
Foi publicada no Diário Oficial da União, na segunda-feira (3 de fevereiro), a rescisão do termo de cooperação firmado entre a Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e a empresa Potássio do Brasil para apoio ao Projeto Autazes Sustentável. Esse cancelamento representa um marco na luta do movimento indígena. A ADUA e outras entidades como o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e a Frente Amazônica de Mobilização em Defesa dos Direitos Indígenas (FAMDDI) se posicionam veementemente contrários a exploração mineral no território do povo Mura por meio do Programa Autazes Sustentável (PAS), desde 2023, quando houve a assinatura do acordo entre a Ufam e a Potássio do Brasil.
Em junho de 2024, o Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM) recomendou a anulação do termo de cooperação devido a irregularidades no projeto. Entre as violações apontadas pelo órgão, destacam-se a sobreposição da área de exploração a terras indígenas em processo de demarcação, impactos socioambientais e fracionamento do licenciamento ambiental.
O protocolo assinado entre a Potássio do Brasil e a Ufam previa a realização de ações para a implantação e gestão do PAS, incluindo consultoria para o desenvolvimento do Plano Básico Ambiental do projeto e a colaboração de docentes da Ufam. No entanto, o MPF/AM alertou que, no próprio acordo foram incluídos na lista de participantes dos estudos ambientais nomes de pesquisadoras(es) que não foram consultadas(os) pela Ufam.
A professora da Ufam, Danielle Gonzaga, membro do movimento de luta indígena e integrante do Fórum de Educação Escolar e Saúde Indígena do Amazonas (FOREEIA), do Movimento dos Estudantes Indígenas do Amazonas (MEIAM) e da Juventude Munduruku do Amazonas, afirmou que recebeu com surpresa a notícia do cancelamento do acordo. Segundo ela, já fazia sete meses que o MPF havia alertado a Ufam e outros parceiros do projeto sobre a existência de uma série de irregularidades, mas a universidade demonstrava resistência em romper o acordo.
“A Ufam, enquanto produtora de conhecimento e instância de poder, não precisaria esperar um indicativo do Ministério Público Federal para reconhecer a irregularidade do acordo. Sobretudo porque é de conhecimento jurídico e institucional a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que regulamenta a consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas, e essa foi uma das primeiras irregularidades identificadas na tentativa de extração de potássio no território do povo Mura”, destacou Gonzaga.
A docente acrescentou que essa rescisão ocorre justamente em um período de eleição para a Reitoria da Ufam, o que, em sua avaliação, não pode ser dissociado do contexto político no qual o anúncio foi feito.
Ainda assim, a professora considera a decisão um avanço, mesmo que tardio. “A universidade precisa valorizar o diálogo com os povos indígenas. Como espaço de produção de conhecimento, deve estar comprometida com a construção de um pensamento que integre ensino, pesquisa e extensão, levando em consideração a realidade dos povos indígenas e seus direitos”, ressaltou.
O 1º vice-presidente da ADUA, professor Raimundo Nonato, afirmou que o encerramento do termo de cooperação foi uma medida acertada. “Ao acatar a recomendação do Ministério Público Federal e encerrar essa parceria, a Ufam reafirma sua liberdade institucional, podendo se posicionar de forma independente das pressões econômicas e priorizar os direitos indígenas”.
Na avaliação do docente, a decisão reafirma o compromisso da universidade com a defesa dos direitos humanos, em especial dos direitos indígenas. “Sabemos e defendemos, enquanto ADUA, que esses direitos não podem ser submetidos a interesses econômicos. O projeto da Potássio do Brasil, pelo peso econômico e pela dimensão que tem, de alguma forma feria esses direitos. Além disso, ignorou convenções internacionais ao não garantir consultas esclarecidas e metodologicamente adequadas às comunidades afetadas”, concluiu Nonato.
Fonte: ADUA
Foto: Sue Anne Cursino/Ascom ADUA
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