Professores, técnicos e estudantes da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) participam nesta sexta-feira (31) de um amplo debate sobre a proposta de Lei Orgânica das Universidades Federais, de autoria da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) e destinada a regulamentar a autonomia universitária de que trata o artigo 207 da Constituição Federal. O evento, convocado pelo Conselho Universitário (Consuni), ocorrerá das 8h às 13h, no Auditório Rio Amazonas, na Faculdade de Estudos Sociais (FES), setor Norte do Campus Universitário.
A decisão de submeter o tema à ampla discussão foi tomada por unanimidade pelos conselheiros que compõem a maior instância deliberativa da Ufam, durante a última reunião ordinária do Conselho em 2013, no dia 12 de dezembro. Eles acataram a proposta da Associação dos Docentes da Ufam (Adua), apresentada pelo presidente da seção sindical, José Belizario, de ouvir a comunidade acadêmica antes de o Consuni tomar qualquer posição sobre o tema.
Para Belizario, o debate público sobre autonomia universitária é uma oportunidade de reflexão sobre o futuro da academia. “Será uma excelente oportunidade para que a comunidade acadêmica conheça o conteúdo da proposta de lei, bem como as distintas visões sobre um tema da mais alta relevância para decidir o futuro das universidades públicas e, portanto do nosso país”.
Belizario afirmou ainda que a realização desse evento coloca a Ufam no protagonismo nacional como uma das primeiras universidades federais a tratar do assunto na perspectiva da democracia e da publicidade que o tema requer. Além da Ufam, o debate já está ocorrendo também na Universidade Federal Rural de Pernambuco, por conta da atuação do Grupo de Trabalho de Políticas Educacionais da Seção Sindical dos Docentes da instituição (Aduferpe).
Críticas
Na avaliação do presidente da Adua, a proposta de lei orgânica trata-se de um novo “golpe” proposto pelos aliados do governo, após a irresponsável expansão que vem acarretando no sucateamento das universidades. “Além da perda de direitos trabalhistas, os servidores agora têm de conviver com medidas de precarização da instituição, que vem sendo implementadas pelo braço direito do governo presente nas universidades”, afirmou.
Belizario citou como exemplo o recente caso da adesão da Ufam à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), para gerir o Hospital Universitário Getúlio Vargas (HUGV), cujo contrato foi assinado em outubro. No mês seguinte, a unidade hospitalar de alta complexidade enfrentou uma crise por falta de insumos, prejudicando centenas de pessoas que já estavam com cirurgias eletivas agendadas e foram suspensas.
No entendimento do professor Marcelo Vallina, do Instituto de Ciências Humanas e Letras, a proposta de lei orgânica das universidades federais tem dois eixos claros. “Ela [proposta] reduz a autonomia universitária à autonomia financeira, de acordo com o discurso daqueles que têm como projeto a mercantilização do ensino superior. E por outro lado, substitui a organização democrática por um obscuro Conselho das Universidades Públicas Federais, vinculado ao MEC”, disse.
Os docentes alertam que, se a proposta for aprovada, as universidades ficarão totalmente funcionais a um projeto de país comprometido com a lógica de mercantilização da educação. “Isso será reafirmado por meio de um perfil universitário produtivista, do aumento da venda de serviços, da criação e extinção de cargos, da quebra do Regime de Dedicação Exclusiva, ações que acentuarão a lógica privatizante na academia”, criticou a professora Ana Cristina Belarmino.
Docentes que participaram do grupo de estudo criado pela Adua para discutir a proposta de lei orgânica, durante o mês de janeiro, destacaram que a ideia não é nova. “Esse projeto nasceu na década de 1990, mas a força dos Sindicatos e Movimentos Sociais tem impedido até agora a sua aprovação, o que tem feito os governos retrocederem. Esperamos que as universidades usem da sua autonomia para impedir a sua adesão”, disse o professor Jacob Paiva, da Faculdade de Educação. Ele recorda que esse tema já foi, inclusive, motivo de uma greve naquele período.
Moção de Repúdio
No início deste mês, os docentes do Instituto de Natureza e Cultura – unidade acadêmica da Ufam em Benjamin Constant – divulgaram uma moção de repúdio à proposta de lei orgânica apresentada pela Andifes. “A universidade que defendemos diverge do modelo que vem sendo proposto e empreendido pelos últimos governos, ou seja, uma universidade de caráter produtivista que a aproxima de interesses privados que ferem princípios de direitos dos cidadãos brasileiros a uma educação superior, pública, gratuita e de qualidade”, diz trecho da nota.
Os professores de Benjamin Constant afirmam que o atual “modelo de universidade” diminui a responsabilidade do Estado e vem sendo materializado a partir de propostas como esta. “Nosso voto expressa também nossa indignação à forma como a educação e a universidade pública são tratadas por nossos governos. Primamos por uma universidade pública, gratuita, de qualidade e socialmente referenciada que atenda às reais necessidades cientificas, técnicas, culturais e sociais de nossa sociedade”, finaliza o documento.
O movimento docente entende que o artigo 207 da Constituição Federal é autoaplicável, e, portanto, não necessita de regulamentação. Por isso, para a categoria, a única opção é refutar tal proposta. “Não há sugestões para a lei orgânica das universidades federais, porque não é possível melhorá-la. A única alternativa é reprová-la”, arrematou o presidente da Adua, José Belizario.
É esse posicionamento que a categoria vai defender nesta sexta-feira (31) durante o debate público. Para o evento foram convidados representantes do Ministério da Educação, da Andifes, do Sindicato dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN), da Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores das Universidades Públicas Brasileiras (Fasubra), da Assembleia Nacional de Estudantes – Livre (Anel) e da União Nacional dos Estudantes (UNE).
O resultado do debate deverá subsidiar o posicionamento do Consuni a respeito do tema, em reunião extraordinária agendada para o dia 3 de fevereiro.
Fonte: Adua |