Av. Rodrigo Otávio Jordão Ramos, 3.000, Campus Universitário da UFAM, Setor Sul, bairro Coroado - CEP 69.077-000 - Manaus/Amazonas

Whatsapp +55 92  98138-2677
+55 92 4104-0031


Viva Melhor


   


  03/12/2024


Educação e arte antirracistas são temas de debate na ADUA



Roda de conversa reuniu convidadas(os) de diferentes áreas de atuação

 

Daisy Melo

 

O papel das instituições de ensino e da arte como meio educativo, formador e de combate ao racismo estrutural foi uma das questões debatidas durante a atividade “Resistência Negra: educação, religião, arte e direitos humanos” ocorrida no dia 19 de novembro, na ADUA, em alusão ao Dia da Consciência Negra (20/11). Realizado pelo Fórum Unidade na Luta do Amazonas, do qual a Seção Sindical faz parte, o evento reuniu público diverso no auditório da ADUA “Professor Osvaldo Coelho”.

 

A atividade foi aberta com a saudação do presidente da entidade, Jacob Paiva. “A luta contra o racismo é de todos e todas e não pode se limitar ao campo teórico. Os sindicatos e movimentos precisam realizar as ações internas, ter companheiros negros e companheiras negras na direção, criar condições e estruturas, mostrar na prática o que é ser antirracista”, disse. Em seguida foi exibido o documentário “História da Resistência Negra no Brasil”, com direção de José Carlos Asbeg e produção do Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (Ceap).

 

Após a exibição do filme, a mesa foi composta para a roda de conversa que teve a mediação de Luiz Cláudio Corrêa, do Sitraam. A advogada, jornalista e integrante do Movimento de Mulheres Negras e de Axé, Luciana Santos, destacou a necessidade de maior aproximação entre a universidade e a população. “É preciso ultrapassar esses muros, fazer as pesquisas chegarem até eles. Num trabalho recente de videocast convidei pesquisadores da Ufam e da UEA na tentativa de levar esses temas para a massa. Nos últimos anos nós perdemos essa intimidade com a população, estamos fechados numa bolha acadêmica”.

 

Outro ponto em que é preciso avançar, na opinião da advogada, é a ampliação de estudos sobre temáticas negras. “Do povo negro não tem muita pesquisa, além disso não são todas que são aceitas. Minha pesquisa no Direito é voltada para o campo da negritude e achei que não aceitariam, mas temos aliados e eles acolheram”. Negro Lamar do movimento hip-hop referendou a importância do aumento de estudos sobre negritude. “Para que uma educação política antirracista avance é preciso de mais pessoas escrevendo sobre preto. Ser docente antirracista não é só escrever sobre preto em [Ciências] Humanas, mas criar uma ação de resistência em outras áreas”. 

 

A valorização da banca de heteroidentificação da Ufam foi outro tema sensível debatido. Os atrasos nos pagamentos das(os) componentes foi uma das questões levantadas por Negro Lamar. “Nós passamos dois anos trabalhando de graça, recebemos somente depois. ‘Ah, porque não temos dinheiro’. Para questão de preto nunca tem dinheiro, por isso quem aqui for do Consuni: encampe uma ação para fortalecer a banca de heteroidentificação, pressione a universidade a valorizar esse processo. Nós, que somos da Comissão, entendemos que isso é sim um tipo de racismo estrutural”, disse. Ele destacou ainda a questão da escolha do meio digital em detrimento do presencial. “A heteroidentificação presencial é o ideal para evitar a questão da edição de vídeo e foto. Na universidade é feita em sua maior parte de modo digital, porque não tem estrutura. E isso dificulta ainda mais para quem é do interior do Estado”.

 

Docentes, estudantes e técnicos marcaram presença na atividade

 

 

Experiências e autoidentificação

 

Em relação à universidade, Luciana destaca que também podem ser identificados progressos. “Quando entrei na faculdade era uma época antes das cotas, uma universidade branca. Quando retorno 16 anos depois, percebo uma universidade mais diversa, com coletivos negros, considero isso um avanço”. Para Lamartine, a experiência nas instituições de ensino foi marcada por racismo que passou a confrontar após o conhecimento adquirido com o movimento hip-hop e que o levou a ler sobre, por exemplo, socialismo, africanismo, Martin Luther King e Zumbi dos Palmares. “Antes a gente aceitava ser chamado de moreno, de saci, aceitava as ‘brincadeiras’ na escola, na universidade, sem se zangar, sem se incomodar”. 

 

Foi no ambiente universitário que a autodeclaração como “negra” se tornou uma realidade para a integrante da União de Negros pela Igualdade (Unegro) e estudante de Serviço Social, Yasmin Vieira. “Comecei a entender essas questões a partir da pesquisa. Por isso penso que, antes de falar de cotas, precisamos falar sobre educação racial. Por exemplo, nas comunidades, há pouca informação, as pessoas não sabem como se autodeclarar e algumas têm vergonha de se declarar negro. Precisamos de ferramentas educativas, pequenas ações na base, na rua, nas escolas”.

