Sue Anne Cursino e Daisy Melo
Desvalorização salarial, precarização de trabalho, cortes de verbas no ensino e pesquisa, desmonte do serviço público e outros ataques do governo federal impulsionaram a construção da Greve Unificada dos(as) Servidores(as) Públicos(as) Federais (SPFs), que tem a adesão da ADUA. A principal reivindicação da categoria é a recomposição salarial de 19,99% referente à inflação acumulada nos três primeiros anos da gestão Bolsonaro, período em que esses problemas históricos sofridos pela categoria foram potencializados.
“Todas e todos devem lutar sempre pela valorização da carreira da servidora e do servidor público, que neste governo, embora tenha sido tão desqualificada, mostrou mais que nunca sua importância. A carreira docente está sendo desestimulada a Docentes da Ufam apoiam indicativo de greve geral do funcionalismo público federal cada ano e só a luta nos possibilitará manter melhores condições para estabelecê-la, o que automaticamente permitirá a manutenção de educação pública gratuita e de qualidade acessíveis a cidadãs e cidadãos brasileiros”, afirmou a presidente da ADUA, professora Ana Lúcia Gomes.
Os professores e as professoras da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) se manifestaram, por maioria dos votos, pelo apoio ao indicativo de greve geral dos(as) SPFs. Em Assembleia Geral de Manaus, no dia 17 de março, a categoria docente da Ufam aprovou, por unanimidade (19 participantes), apoiar o indicativo. Na Assembleia descentralizada no Instituto de Educação, Agricultura e Ambiente (IEAA/ Ufam), em Humaitá, em 16 de março, foi decidido, também por unanimidade (9 participantes), pelo não apoio ao indicativo. Os e As docentes das demais unidades fora da sede (Parintins, Benjamin Constant, Coari e Itacoatiara) não realizaram consulta.
Em Assembleia anterior da ADUA, no dia 15 de fevereiro, foi aprovada a adesão à construção da paralisação. Entre os sindicalizados e sindicalizadas foi consenso a necessidade de lutar contra a defasagem salarial e em prol da urgente valorização do serviço público. Também houve a defesa de que a paralisação seja unificada com os demais setores e ocorra na modalidade presencial, com manifestação ativa e efetiva dos servidores e das servidoras.
Nos 42 anos de resistência, a ADUA tem atuado de forma ativa em defesa das liberdades democráticas, da educação pública, gratuita, laica e de qualidade socialmente referenciada. Mesmo em meio a pandemia da covid-19, a Seção Sindical participou da retomada das manifestações de rua em 2021, nos atos presenciais da Campanha Nacional pelo Fora Bolsonaro e da Jornada de Lutas contra a PEC 32 em Brasília (DF). O 2º vice-presidente da ADUA, professor José Alcimar de Oliveira, assegura que a Seção Sindical não se eximiu de nenhuma luta presencial em Manaus, nas unidades da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) fora da sede e na capital federal.
Construção nacional
A campanha salarial do funcionalismo público ganhou forças em todo o Brasil após convocação do Fórum das Entidades Nacionais dos Servidores Públicos Federais (Fonasefe) e do Fórum das Carreiras de Estado (Fonacate). Desde o início do ano, o Fonasefe, com 26 entidades filiadas, e o Fonacate, que aglutina 37 organizações, mobilizam a categoria para as atividades foram aprovadas em Plenárias. O ANDES-SN, que contém 124 seções sindicais, com mais de 75 mil sindicalizados e sindicalizadas, aderiu à mobilização e mantém a convocação pela construção da paralisação unificada.
“A greve é um processo em construção que precisa ter adesão das categorias, e pra ter adesão precisa ter um processo de mobilização das nossas bases, dos nossos locais de trabalho, das nossas deliberações em favor da greve, para que a gente possa pensar isso de modo articulado e unitário”, defendeu a presidente do ANDES-SN, Rivânia Moura, em Plenária Nacional dos e das SPFs.
