Consellho do Sindicato Nacional reuniu 310 participantes em Belo Horizonte (MG)
Sue Anne Cursino
Em 1976, o mineiro de Itabira, Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), escreveu sobre a Serra do Curral, que emoldura a cidade de Belo Horizonte: “Esta serra não tem dono. Não mais a natureza a governa. Desfaz-se, com o minério, uma antiga aliança, um rito da cidade”. Décadas depois, o mesmo cenário perdura. Marcada por contradições sociais e ambientais, Belo Horizonte (MG) foi palco de intensos debates durante o 67º Conselho do Sindicato Nacional (Conad) do ANDES-SN, realizado de 26 a 28 de julho de 2024.
O encontro, que reuniu docentes de Universidades, Institutos Federais e Cefets, foi organizado pelo Sindicato de Docentes do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (Sindcefet/MG - Seção Sindical do ANDES-SN), no campus Nova Suíça. As atividades foram norteadas pelo tema central “Fortalecer o ANDES-SN nas lutas por mais verbas para a educação, salários e em defesa da natureza”.
A ADUA foi representada pelo presidente da Seção Sindical, Jacob Paiva, como delegado; e como observadoras as docentes Ana Cláudia Nogueira, Guilhermina Melo Terra, Laura Miranda e Gilse Rodrigues; e como observadores os docentes José Alcimar Oliveira e Aldair Andrade.
Temas como a defesa da educação pública, resistência ao Novo Ensino Médio (NEM) e o combate à militarização das escolas estiveram nos discursos das e dos participantes da mesa de abertura do encontro que contou com representantes da diretoria nacional do ANDES-SN, do Sindcefet/MG SSind, do Cefet, da UNE, da Federação Nacional dos Estudantes em Ensino Técnico (Fenet), do Sinasefe, da Fasubra, do Movimento Sem Terra (MST), do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), do Grêmio Livre Estudantil, do Sind-UTE/MG e da Ascefet MG.
A representante do MST, Priscila Araújo, enfatizou a necessidade de unidade da classe trabalhadora em defesa da educação para todos e todas, ressaltando que, mais do que o sentimento de esperança, é preciso de ação para garantir os direitos para uma sociedade mais justa.
As tragédias de Mariana e Brumadinho foram citadas pela representante do MAM, Maria Júlia Gomes Andrade, para dizer que a mineração predatória não é uma novidade, mas que seus efeitos vieram à tona com essas duas tragédias, que apontam para necessidade de que seja pensado, de forma coletiva, um outro modelo de uso de recursos minerais para o Brasil.
A crítica ao projeto do capital na sociedade foi enfatizada no discurso do presidente do ANDES-SN, Gustavo Seferian, que também destacou os ganhos políticos da classe trabalhadora com o uso da greve como instrumento de luta, combatendo as práticas antissindicais e a criminalização das e dos docentes grevistas.
Ao todo, o 67º Conad registrou a presença de 310 participantes, sendo 80 seções sindicais, 79 delegadas e delegados, 189 observadores e observadoras, 11 convidadas e convidados e 31 diretores e diretoras do ANDES-SN, que durante os três dias se reuniram para atualizar o plano de lutas da categoria docente, discutir a conjuntura atual e deliberar sobre questões cruciais para o movimento sindical.
Revista U&S é instrumento fundamental de luta sindical
Lançamento do nº 74 da Revista Universidade e Sociedade
Seguindo o mote da campanha “Sou Docente Antirracista”, o ANDES-SN lançou, durante a abertura do 67º Conad, o número 74 da revista Universidade e Sociedade (U&S) com o tema “A urgência da luta antirracista nas Universidades, Institutos Federais e Cefets”.
Como um importante instrumento de luta sindical, a publicação semestral reúne artigos, entrevistas, sessões de debate, artes e reportagem.
Dentre as produções está a reportagem fotográfica “Nossos passos vêm de longe e irão mais longe ainda”, encontrada na página 204, onde é registrada a participação da ADUA na luta antirracista. “Uma educação-Quilombo se faz e se fortalece no encontro com as diferenças. Assim como se constrói a ADUA, com base em ações que se dão a partir do encontro solidário entre pessoas negras e indígenas. Isso porque o racismo é resultado de uma política colonial que menospreza e violenta tudo aquilo que é diferente da branquitude, atingindo tanto a população negra quanto os povos originários”, afirma trecho da publicação.
