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  05/12/2023


ADUA combate implantação de controle de frequência para docentes da Ufam



Seção Sindical protocolou um ofício na reitoria da Ufam e aguarda resposta da Administração Superior

 

 

Daisy Melo

 

Aumento dos casos de assédio moral, do adoecimento docente e da precarização das condições de trabalho. Esse é o cenário previsto com a implantação do controle eletrônico de presença (SouGov Frequência) na Universidade Federal do Amazonas (Ufam). Como entidade representativa das(os) professoras(es) da instituição de ensino, a ADUA tem buscado suspender a cobrança de registro de ponto de docentes, que é classificada como indevida pelo parecer da Assessoria Jurídica da Seção Sindical.

 

A ADUA é terminantemente contra qualquer sistema de controle institucional das(os) servidoras(es), afirma o presidente da Seção Sindical, professor Jacob Paiva. “A atividade docente deve ser executada tendo como princípio a autonomia didático-pedagógica em consonância com a legislação vigente e os princípios defendidos pelo ANDES-SN. A implantação de um controle eletrônico em que coloca os servidores e as servidoras sob a tutela, vigilância e fiscalização de superiores imediatos adensará o quadro de adoecimento e assédio moral em todos os espaços da Universidade”. 

 

Questionado sobre o assunto, o ANDES-SN apresentou parecer de setembro de 2020 da Assessoria Jurídica Nacional (AJN) do Sindicato, que trata sobre a cobrança do ponto eletrônico para docentes do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico (EBTT) via Nota Técnica 28.499 do Ministério da Economia. Citando o parágrafo 7º do artigo 6º do Decreto 1.590/1995, o jurídico do ANDES-SN frisa, no documento, que “não há dúvida de que o docente do Magistério Superior Federal está enquadrado na hipótese de dispensa do controle de frequência”, afirma o advogado Leandro Madureira Silva.

 

A nota da AJN cita ainda o parecer da Advocacia Geral da União (nº 420/2013) que reconhece como ilegal qualquer ato que vise a imposição de controle de jornada laboral via ponto eletrônico para os membros da carreira do Magistério do EBTT. Neste ponto, considera-se a isonomia em relação às(aos) professoras(es) do Magistério Superior Federal, uma vez que o desempenho da docência de forma geral ultrapassa a sala de aula e o regime comum de trabalho.

 

Em ofício protocolado no dia 14 de novembro deste ano, a ADUA solicitou à reitoria da Ufam que “seja reconhecida a inviabilidade de cobrança de registro de ponto no SouGov Frequência em relação às(aos) professoras(es) de Magistério Superior que ocupem Cargo de Direção (CD-4) ou recebam Função Gratificada (FG-1), uma vez que tais condições não afastam a natureza diversa das atividades exercidas pelos docentes”.

 

Para a Seção Sindical, há um equívoco de intepretação ao defender que as(os) docentes que exerçam funções administrativas devam ser submetidas(os) a esse controle. Dessa forma, a Seção Sindical buscou, inicialmente, o diálogo com a reitoria para que o processo seja revisto. Até o fechamento desta matéria, a Administração Superior não havia se manifestado. “Em última instância, a ADUA recorrerá ao poder judiciário para que se faça cumprir o preconizado na Constituição Federal de 1988 e na Lei 8112/1990”.

 

Previsão da Ufam é que a primeira rodada de implantação do sistema ocorra em janeiro do próximo ano 

 

De acordo com anúncio feito pela Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas (Progesp), em transmissão on-line realizada no dia 23 de outubro deste ano, todos as(os) servidoras(es) efetivas(os) e ativas(os) em exercício na Ufam, inclusive as(os) ocupantes de CD-4 e FG-1, estariam obrigadas(os) a registrar frequência. Na mesma live, é citado que as(os) professoras(es) do Magistério Superior foram dispensadas(os) do controle de frequência devido ao previsto no Decreto 1.590/1995.

