência doméstica e familiar, enquanto o Estado é isento de qualquer responsabilidade. O que dizer das mulheres negras assassinadas pela polícia? Continuará na impunidade?
A execução de Marielle Franco durante a intervenção militar, o caso de Claudia Silva Ferreira, morta e arrastada pelas ruas do RJ por policiais da UPP (Unidade de Policia Pacificadora), de Marise Nóbrega, morta por PM, após ser agredida na cabeça por uma coronhada de fuzil, são alguns casos com requinte de crueldade cometido pela polícia. O Estado que deveria garantir o direito básico à vida das mulheres negras, mata e assassina. Por outro lado, não garante o básico que é o acesso a saúde, educação, moradia digna, trabalho e renda.
Mulheres negras nos subempregos
As estatísticas têm demonstrado que o desemprego e subemprego têm aumentado e afetam de forma mais contundente as mulheres negras, pois são as primeiras a serem demitidas e superexploradas em tempos de crise. Entre o quarto trimestre de 2014 e igual período de 2017, a taxa de desocupação entre elas passou de 9,2% para 15,9%, um aumento de 6,7 pontos percentuais.
Encarceramento
Para a maioria das mulheres as prisões tem sido a política adotada, não por acaso o Brasil possui a terceira maior população carcerária do mundo. São mais de 700 mil presos, sendo que 40% destes são provisórios. Para as mulheres negras, a cota de encarceramento cresceu 698% em 16 anos segundo o Depen (Departamento Penitenciário Nacional). Tal crescimento se deve principalmente à Lei Antidrogas implementada no governo do PT, pois 62% dos presos são acusados de crime de tráfico de drogas. A Lei Antidroga (11.343/2006), além de definir quem é traficante, condena pobres e negros. A maioria que está sendo condenada é réu primaria.
Ao contrário disso, os sucessivos governos têm tirado mais de 40% do orçamento público para pagamento de banqueiros, desviado outro montante para corrupção, privatizado empresas estatais, desregulamentado leis trabalhistas deixando os trabalhadores a cargo dos patrões. Almejam destruir a previdência, liquidar com o SUS, deixando a população sem acesso a serviços básicos de saúde, bem como dificultar e diminuir o valor da aposentadoria quando 39,8% de famílias brasileiras, chefiadas por mulheres negras tem na aposentadoria a única renda.
Ousadia, rebeldia e organização das pretas
Nesse Julho das Pretas referenciamos a trajetória de luta e resistência de Tereza de Quariterê que durante quase duas décadas, uniu quilombolas e indígenas e mostrou que não é possível nenhuma unidade com a classe dominante. É um exemplo a ser seguido. Foi uma guerreira lutou contra o sistema opressor, não se rendeu à Casa Grande, nem aos Capitães do Mato.
Destacamos que no Brasil vem ocorrendo uma forte polarização social. As mulheres negras tem sido vanguarda em muitas lutas. Há provas dessa disposição para a luta contra a superexploração, a violência e mortes. Entre elas, as recentes greves na educação ocorridas em São Paulo e Minas Gerais, onde as mulheres negras são maioria na carreira; a retomada de território no campo e por moradia nos centros urbanos; as ocupações de escolas para garantir o ensino público, gratuito e de qualidade; a forte indignação e manifestação nas ruas que tomou conta do país, após a execução de Marielle Franco e o apoio popular à greve dos caminhoneiros.
Nesse julho das Pretas exigimos:
A punição dos torturadores do regime militar, a apuração rigorosa do assassinato de Marielle, Anderson e dos jovens de Maricá, e o fim da intervenção militar no Rio de Janeiro.
Exigimos políticas por Reparações para as Mulheres Negras pelo maior crime praticado contra a humanidade. Reforma agrária, titulações das terras de quilombolas, implementação da lei 10.636/03, ampliação da política de ações afirmativas, cotas nas universidades e serviços públicos, geração de empregos, desmilitarização da polícia, na suspensão do pagamento da dívida interna e externa, entre outras.
Fonte: CSP-Conlutas |