 

A aplicação de ações do gênero nos espaços universitários também foi destacada por Yasmin, que também integra o Diretório Central dos Estudantes (DCE/Ufam). “Não vejo a implantação de políticas, de programas sobre práticas antirracistas. Temos relatos, por exemplo, de estudantes negros que foram abordados por seguranças, as pessoas entram e vão direto trabalhar, não existe uma campanha, a universidade não é acolhedora”. A discente reforçou que, além de eventos sobre o tema, é preciso criar cada vez mais mecanismos de denúncia e acolhimento dentro da universidade.

 

Em sua experiência de 35 anos na Ufam como discente e docente, o professor do curso de Ciências Sociais da Ufam, Raimundo Nonato da Silva, referendou a necessidade da criação de programas contínuos e não apenas pontuais. “Precisamos ampliar nosso diálogo com os movimentos sociais e populares, e ampliar também a presença deles na universidade, publicizar suas lutas, porque eles também devem fazer parte da universidade”.

 

O papel do hip-hop como instrumento de formação antirracista foi destacado por Negro Lamar. “Nós criamos o Movimento Hip-Hop Organizado Brasileiro, o MHHOB, e fizemos ações em vários estados do país, não só de festival, de show, de música, mas com dias também para debater. Essa resistência do hip-hop aparece também muito forte no  ‘Juventude Negra Viva’, que fez acontecer um primeiro encontro onde foi construído a maior parte dos programas para combater o genocídio da juventude negra (...) então além das batalhas de rimas, do entretenimento, nossa perspectiva é de enfrentamento ao racismo”, explicou.

 

Escola e racismo religioso

 

Sobre a educação nas escolas, Luciana levantou o debate sobre o boicote à Lei 10.639, que determina o ensino de conteúdos sobre a história e a cultura afro-brasileiras nas escolas da educação básica do país. Desde a sua vigência em 2003, a temática é obrigatória nos currículos dos Ensinos Fundamental e Médio. “É uma das faces do nosso racismo estrutural, (...) o que mais chama a atenção é que o que causa temor é a questão da religiosidade negra, eles acham que as crianças vão passar por uma lavagem cerebral e se tornar macumbeiras”.

 

A experiência de vida do integrante da Articulação Amazônica dos Povos e Comunidades Tradicionais de Terreiro de Matriz Africana (Aratrama), Pai de Santo e psicólogo Reviossonnôn Obá Méjì Fatadabenon Alberto Jorge Silva, evidencia o racismo religioso. “Ser macumbeiro e gay não é fácil, e se você tiver limitação física piorou, não é fácil resistir. Eu poderia passar por branco e doutor porque sou psicólogo, mas eu abri mão do meu consultório para me dedicar ao terreiro, para ser pai de santo, o que infelizmente na nossa sociedade é ser um zero à esquerda”.

 

Sobre a temática, Lamar citou como exemplo a dificuldade de liberação das(os) estudantes da rede pública de ensino do Amazonas para participação em atividades como a Caminhada da Consciência Racial. “Pensam que vão desviar os meninos, que uma marcha contra racismo é para que eles conheçam as religiões de matriz africana. Estamos quase para entrar com uma ação no Ministério Público, porque está nas leis, é preciso cumprir”.

 

Sobre o racismo religioso, Reviossonnôn Obá Méjì Fatadabenon Alberto Jorge Silva destacou que posicionamento é fundamental. “Precisamos defender que todos têm que ser considerados sacerdotes: pajé, rabino, padre, Pai de Santo, e que resistir tem que ser sempre nossa marca e determinação, ainda que isso custe muito caro”. A pós-graduanda do PPGCASA/Ufam, Rita Vieira, comentou que identifica a ausência desse debate nas escolas. “Não existe um projeto de educação antirracista. Quando fui atuar em uma escola tentaram me passara óleo ungido, é preciso alcançar esses espaços, isso é uma violência com as próprias crianças, é preciso combater o racismo institucionalizado, inclusive o religioso”, disse.

 

Após a roda de conversa, a ADUA lançou a campanha do ANDES-SN “Sou Docente Antirracista”, lançada também, primeiramente, em setembro deste ano no 67º Conad, em Belo Horizonte (MG). “Políticas afirmativas e políticas de cotas, muitas vezes, são insuficientes, nós precisamos sair do discurso e mostrar na prática o que é ser antirracista. É com esse sentimento que lançamos esta campanha”, afirmou Jacob Paiva. A atividade “Resistência Negra” foi encerrada com a apresentação de hip-hop do MC W e o Axé Cultural com mais música, comes e bebes.

 

Durante o Axé Cultural foram servidos caruru e acarajé para as(os) presentes

 

Fotos: Cila Maria Reis e Ascom/Sue Anne Cursino



Galeria de Fotos
 

 

COMENTÁRIO:


NOME:


E-MAIL:

 






energia solar manaus

Manaus/Amazonas
Av. Rodrigo Otávio Jordão Ramos, 3.000, Campus Universitário da UFAM, Setor Sul, bairro Coroado - CEP 69.077-000 - Manaus/Amazonas

energia verde

CENTRAL DE ATENDIMENTO:
+55 92 4104-0031
+55 92  98138-2677
aduasindicato@gmail.com

ADUA DIGITAL