Diversas seções sindicais do ANDES-SN já aprovaram a participação como as associações de docentes das universidades federais do Pará (Adufpa), de Uberlândia (Adufu), do Rio de Janeiro (ADUFRJ e Adunirio), do Pampa (Sesunipampa), de Pelotas (Adufpel), do Mato Grosso (Adufmat) e a Associação dos Professores de Ensino Superior de Juiz de Fora (Apes).
Em reunião do Setor das Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes) públicas do ANDES-SN, ocorrida em 22 de fevereiro, o encaminhamento central foi pela intensificação da mobilização em defesa dos direitos dos e das docentes.
Em 9 de março, SPFs lançaram o Comando de Mobilização e Construção da Greve. A atividade foi transmitida pelos canais no YouTube do Fonasefe, Fonacate e ANDES-SN.
Reivindicações
Apesar da reserva no Orçamento 2022 de R$ 1,7 bilhão para o reajuste salarial dos e das SPFs, a categoria segue sem definição. Em 2021, o presidente Jair Bolsonaro chegou a anunciar que o reajuste seria apenas para as carreiras policiais, o que serviu de estopim para a campanha salarial conjunta do funcionalismo público federal com reposição para toda a categoria. A isonomia é um direito garantido pela Constituição, que prevê igualdade no tratamento dos trabalhadores e das trabalhadoras no âmbito federal.
Em plenária dos e das SPFs, o consultor legislativo, Luiz Alberto dos Santos, apresentou um estudo com dados fiscais e orçamentários, demonstrando a possibilidade de recuperação remuneratória entre 2017 e 2022. No mesmo encontro, o advogado da Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal e Ministério Público da União (Fenajufe), Cézar Britto, ressaltou que não há obstáculo jurídico ou orçamentário e que a luta da categoria é um fator decisivo. “A história tem demostrado claramente que os reajustes, o realinhamento das carreiras, dependem mesmo da mobilização”, enfatizou.
Em vídeo, o 1º tesoureiro do ANDES-SN, Amauri Fragoso, esclareceu que a reposição salarial é assegurada pelo artigo 37 da Constituição Federal, inciso 10, que garante revisão salarial anual. Mas, na prática, os governos desvirtuaram a interpretação da Carta Magna, passando a conceder reestruturação de carreira ao invés de um índice linear. Considerando esse contexto, os e as SPFS definiram um índice único emergencial – no caso os 19,99% das perdas inflacionarias – que atendesse a todos e todas.
“O Magistério Superior e o EBTT [Ensino Básico, Técnico e Tecnológico], que é o nosso caso, é muito mais complicado, porque houve desestruturação da carreira e cada professor, no seu determinado nível da malha salarial, teve um reajuste no passar do tempo (...) tivemos perdas salariais, devido ao processo inflacionário, e perdas históricas, que são as decorrentes dos nossos direitos, da desestruturação da carreira que foi implementa da, principalmente, a partir de 2008”, explicou Fragoso salientando que, neste último caso, os e as SPFS têm lutado conjuntamente pela recomposição da inflação, mas manterão paralelamente a mobilização pelas perdas históricas.
Contrarreformas
Além da reposição salarial, estão entre as motivações da greve geral a revogação da Emenda Constitucional (EC) nº 95/2016 (Teto dos Gastos), a derrubada da chamada Reforma Administrativa (PEC 32/2020) e a construção de uma pauta específica da educação, construída pelas entidades que atuam em defesa das Ifes públicas.
Duro ataque ao serviço público, a EC nº 95, que vigora desde 2017, alterou o regime fiscal e limitou por 20 anos a aplicação de recursos em áreas fundamentais para a garantia de direitos da população, como Saúde e Educação. Na área educacional, esse congelamento causa impactos na qualidade do ensino, como os já sentidos pelos cortes orçamentários nas Ifes, e o congelamento de salários dos servidores e das servidoras.
A PEC 32, encampada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, tenta alterar as regras na organização da Administração Pública direta e indireta, com impacto negativo ao sistema público federal para toda a população brasileira. Essa contrarreforma tem sido fortemente combatida pelo funcionalismo público, que promoveu em 2021 a Jornada de Lutas pela derrubada da PEC. O movimento contou com diversos atos públicos nos estados e em Brasília, e teve a participação de entidades representativas dos e das SPFs e das centrais sindicais.