Na sua contracapa, a edição também reafirma a defesa pela justiça reprodutiva com a campanha “Criança não é mãe” e anuncia o III Congresso Mundial contra o neoliberalismo na Educação, que será realizado de 14 a 17 de novembro de 2024, no Rio de Janeiro (RJ). Leia aqui a edição 74 da Universidade e Sociedade.
Oito Grupos Mistos debateram os textos de resoluções antes das plenárias
Plano de lutas dos Setores
A atualização do plano de lutas dos Setores das Instituições Estaduais, Municipais e Distrital de Ensino Superior (Iees/Imes/Ides) e das Federais, ocorrida no segundo dia do encontro (28 de julho), foi iniciada com um debate de conjuntura com foco na avaliação das greves nas estaduais e nas Ifes, que reivindicaram melhores salários, carreiras, condições de trabalho, concursos públicos e recomposição orçamentária.
Entre as muitas falas, foi afirmado que a greve das e dos docentes federais resultou em um balanço positivo. No entanto, um dos maiores obstáculos enfrentados durante o movimento foi a atuação desleal de grupos, como a Federação de Sindicatos de Professores e Professoras de Instituições Federais de Ensino Superior e de Ensino Básico Técnico e Tecnológico (Proifes), que tentam, de todo modo, atacar a unidade da luta e destruir o ANDES-SN. Essa situação evidenciou a necessidade urgente de criação de um grupo de trabalho dedicado aos enfrentamentos dessas oposições, considerando, principalmente, que as negociações com o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) e o Ministério da Educação (MEC) ainda não foram encerradas, o que exige a continuidade da pressão para garantir o acordo de greve e o orçamento das universidades federais. Uma certa homogeneidade de posicionamento sobre esse tema resultou na criação do Grupo de Trabalho de Organização Sindical das Oposições (GTO), com o objetivo de organizar o debate e a mobilização docente nas instituições de ensino superior nas quais a organização sindical local tenha rompido com o ANDES-SN ou tenha se constituído inicialmente sem vínculo com o Sindicato Nacional. A sistematização desse GT será apresentada no 43º Congresso do ANDES-SN, em 2025.
Na atualização do plano de luta do setor das Ifes está a realização de um painel sobre orçamento e financiamento da educação pública federal, em articulação com o GT Verbas, para lutar pela recomposição e ampliação de recursos na elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e da Lei Orçamentária Anual (LOA) para 2025, no segundo semestre de 2024.
Também foi encaminhado que o ANDES-SN, em parceria com o Sinasefe, atue junto ao MEC e ao MGI para exigir a revogação imediata da Portaria MEC 983/2020, que estabelece diretrizes gerais para o processo de avaliação de desempenho para fins de progressão e de promoção, e a alteração do Decreto 1.590/1995, modificando “magistério superior” para “magistério federal”.
Entre as deliberações do Setor das Iees, Imes e Ides estiveram a aprovação do incentivo às seções sindicais e fóruns para realizarem análises e publicações baseadas em dados da pesquisa sobre o financiamento das universidades. A defesa de concursos públicos e a garantia da dedicação exclusiva também foram incorporadas à Campanha “Universidades Estaduais: quem conhece, defende”.
Docentes representaram a ADUA em encontro sindical
Plano de Lutas Gerais
Entre as resoluções de políticas de organização e atuação do movimento docente, aprovadas no dia 28 de julho, estão as do Grupo de Política de Formação Sindical (GTPFS), sobre: a rearticulação das relações com o Fonasefe e a Coordenação Nacional das Entidades de Servidores Federais (CNESF), durante a organização do II Encontro Nacional de Trabalhadoras e Trabalhadores do Setor Público; a realização de campanha unificada contra a reforma administrativa, ainda no segundo semestre de 2024 e uma campanha de enfrentamento ao processo de criminalização das lutas sindicais.
No âmbito do Grupo de Política Educacional (GTPE), foi aprovado que o ANDES-SN produza avaliações sobre o Fórum Nacional de Educação para orientar decisões no 43º Congresso do Sindicato, a ser realizado em 2025, em Vitória (ES). Além disso, o sindicato acompanhará a tramitação do Plano Nacional de Educação (PNE), fortalecendo campanhas pela revogação do NEM, da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e da BNC-Formação, mantendo oposição à influência do setor empresarial na educação e à militarização das escolas.
