A comunidade acadêmica da Universidade Federal do Paraná (UFPR) foi surpreendida com declarações do reitor da Universidade, Zaki Akel Sobrinho, nos principais veículos da imprensa do Paraná, sobre o retorno da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) à pauta dos Conselhos da UFPR.
Em suas declarações, o reitor afirma que a proposta deverá ser apresentada e votada pelos integrantes do Conselho Universitário (COUN) em regime de urgência nesta quinta (05), como uma solução para resolver o problema causado pela imposição da demissão dos servidores contratados via Fundação da UFPR (FUNPAR) – por determinação da Justiça do Trabalho – e a situação financeira do Hospital de Clínicas (HC). Segundo o reitor, a dívida já ultrapassa R$ 10 milhões.
Entretanto a mudança de posicionamento vai contra todo o histórico de luta da comunidade acadêmica contra a EBSERH e se opõe à própria decisão do Conselho Universitário da UFPR, que em agosto de 2012 aprovou por aclamação uma resolução contrária à Empresa.
Houve consenso entre os conselheiros de que a entrega da gestão do HC para a Empresa aumentaria a precarização do trabalho e colocaria em risco o papel acadêmico desempenhado pelo Hospital. Com a resolução negando a adesão total ou parcial à Empresa, o Conselho Universitário reafirmou a posição adotada em abril de 2011, quando aprovou por unanimidade uma moção de repúdio à Medida Provisória 520, que iniciava o processo de criação da EBSERH.
“Fomos surpreendidos com as entrevistas do reitor dizendo que vai pautar novamente a questão da EBSERH, sendo que nós já temos desde 2011 a posição do Conselho contra a adesão”, ressaltou o presidente da Associação dos Professores da Universidade Federal do Paraná (APUFPR-SSind), João Francisco Ricardo Kastner Negrão.
Justificativa
Em sua declaração, o reitor da UFPR coloca a EBSERH como a solução para a situação do Hospital de Clínicas que, de acordo com a reitoria, está com uma dívida de mais de R$ 10 milhões. “Contraímos uma dívida de R$ 1 milhão por mês”, frisou o reitor. Por isso começou a ser articulado um contrato de adesão à Empresa.
Para a diretoria do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Terceiro Grau Público de Curitiba, Região Metropolitana e Litoral do Estado do Paraná (SINDITEST-PR) a situação é contraditória, visto que são repassados milhões de reais para que a Empresa faça a gestão dos hospitais e para sanar a dívida do HC não há dinheiro.
“A EBSERH é uma empresa privada que vai cobrar sobre os serviços, e quem vai pagar é o governo. Então, se tem dinheiro para pagar a Empresa, como que não tem dinheiro para pagar a dívida? Se é que realmente existe. O reitor coloca essa situação para dizer que está um caos, mas na verdade quer chamar a atenção da população e da mídia para a solução, que é a EBSERH”, indaga o diretor do SINDITEST-PR Ailton Teófilo.
Além disso, a Administração da UFPR também argumenta que a entrega do HC à EBSERH é a única solução para repor o quadro funcional, que ficará debilitado com a exoneração de aproximadamente mil trabalhadores contratados via FUNPAR até o dia 19 de junho, por determinação do Tribunal Regional do Trabalho.
A Universidade Federal do Paraná irá propor à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares para que seja formalizado em contrato um prazo para que os 916 funcionários da FUNPAR continuem atuando no Hospital de Clínicas.
De acordo com o resultado do diagnóstico realizado pela EBSERH, o HC tem um déficit de 1.540 servidores. Entretanto, segundo o SINDITEST-PR os dados estão superestimados: “O déficit não chega a esse número, a Administração se adequou a isso apenas para justificar que com a EBSERH sejam feitos concursos”, frisou Teófilo.
Promessas
A promessa da Administração da UFPR é de que o Hospital não será totalmente gerido pela Empresa, e que serão mantidas as pesquisas. “Estamos elaborando um programa de administração compartilhada. Não podemos permitir que deixe de ser um hospital-escola, com garantias de que as pesquisas serão mantidas e com um número adequado de funcionários”, frisou o reitor.
Entretanto, a APUFPR-SSind alerta que, a exemplo do que aconteceu em diversas outras universidades que aderiram à Empresa, a privatização e perda da autonomia universitária é o destino certo do Hospital.
“Não podemos nos deixar enganar por promessas de que milagres acontecerão. Todos sabem que a EBSERH é uma empresa de caráter privado. Não abriremos mão de nosso papel enquanto instituição formadora. Temos um compromisso com a saúde pública e a educação”, defende João Negrão.