 

O decreto citado dispõe sobre a jornada de trabalho das(es) servidoras(es) da Administração Pública Federal direta, das autarquias e das fundações públicas federais. Em seu artigo 6º, a lei estabelece situações em que o controle de ponto poderá ser exercido e os cargos dispensados da frequência, entre os quais está o de “Professor da Carreira de Magistério Superior do Plano Único de Classificação e Retribuição de Cargos e Empregos”.

 

No documento enviado à reitoria, a ADUA cita este decreto e frisa ainda que, mesmo que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) considere obrigatória a frequência de discentes e docentes, as(os) professoras(es) da carreira de Magistério Superior realizam atividades relacionadas com pesquisa e extensão que não têm horários pré-definidos e podem ocorrer fora do ambiente universitário, como definido pela Lei nº 12.772/2012. Ocorreria, portanto, dificuldades em se registrar a frequência das(os) professoras(es) em relação à realização de tais atividades.

 

A ADUA fundamenta ainda que a Resolução nº 025/2018 – que instituiu as normas relativas ao regime de trabalho e carga horária da(o) docente efetiva(o) na Ufam – dispõe que desempenhar determinadas funções não afasta as atividades próprias das(os) docentes. “Nesse contexto, é evidente que existem servidores investidos no cargo de Professor de Magistério Superior que ocupam CD-4 e FG-1 de forma concomitante com as atividades próprias dos docentes, os quais devem ser dispensados do controle de frequência”, argumenta. A Seção Sindical frisa também que o registro de frequência de docentes que ocupam essas funções não corresponderá à realidade, uma vez que não computará as atividades complementares desempenhadas fora de aula e do campus universitário.

 

No ofício enviado à reitoria da Ufam, a ADUA cita ainda decisões jurídicas anteriores sobre a questão do controle eletrônico de ponto nas universidades federais, como foi, por exemplo, o caso do Acórdão 2.729/2017-Plenário, do Tribunal de Contas da União (TCU), que traz determinações e recomendações limitadas às(aos) servidoras(es) administrativas(os). O documento cita ainda outras decisões favoráveis às(aos) docentes datadas de abril de 2021, da Universidade Federal do Maranhão (UFMA); de outubro de 2022, da Universidade Estadual de Maringá (UEM); e de fevereiro de 2003, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

 

Em parecer de 10 de novembro deste ano, a Assessoria Jurídica da ADUA avaliou como indevida a cobrança de frequência das(os) professoras(es) do Magistério Superior. As advogadas da Seção Sindical frisam que a dispensa não é uma vantagem indevida, mas uma garantia que considera as particularidades das atividades da docência. “O docente, ainda que ocupe cargo de direção ou receba por função gratificada, continua realizando atividades de natureza diversa (ensino, pesquisa e extensão)”.

 

Legislação

 

As legislações apresentadas pela Ufam para a implantação do SouGov Frequência são os Decretos nº 1.590, de 10 de agosto de 1995; e nº 1.867, de 17 de abril de 1996, e as Instruções Normativas (INs) nº 2, de 12 de setembro de 2018; e nº 125 da Secretaria de Gestão e Desempenho de Pessoal do Ministério da Economia (SGP/SEDGG/ME), de 3 de dezembro de 2020, que vigora desde 4 de janeiro de 2021. Essas leis são apresentadas na página oficial da Ufam em um campo específico sobre o SouGov Frequência, disposto no site em área da Progesp.

 

Pelo Cronograma de Atividades para implantação do sistema eletrônico de frequência na Ufam, disponível também no site oficial da Universidade, o processo foi iniciado no dia 1º de setembro de 2022 com a instituição de Grupo de Trabalho para implantação. Atualmente, está em andamento o treinamento da Coordenação de Registro e Movimentação do Departamento de Administração de Pessoal (CRM/Dapes) no Módulo Gestão do SouGov Frequência. A previsão é que ocorra a implantação do sistema em unidades por meio de cinco rodadas: janeiro, março, maio, julho e setembro de 2024. A Ufam alerta que o cronograma pode sofrer alteração, caso ocorram mudanças por parte do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, que gerencia o sistema SouGov Frequência.