No Grupo de Trabalho de Políticas de Classe, Étnico-racial, Gênero, Diversidade Sexual (GTPCEGDS) foi decidido construir e participar de agendas e atividades para barrar o PL 1904/24 - que ataca os direitos sexuais e reprodutivos; e fortalecer ações do Dia Internacional de Luta pela Legalização do Aborto (28 de setembro) e do Dia Nacional da Visibilidade Lésbica (29 de agosto).
Sobre o GT de Seguridade Social e Aposentadoria (GTSSA) foi mantida a defesa da manutenção do valor mínimo dos benefícios previdenciários e do Benefício de Prestação Continuada (BPC) destinado às pessoas idosas e pessoas com deficiência (art. 203 da Constituição Federal) igual ao valor do salário-mínimo. No GT Verbas, foi aprovada a realização de um estudo sobre o fundo público federal no Brasil, abordando gastos tributários da União, as isenções de impostos, desoneração fiscal, dívida pública federal e as emendas parlamentares.
A realização de debates sobre os “Direitos da Natureza” e a produção de materiais audiovisuais sobre a história e a luta docente, com foco nas greves e nos 45 anos de existência do sindicato também foram aprovadas. Um avanço na política de comunicação sindical foi a conclusão da atualização do Plano de Comunicação do ANDES-SN.
O GT de Multicampia e Fronteira teve destaque neste Conselho por ser a sua primeira participação. Tanto nos grupos mistos, quanto na plenária houve um forte debate sobre os temas do GT, abordando a defesa de uma carreira única e uma linha única no contracheque como crítica as e aos que defendem o pagamento adicional para quem atua nas regiões de fronteira do país.
Na avaliação da docente Ana Claudia Nogueira, é preciso aprofundamento do debate. “A fixação de docentes no interior do Brasil não depende somente de universidades ou de campi. Elas dependem das condições de vida que essas localidades oferecem”, ponderou.
A docente Marcia Umpierre (Aprofurg) destacou que algumas instituições têm cursos binacionais ou que envolvem até três países. “A gente precisa entender que é uma situação específica, discutir a partir das leis e dos projetos já existentes e olhar especificamente para os colegas que estão nessa situação”.
Após o debate, foram aprovadas a realização do II Seminário Multicampia e Fronteira em 2025; a elaboração de um InformANDES especial que trate do tema e um levantamento sobre as Ifes na base do ANDES-SN que são multicampi e/ou estão em regiões de fronteira.
O apoio à Palestina também está entre as deliberações, destacando-se a cobrança para que o governo brasileiro, nas diferentes esferas, rompa relações diplomáticas, comerciais, militares e acadêmicas com o governo de Israel.
Docentes realizam ato para denunciar o genocídio contra o povo palestino
Questões organizativas e financeiras
No dia 28 (último dia do 67º Conad) foram deliberados dois pontos que cumprem importantes funções desse encontro docente: a aclamação de Manaus como a sede do próximo Conad e a aprovação, por unanimidade, das contas do ANDES-SN referentes ao exercício de 2023, à previsão orçamentária de 2025 e à apresentação de contas do 42º Congresso.
O encerramento do 67º Conad foi marcado pela aprovação de moções que reafirmam o compromisso do Sindicato Nacional com causas sociais e internacionais. Entre os textos apresentados estão: repúdio à intervenção de Javier Milei na Universidade Nacional das Mães da Praça de Maio (Unma); repúdio aos ataques contra os povos indígenas Ava Guarani; defesa do povo palestino; solidariedade à luta dos povos do Vale do Jequitinhonha contra a mineração do lítio e o pedido de suspensão do convênio entre a Unicamp e o Technion contra a política genocida de Israel.
O presidente do ANDES-SN concluiu o evento com um discurso da importância da união da categoria docente, ressaltando o fortalecimento da entidade. “Nós saímos deste Conad maiores, mais fortes e armados para dar o embate necessário a essa corja burocrática que atenta contra o nosso instrumento de classe fundamental, que todas e todos nós aqui construímos”, exclamou Seferian.
Ao final, Francieli Rebelatto, 2ª secretária do ANDES-SN, leu a Carta de Belo Horizonte, que sintetiza as deliberações do Conselho e demarca um posicionamento político do Sindicato Nacional. O documento é encerrado com versos da poetisa palestina Heba Abu Nada, silenciada sob bombardeio em Gaza.