Outra promessa é de que será assegurado que a maioria dos trabalhadores da FUNPAR permaneça no HC até a aposentadoria. “Vamos propor que o contrato de adesão à EBSERH explicite o prazo que eles ficarão no hospital”, afirmou Zaki. Porém, o próprio reitor reconhece que a possibilidade de isso acontecer é mínima. “Não temos ainda a certeza de que a EBSERH irá aceitar essa proposta”, disse.
“O reitor diz na mídia que os funcionários vão ficar, mas a própria lei da EBSERH diz que é só através de concurso”, esclarece Teófilo.
Democracia
Para a APUFPR-SSind, a divulgação na imprensa da entrega da gestão do HC a uma Empresa que interferirá na vida de toda a comunidade acadêmica, sem dialogar com os principais envolvidos com o processo – docentes, estudantes e técnico-administrativos – reflete a falta de compromisso da Administração da Universidade com a democracia na instituição.
“O fato de passar por cima da decisão do Conselho Universitário e não envolver a comunidade no debate sobre a EBSERH mostra uma ruptura do processo democrático na UFPR”, afirma o presidente da entidade, João Negrão.
A história recente da instituição foi marcada por situações semelhantes, quando houve a quebra de democracia, e que causaram celeumas profundas na comunidade acadêmica.
Em 2007, durante a gestão de Carlos Augusto Moreira Junior, a aprovação da adesão da UFPR ao Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI) ocorreu em um processo marcado pelo autoritarismo, em que prevaleceu o uso da força e a ausência de diálogo por parte da Administração da instituição.
Na ocasião, a sessão do COUN foi convocada com menos de 24 horas de antecedência e realizada no auditório da maternidade do Hospital de Clínicas da UFPR, sem a participação da comunidade universitária e com escolta da Polícia Federal em frente do prédio para impedir a entrada de manifestantes.
“Na aprovação do REUNI, a reitoria ignorou a opinião da comunidade acadêmica e impôs a sua vontade de forma truculenta e com uso de violência. Agora, com o recesso da Universidade por causa da Copa do Mundo, o risco de que a história se repita é muito grande”, ressalta o presidente da APUFPR-SSind.
Em consulta realizada na UFPR em 2012 durante o Plebiscito Nacional sobre a EBSERH, 97% dos votos foram contrários à entrega da gestão do HC à Empresa. “A comunidade acadêmica já manifestou seu posicionamento. Isso deve ser respeitado”, afirma Negrão.
Luta
Diante da situação criada pela Administração da Universidade, a comunidade acadêmica ampliará a luta contra a implementação da EBSERH na UFPR. A Associação dos Professores da Universidade Federal do Paraná, que sempre lutou contra a privatização do Hospital de Clínicas, intensificará a mobilização junto às outras categorias para impedir que a Administração da Universidade tome essa atitude.
“A ação vai continuar a mesma. Vamos lutar contra a adesão à EBSERH, e manter o HC como hospital-escola, como parte da Universidade, com sua administração dentro da UFPR e não nas mãos de uma empresa como o governo está tentando forçar”, frisou o presidente da APUFPR-SSind.
A APUFPR-SSind está em campanha com o slogan “Mesmo que o governo pressione não mudamos de opinião. Não à EBSERH, sim à autonomia universitária”, para mobilizar toda a comunidade contra a Empresa.
A campanha unificada “Para não perder o HC”, que apresenta os prejuízos acadêmicos, estruturais e financeiros da aceitação da imposição, também está lançada pelos docentes, servidores técnico-administrativos e estudantes.
Para os estudantes, a mobilização de toda a Universidade é essencial para conseguir barrar a entrega do HC. “Temos que fazer uma mobilização muito forte, vamos conversar com os estudantes para reiterar o nosso posicionamento de 2012”, afirma a diretora do Diretório Central de Estudantes (DCE) da UFPR, Mariana Garcia Tabuchi.
A Federação de Sindicatos de Trabalhadores em Educação das Universidades Brasileiras (FASUBRA) também afirmou seu apoio à luta contra a privatização do HC. “A FASUBRA tem uma luta histórica contra a privatização dos Hospitais Universitários e em defesa do SUS. Nós daremos todo o apoio necessário a essa luta aqui na UFPR. É muito importante a unidade entre docentes, técnicos e estudantes para derrotar esse projeto que faz parte de uma política governamental que visa a precarização do trabalho dos servidores da saúde federal”, afirma o coordenador-geral da FASUBRA, Gibran Ramos Jordão.
Fonte: APUFPR-SSind |