Estudantes, docentes e técnico-administrativos da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) cobraram melhorias no transporte coletivo que serve a comunidade acadêmica e também ações que promovam o trânsito seguro na sede da instituição. O pedido foi feito durante o debate sobre “A humanização do transporte coletivo na Ufam”, promovido pelo Movimento Educar para a Cidadania, na última quarta-feira (8), na sede da Adua.
A acessibilidade foi uma das questões levantadas. Pesquisa realizada por estudantes de Geografia mostra que duas linhas (352 e 125) que atuam no campus universitário atendem parcialmente os requisitos específicos para pessoas com deficiência. O caso mais crítico é da linha 616 que não dispõe de plataforma de acessibilidade para cadeirantes em nenhum dos veículos. “É preciso pressionar para que haja a renovação da frota, a troca da empresa que não tem ônibus adaptado para deficientes e ainda exigir a manutenção dessas plataformas, pois algumas já apresentam defeitos”, reclamou o estudante Renan Tinoco.
Entre as sugestões de melhoria do transporte coletivo apresentadas pelos graduandos está a reativação da linha 354, passando pelo Terminal 4 (Jorge Teixeira), a instalação de “botões do pânico” próximo ao condutores, para que a polícia seja acionada em caso de assalto e ainda a reinstalação das placas contendo os horários de saídas dos coletivos. “Essa última é uma medida para que nós, estudantes e servidores, possamos exercer o controle e cobrar do administrador de linha explicações em caso de atraso, de imprevisto, enfim de alternativas para a troca de veículos”, afirmou o estudante Pedro Patriota.
Para o técnico-administrativo Luiz Carlos Bonates é preciso ainda reduzir o intervalo de tempo entre saídas da linha Integração pelo menos nos horários mais demandados pela comunidade acadêmica. “Eu pego o Integração todos os dias em frente ao INPA e levo mais de meia hora para chegar ao campus. Isso porque é impossível entrar nas primeiras horas da manhã ou no fim do dia. Hoje mesmo eu vim pendurado na porta porque não tinha como entrar”, criticou.
A estudante Gabriela Santana, após apresentar um estudo sobre a localização e a utilidade das paradas de ônibus da Ufam, afirma que a instalação de abrigos carece de mais cuidado por parte de quem planeja e executa a obra. “Não adianta construir paradas em qualquer área, sem antes estudar a dinâmica espacial daquele lugar, a circulação de pessoas e automóveis pela via”, avaliou.
Gabriela fez duras críticas à instalação de dois abrigos que custaram R$ 26 mil cada aos cofres públicos e são praticamente inutilizados. “Foram implantados abrigos próximos ao estacionamento da FT e da FES, onde nunca há ninguém utilizando porque ali só ocorre desembarque. Enquanto isso, onde há maior demanda e necessidade, locais que servem de embarque e desembarque, como o ponto em frente à FCA e aquele após a guarita do campus, não há abrigo. Sempre há muita gente nesses dois pontos, suportando diariamente a forte incidência solar e as constantes chuvas”, lamentou.
Motorista de transporte coletivo, Luís Odilo chamou atenção para um caso grave: a falta de manutenção nos veículos. “Pneus carecas, ônibus sem freios e você é obrigado a sair nessas condições”, afirmou. Odilo disse que se recusa a deixar a garagem nessas ocasiões, mas não vê a mesma relutância nos colegas mais novos. Ele também pede mais fiscalização dos órgãos competentes e ainda que seja exigido das empresas um plano de capacitação continuada para condutores. “Quando entrei no sistema, pensei que fosse receber um treinamento para lidar com o usuário. Não recebi sequer informações sobre a linha e a rota. O que você pode esperar de um motorista?”, questionou.
Fiscalização
Para o doutor em Ciências em Engenharia de Transportes, professor Geraldo Alves, a melhoria do transporte coletivo no campus – e na cidade – também perpassa pelas ações de fiscalização, entre elas a avaliação sobre a lotação dos veículos. “A SMTU [Superintendência Municipal de Transportes Urbanos] não está fazendo o monitoramento da taxa de ocupação dos veículos”, disse. O docente do Departamento de Geografia da Ufam contou que em certa ocasião seguiu em pé na linha 352, do ponto de ônibus do ICHL da Ufam até o Terminal 3, na Cidade Nova – cerca de 20 km de distância. “Isso porque já estava lotado. Cadê a fiscalização e o planejamento para oferecer o transporte público de qualidade?”, lançou a pergunta.