 

A IN nº 125/2020 altera a IN nº 2/2018, que estabelece orientação, critérios e procedimentos gerais para órgãos e entidades integrantes do Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal (Sipec), quanto à jornada de trabalho de que trata o artigo 19 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, regulamentado justamente pelos Decretos nº 1.590/1995 e nº 1.867/1996. Estes últimos dispõem sobre controle de frequência, compatibilidade de horários na acumulação remunerada de cargos, empregos e funções, aplicáveis às(aos) Servidoras(es) Públicas(os) Federais (SPFs) de órgãos e entidades integrantes da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional.

 

A IN nº 2/2018 integra o “revogaço” reivindicado pela base sindical na Campanha Salarial 2024 das(os) SPFs, que é um pacote de medidas (decretos, portarias, instruções normativas etc.) implementadas nos governos de Michel Temer e de Jair Bolsonaro e que prejudicam o funcionalismo público brasileiro. Na quinta e última reunião da Mesa Nacional de Negociação Permanente (MNNP), realizada no dia 16 de novembro em Brasília, o governo, segundo a 3ª vice-presidente do Sindicato Nacional, Lucia Lopes, “apresentou alteração de vários itens referentes às INs nº 2”, mas as mudanças não foram especificadas.

 

Além disso, a IN nº 2/2018 já havia sido contemplada no Termo de Acordo 01/2023 entre o governo e entidades do Fonasefe, Fonacate e outras não integrantes destes coletivos, assinado em 24 de março deste ano. O termo foi o mesmo que instituiu o reajuste de 9% sobre a estrutura remuneratória permanente dos cargos efetivos das(os) SPFs, implementado a partir de 1º de maio deste ano, e o acréscimo de R$ 200 do auxílio-alimentação. A terceira cláusula do documento aponta que “a Secretaria de Gestão de Pessoas e de Relações de Trabalho (SEGRT) recepcionará eventuais sugestões de revisão das INs nº 2/2018 e nº 54/2021, promovendo debate com as entidades”.

 

Em seu artigo 36, a IN nº 2/2018 indicava que poderia haver a liberação da(o) servidora(or) pública(o) para participar de atividades sindicais, desde que haja a compensação das horas não trabalhadas. Após a sua alteração com a publicação da IN nº 125/2020, esse artigo foi suprimido.

 

 

Assédio e vigilância

 

No Debate “Avaliação sobre a Campanha Salarial 2024” realizado pela ADUA de forma híbrida, no dia 08 de novembro, o convidado Luiz Eduardo Neves, que é membro da Coordenação do Setor das Ifes e professor da Universidade Federal do Maranhão (Apruma - Seção Sindical do ANDES-SN), afirmou que o Sindicato Nacional tem cobrado do governo federal, nas mesas de negociação, uma posição sobre a cobrança do ponto eletrônico para docentes.

 

Antes da realização do debate, a ADUA já havia se manifestado publicamente contra o controle eletrônico de presença na Ufam. No dia 3 de novembro deste ano, a Seção Sindical publicou uma moção de repúdio em que afirma: “considerando a indissociabilidade de ensino-pesquisa-extensão, a autonomia universitária garantida na Constituição, as relações de trabalho e de saúde mental e o combate ao assédio moral no serviço público, a Assembleia dos e das Docentes da Ufam, realizada no dia 31 de outubro de 2023, repudia a proposta de ponto eletrônico, que pode significar o aprofundamento e a instrumentalização de mecanismos de controle, vigilância e assédio dentro da Universidade”.

 

Em Assembleia Geral, docentes aprovaram a produção de moção de repúdio

 

 

Na mesma AG foi aprovada a leitura da moção de repúdio nos conselhos superiores da Ufam – que também foi afixada pelo campus da Ufam – e a realização de uma mesa-redonda sobre o tema, com participação da Assessoria Jurídica da ADUA, representante do ANDES-SN e um(a) médico(a) do trabalho. Na ocasião, ainda foi encaminhado o envio de um convite para participação da Progesp e da reitoria.

 

Durante a assembleia do dia 31 de outubro, vária(os) docentes manifestaram posição contrária ao controle eletrônico de frequência, apontando que entre as possíveis consequências estão o aumento do adoecimento, a piora nas condições e nas relações de trabalho e a intensificação do assédio.