Como um reforço do compromisso do ANDES-SN com a luta por uma sociedade mais justa, as palavras finais da Carta são: “Palestina Livre do rio ao mar. Pelo fim do genocídio já! Fora Zema e suas políticas neoliberais! Sou docente, sou radical: sou contra a violência racial!”
Docentes comemoram eleição de Manaus, por aclamação, como sede do 68º Conad do ANDES-SN
Amazonizando o ANDES-SN
Localizada no coração da Amazônia, Manaus, após aclamação no 68º Conad do ANDES-SN, será o próximo palco do encontro que reúne docentes de todo o país para discutir e deliberar sobre as principais lutas da categoria. O evento será organizado pela ADUA.
“Vamos amazonizar o Brasil? Vamos amazonizar o ANDES-SN?”, indagou o presidente da Seção Sindical, Jacob Paiva, após apresentação de vídeo sobre a capital amazonense, que abriu a apresentação da candidatura. O docente também destacou a importância de sediar o Conad na Amazônia como forma de fortalecer as lutas ambientais, a demarcação das terras indígenas e a valorização da cultura dos povos e comunidades da Amazônia. “O Conad em Manaus, em 2025, vai oportunizar ao ANDES-SN apropriar-se ainda mais das lutas da região, essenciais para a construção de um Brasil justo, livre e fraterno”.
Manaus já foi sede de dois congressos do ANDES-SN, em 1993 e 2012, e pela primeira vez sediará um Conselho do Sindicato Nacional, segunda instância mais importante de decisão de planejamento político do sindicato nacional, o que representa uma oportunidade para que o movimento docente se engaje ainda mais nas lutas relacionadas às complexas questões que afetam a região amazônica.
A 1ª vice-presidente da Regional Norte I, Ana Lúcia Gomes, comentou que a Amazônia está em destaque. “Realizar um evento da magnitude do Conad do ANDES-SN no Amazonas é uma oportunidade para reverberar essas questões, levantar novos questionamentos e mostrar à sociedade as atividades do sindicato. É importante conhecer a região para discutir essas temáticas e buscar formas de protegê-la”, afirmou a docente, destacando que a Amazônia se torna uma vitrine dos desafios enfrentados pelo Brasil e pelo mundo.
Docentes ecoam “Sou Docente Antirracista”
“Eu sou docente. Sou radical. Eu enfrento a violência racial!”. Essa foi a palavra de ordem durante intervenção do Coletivo de Negras e Negros do ANDES-SN na noite de 27 de julho (sábado). O ato chamou atenção para necessidade de aprovação de resoluções que fortaleçam o antirracismo e possam articular a luta por concursos públicos nas universidades, garantia da implementação da lei de cotas e das políticas de ações afirmativas.
“O fato de assumirmos uma perspectiva revolucionária não nos garante imunidade em relação às fobias e intolerâncias. Tal conduta requer determinação e engajamento. A construção de uma cultura ancorada no antirracismo impõe a desconstrução do racismo”, afirmou Jacyara Paiva, docente que foi politicamente perseguida e que com a luta do ANDES-SN conseguiu impedir sua exoneração.
A intervenção integra as atividades da campanha “Sou Docente Antirracista”, lançada no dia 25 de julho, véspera do Conad, no Armazém do Campo, em Belo Horizonte. A data coincidiu com o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha e o Dia Nacional de Tereza de Benguela.
“A ideia é colocar a nossa categoria em movimento para debater e discutir ações concretas que possam ser levadas às instituições, permitindo que possamos efetivamente combater o racismo que atravessa as nossas instituições. E na centralidade dessa perspectiva a exigência da implementação da lei de cotas”, concluiu Gisvaldo Oliveira, 3º tesoureiro do ANDES-SN e membro da coordenação do GTPCEGDS.
O docente explica ainda que o racismo é um elemento ideológico enraizado na formação social brasileira. “Se o racismo é estrutural, ele atravessa fortemente as nossas instituições. Então é necessário que também as nossas instituições se transformem em quilombos, em palcos de resistência para o enfrentamento ao racismo”, afirmou.
As ações da campanha incluem divulgação de peças publicitárias, materiais informativos em texto e audiovisual, além de atividades políticas realizadas nas seções sindicais. Também estão previstas a produção da segunda edição do documentário “Narrativas Docentes: Negros e Negras do ANDES-SN”; a publicação de livros de intelectuais negros e negras e a atualização da Cartilha de Combate ao Racismo.
Fotos: Eline Luz e Sue Anne Cursino
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