Alves também lamentou a ausência da Prefeitura de Manaus no seminário ‘Mobilidade Urbana: desafios e possibilidades’, realizado nos dias 13 e 14 de agosto, na Ufam. Várias entidades estão desde o início deste ano participando de audiências públicas para discutir a elaboração do Plano Diretor de Mobilidade Urbana. “Qual é a capacidade de transformação que essa comunidade tem quando as decisões são tomadas de modo unilateral?”, indaga, criticando a ausência do executivo municipal, que, em última instância, é que toma as decisões sobre a mobilidade na cidade.
Cidades que, na avaliação do professor da Faculdade de Educação Jacob Paiva, acabam sendo construídas para os carros e não para as pessoas. “A lógica dessa sociedade capitalista é o carro individual e não o transporte coletivo. O governo incentiva a diminuição no preço do carro, todo mundo compra um automóvel e depois as pessoas reclamam do trânsito na cidade, sem antes ter discutido com o executivo municipal a estrutura viária de Manaus”, ponderou.
“A universidade não é uma torre de marfim. Os problemas que ocorrem aqui são reflexo do que acontece lá fora” disse, alertando que quem dirige mal e tem comportamento inadequado no trânsito nas vias da capital certamente o reproduzirá na estrada do campus. Para ele, urge a necessidade de realização de campanhas educativas no campus da Ufam. “Se tivermos que apelar para medidas de sinalização mais coercitivas, assim deve ocorrer”, completou.
Medidas
O prefeito do Campus, professor Atlas Bacellar, ao recuperar o histórico da sede da instituição, lembrou que a construção dos quase sete quilômetros de estrada que ligam a entrada aos setores norte e sul do campus, teve, entre outros objetivos, preservar as 14 nascentes concentradas na Ufam. “Esse é o terceiro maior fragmento florestal urbano do mundo; o primeiro do país. Quem é o responsável por cuidar desse patrimônio?”, questionou.
Bacellar também externou preocupação com o aumento no número de acidentes de trânsito no Campus e afirmou que grande percentual das ocorrências se deve a erro humano. “A educação no transito é algo fantástico na Ufam”, ironizou. Ele citou como exemplos das condutas inadequadas o caso de condutores, inclusive motoristas do transporte coletivo, que desrespeitam o limite de velocidade na estrada do campus – 40 km/hora –, que não dão preferência a quem está na rotatória e ainda os que estacionam em lugares inapropriados.
Fortalecer a sinalização e promover uma campanha de educação estão entre as ações planejadas para o campus universitário. O prefeito do Campus não descarta a possibilidade de implantação de redutores de velocidade, a pedido da Reitoria, ou mesmo a colocação de equipamentos para fiscalizar o respeito à velocidade máxima permitida. Mas essas medidas ainda estão sendo estudadas pela Prefeitura do Campus com apoio de especialistas da Ufam.
O diretor de Transportes Urbanos da SMTU, Waldir Frazão, disse que é necessário mais que vontade política para resolver o problema de transporte coletivo no campus e na cidade de maneira geral. “Manaus tem esse problema há muito tempo. Sem uma vultosa quantia de recursos financeiros nós não vamos conseguir fazer nada. Também não há outro meio para melhorar o sistema de transporte coletivo se nós não dermos prioridade para o ônibus”, afirmou.
De acordo com Frazão, a Prefeitura de Manaus contratou recentemente uma empresa para fazer uma pesquisa sobre o transporte coletivo na capital, cujo resultado deve orientar a aplicação de medidas voltadas para a área. “Nós também vamos retomar o trabalho com o sistema de transporte BRS (Bus Rapid System) tão logo passe o período eleitoral, reduzindo o tempo de viagem das linhas”, disse. Em relação às demandas apresentadas pela comunidade acadêmica, ele afirmou que a Superintendência está aberta para estabelecer parceria com a Ufam.
Pauta republicana
Para o presidente da Adua, professor Alcimar Oliveira, quando se discute “mobilidade urbana e trânsito” se coloca em evidência a discussão sobre o atual modelo de sociedade. “São questões que deveriam ser encampadas pelo Estado, pelos municípios, pela própria Ufam”, disse o docente, recorrendo a Platão para destacar a necessidade de refletir sobre os problemas complexos em sua abrangência geral: “é dialético quem consegue elaborar uma visão de conjunto”.
Ele destaca o papel dos movimentos abrigados pela seção sindical no debate de “pautas republicanas”, cujas discussões acabam incomodando aqueles que detêm o poder nas instituições. “É preciso pressionar as autoridades, sobretudo quando se tem instituições omissas”, disse. “Nós temos que cada vez mais reforçar eventos como esses. Do contrário, o pior que pode ocorrer é as coisas adquirirem ‘estatuto de naturalidade’”, completou, chamando atenção para a quantidade de acidentes de trânsito que ocorre no país, vitimando quase 60 mil pessoas por ano.
Fonte: Adua |