 

“Por que agora está sendo feita a imposição do controle de frequência que segue uma lógica privatista que não se aplica à universidade? É um controle de frequência ou controle dos nossos corpos?”, questionou a 1ª secretaria da ADUA, Ana Cláudia Nogueira, ressaltando ainda que a Ufam, ao mesmo tempo em que implementa esse sistema, desenvolve, à revelia do Conselho Administrativo (Consad), um projeto de teletrabalho, que também é combatido pela Seção Sindical.

 

Considerando as legislações que comprovam a inviabilidade da implantação do sistema, a ADUA aguarda da Reitoria da Ufam o reconhecimento da inviabilidade da cobrança do ponto eletrônico para todas(os) as(os) docentes. Caso a solicitação encaminhada por meio de ofício à Administração Superior não seja atendida, a Seção Sindical irá utilizar a via jurídica em preservação à saúde mental e às condições de trabalho das(os) docentes.

 

TAEs são favoráveis à implantação de sistema democrático

 

O sistema de controle de frequência proposto pela Ufam é engessado e prejudica a atuação das(os) servidoras(es), segundo o coordenador-geral do Sindicato dos Trabalhadores do Ensino Superior do Estado do Amazonas (Sintesam), Diego Squinello. “Deixa os servidores à mercê das chefias imediatas em uma relação verticalizada em que têm pouca ou nenhuma voz (...) ademais o sistema proposto está sendo feito de forma impositiva, de cima pra baixo, não houve audiências públicas, a comunidade será treinada nos requisitos técnicos, mas os pormenores regulatórios que interferem no dia a dia deveriam ter sido debatidos”.

 

Para o representante das(os) Técnico-administrativas(os) em Educação (TAEs), é preciso considerar que a universidade tem uma realidade complexa em relação à natureza e à modalidade do trabalho das(os) servidoras(es) envolvidos em ensino, pesquisa, extensão e inovação em comitês e conselhos. “Somos a favor sim que a lei seja cumprida e a frequência registrada, mas de um modo democrático que permita ao servidor manter sua atuação transversal dentro da universidade, participando de representações e projetos em diversos locais”.

 

Outra preocupação do Sintesam diz respeito ao assédio moral devido ao fato de que o controle ficará a cargo da chefia imediata. “O ponto será direto no SouGov, o que deixa a gente na mão do chefe, será uma dificuldade para justificar um atraso ou saída para médico, e já temos muitos registros de assédio moral”, disse a coordenadora-geral do Sintesam, Crizolda Araújo, no debate promovido pela ADUA no dia 08 de novembro. Pela IN nº 125/2020, a chefia imediata será responsável por acordar as ausências da(os) SPFs (artigo 13); por aprovar a realização de horas excedentes para o banco de horas (artigo 24), e autorizar a utilização do banco de horas (artigo 25).

 

Apesar da existência de mecanismos de combate ao assédio na universidade, principalmente, devido à atuação do Sintesam, da ADUA e da Comissão de Combate ao Assédio Moral na Ufam (Cecam), a mão da Administração, segundo Diego Squinello, pesa menos em cima das chefias e mais em cima da(o) servidora(or) comum. “Não é um caso de demonizar as chefias, são cargos passageiros que todos podemos ocupar eventualmente, mas é o caso de exigir da Administração Superior celeridade e severidade na apuração e correção dos casos de assédio moral e de outros tipos de assédio na instituição”.

 

Considerando todas essas particularidades, o Sintesam busca uma alternativa em que a gestão do horário de trabalho e atribuições seja feita de maneira democrática. “Estamos estudando modelos como o controle social implantado na UFSC [Universidade Federal de Santa Catarina], entre outros, como base para pensarmos um modelo de gestão que atenda às nossas necessidades”, comentou Diego. Para o coordenador, aplicar as normativas do governo sem considerar a realidade local é prejudicial.

 

 

Fotos: Carolina Diniz/Reprodução; Reprodução; e Daisy Melo/Ascom ADUA

 



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