Universitários beneficiados pelo Programa Universidade para Todos (Prouni) e Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) já somam 31% do total das matrículas no sistema privado de ensino superior. O percentual representa 1,66 milhão de alunos de um total de 5,34 milhões fazendo cursos presenciais em instituições particulares em 2013, de acordo com levantamento do Ministério da Educação (MEC) feito a pedido do Valor. Em 2010, a participação das duas políticas públicas sobre o total de vagas era de apenas 11%, três vezes menor que a proporção atual.
É a primeira vez desde 2005 que o MEC apresenta números ativos de bolsas do Prouni e de contratos do Fies. A informação corresponde ao verdadeiro peso dos programas federais em relação ao universo atual de matrículas do ensino superior privado brasileiro, permitindo um melhor acompanhamento da trajetória dos alunos beneficiados, inclusive em comparação com o total de estudantes. Devido à defasagem de um ano da divulgação do Censo da Educação Superior, o governo federal sempre divulgou dados acumulados, impedindo que se faça relações atualizadas com o total de matriculados - para as matrículas de 2013, o MEC projetou um crescimento de 4% sobre 2012.
O fato de que praticamente um terço dos alunos esteja em faculdades e universidades particulares com ajuda de recursos federais é resultado, sobretudo, da reformulação do Fies em 2010 e do forte avanço dos investimentos no programa, informa, em nota, o MEC. De acordo com a pasta, nos três primeiros anos do governo Dilma Rousseff, os empréstimos ativos do Fies subiram de 224.782 para 1,143 milhão - expansão de mais de 400%. Já o orçamento do programa teve alta nominal superior a 315% entre 2011 e 2013: passou de R$ 1,8 bilhão para R$ 7,5 bilhões.
Nesses três anos, o peso do Fies em relação ao total de matrículas subiu de 4,5% para 21,5%. No mesmo período, o peso das bolsas do Prouni oferecidas pelas instituições particulares a jovens de baixa renda em troca de renúncia tributária permaneceu estável na casa dos 9,5% - a legislação prevê que, para ter o benefício fiscal, as faculdades devem reservar até 10% das vagas a bolsistas do programa.
"Depois de 2010, o Fies se transformou num divisor de águas no ensino superior privado. A taxa de juro anual caiu de 9% para 3,4%; antes era só a Caixa oferecendo crédito, aí veio o Banco do Brasil; o prazo de carência passou de seis para 18 meses; e o prazo de pagamento passou de uma vez e meia para três vezes o tempo do curso mais um ano", diz Rodrigo Capelato, diretor-executivo do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp).
"Em 2009, apenas 2,4% dos alunos se matriculavam usando o Fies. Em 2013, 30% dos ingressantes vieram estudar por meio do Fies. Antes a gente tinha as classes A e B com condições de fazer universidade pública ou pagar uma boa faculdade privada e uma parcela das classes D e E chegando ao ensino superior atendida pelo Prouni, que é de 2004. A classe C ficou excluída até 2010, mas felizmente o Fies foi reformulado e o acesso está sendo ampliado", diz Capelato.
Para a maioria dos críticos do Prouni e do Fies, o governo usa recursos públicos para fomentar uma atividade privada, lucrativa. A prioridade, argumentam, deveria ser a expansão do ensino superior público, gratuito e de qualidade. Nelson Cardoso Amaral, professor e assessor da reitoria da Universidade Federal de Goiás (UFG), defende um ponto de vista "mais equilibrado".
"A pergunta a ser feita é: 'Qual o limite desses programas?' O governo deve considerar a desigualdade do país e atuar no limite das condições de pagamento de uma mensalidade por parte de uma família. Ao mesmo tempo deve manter uma expansão consistente do ensino superior federal. Fui muito crítico do Prouni entre 2004 e 2006, pois não havia uma contrapartida de expansão do acesso à universidade pública. Mas de lá para cá isso foi corrigido com a criação de novas universidades e a interiorização do ensino superior federal", avalia Amaral.
Capelato acredita que o Fies não chegou a seu teto e pode continuar se expandindo. "Nem Fies nem Prouni valem para o ensino a distância, que já soma mais de um milhão de matrículas." Ele também cita alguns indicadores: apenas 15% dos jovens brasileiros de 18 a 24 anos estão no ensino superior e a meta do Plano Nacional de Educação (PNE) é dobrar esse percentual nos próximos dez anos; o Brasil tem 38 milhões de pessoas com ensino médio completo mas que nunca ingressaram no sistema universitário.
Outro indicativo de que há espaço para os contratos de financiamento estudantil manterem a expansão, continua Capelato, é o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). "No ano passado foram 7,5 milhões de inscritos para fazer o teste. Ou seja, 7,5 milhões de pessoas querendo fazer um curso superior, mas pouco mais de 2 milhões entraram."
De acordo com o Semesp, os cursos mais procurados por alunos do Fies em 2013 foram os de engenharia, com 198 mil contratos firmados. Direito, com 178 mil contratos, e licenciaturas e pedagogia (102 mil) aparecem nas segunda e terceira posições, respectivamente, seguidas por administração de empresas (98 mil) e enfermagem (84 mil).
Fonte: Valor Econômico |