Sobre a pauta específica da Educação na construção da greve, a mobilização do ANDES- SN é direcionada pela defesa da universidade pública, do trabalho docente, da autonomia, do financiamento, da democratização das instituições, por melhores condições de trabalho, reestruturação da carreira e política salarial. Essa pauta remonta questões discutidas anteriormente em outras greves.
“Hoje nós não temos 10% do Produto Interno Bruto (PIB) na Educação Pública. Nós investimos menos de 5 % do PIB, e essa é uma pauta contínua. Outro ponto é a melhoria da condição do ensino, com maior investimento nas condições de trabalho. Pensamos em uma reestruturação da carreira, porque a Lei 12.772 criou mais carreiras, resultando em um prejuízo grande, abriu um fosso entre os níveis. Por isso, queremos uma reformulação com um plano de carreira mais enxuto”, explicou o 1º vice-presidente da ADUA, professor Aldair Oliveira.
O docente lembrou, ainda, o impacto negativo da aprovação da Emenda Constitucional n° 103/2019. “Sempre lutamos contra a Reforma da Previdência, que foi um prejuízo terrível principalmente para os servidores da educação. Tivemos um aumento de carga de tempo de contribuição, com maior achatamento. As regras de cálculo de aposentadoria são totalmente injustas. Esses elementos devem aparecer no horizonte da construção da pauta da categoria da Educação para ser apresentada para o governo”, adiantou.
Unidade de luta
Diante da conjuntura, o ANDES-SN, juntamente com o Fonasefe e o Fonacate, tem realizado manifestações e atos simbólicos nos estados e em Brasília, sem deixar de lado a luta pela recuperação das perdas históricas e das pautas especificas da Educação. “A primeira saída sempre é tentar manter diálogo com o governo para negociação, porém como isto está sendo ignorado as ações deverão se dá a partir de uma construção política de mobilização entre as diferentes categorias de servidoras e servidores públicos”, afirmou a presidente da ADUA.
Em 18 de janeiro deste ano, mais de 40 categorias do funcionalismo público federal se uniram no Dia Nacional de Mobilização e protestaram em frente às sedes do Banco Central e do Ministério da Economia. Na ocasião foi protocolada uma pauta com as reivindicações. Imitações de notas de dólares, bonecos representando Paulo Guedes e ratos foram utilizados em escracho às ações do governo, e como crítica direta às contas do ministro da economia em paraísos fiscais, ao favorecimento de bancos e grandes empresas e ao desvio de recursos públicos.
Para a presidente da ADUA, os maiores desafios são mostrar para a sociedade que servidores e servidoras não são privilegiados e privilegiadas, e buscar a unidade de todos e todas SPFs. “Devemos mostrar a este governo irresponsável que serviços públicos são necessidade e devem ser mantidos pelo Estado. Caso ocorra a greve geral, a ADUA se fará presente de forma ativa em ações de rua no Estado do Amazonas e seus municípios, bem como em Brasília, para denunciar os ataques que o serviço público tem sofrido de forma mais cruel e desigual neste governo”, afirmou.
Em constante diálogo com a base, a ADUA mantém o engajamento na campanha salarial 2022. A Seção Sindical, alinhada ao ANDES-SN, Fonasefe e Fonacate, vem apoiando e participando ativamente das atividades – sejam virtuais ou presenciais – que reivindicam melhores condições de trabalho, valorização salarial e uma educação pública gratuita e de qualidade. A resistência docente se fará até que sejam respeitados os direitos garantidos constitucionalmente à categoria.
CALENDÁRIO DE MOBILIZAÇÕES
• Permanente vigília: Todos os dias no Ministério da Economia
• 7 de abril: Dia Mundial da Saúde - Fortalecer atos que vão ocorrer em todo Brasil destacando a defesa do SUS
• 9 de abril: Fora Bolsonaro - Dia Nacional construído pelo Comando
Fotos: ADUA/Sue Anne Cursino e ANDES-SN/Divulgação
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