Em um contexto de luto e crise sanitária e sócio-política, a comunidade acadêmica da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) foi às urnas para escolher a nova reitoria (gestão 2021/2025), reforçando a defesa da autonomia universitária e das liberdades democráticas. Completando o ineditismo, o processo eleitoral foi realizado, pela primeira vez na história, de forma completamente remota, de 17 de fevereiro a 8 de abril deste ano.
“Isso ocorreu num período atípico da pandemia, em que as pessoas estão sendo muito afetadas pelo distanciamento social, adoecimento, luto. Ainda assim, houve um engajamento da comunidade, demonstrando a importância desse processo para a vida acadêmica. Isso é um indicador que essa consulta reforça a democracia, porque dá a oportunidade da manifestação do posicionamento de cada integrante da comunidade”, afirmou a presidente da Comissão da Consulta à Comunidade Acadêmica para a Escolha de Reitor (a) e Vice-Reitor (a) da Ufam, professora Iolete Ribeiro da Silva.
Luta contra a intervenção
Enfrentando todas as dificuldades da atual conjuntura, a comunidade da Ufam concluiu o processo eleitoral, elegendo, em segundo turno, a chapa 33 Ufam elege nova reitoria em votação totalmente virtual durante a pandemia “Experiência para Decidir, Coragem para Fazer”. Com 4.375 votos (o equivalente a 50,64% dos votos válidos), o então reitor licenciado da Ufam, professor Sylvio Puga, foi eleito para o cargo de reitor, e a professora Terezinha Fraxe, para a vice-reitoria.
A homologação da chapa vencedora ocorreu no dia 8 de abril no Conselho Universitário (Consuni/Ufam) e, consequentemente, foi feito o envio da lista tríplice ao Ministério da Educação (MEC) para nomeação pelo presidente, Jair Bolsonaro. Em decorrência do constante desrespeito do governo federal aos resultados das consultas nas instituições de ensino federais, ronda a incerteza sobre a aplicação da vontade da universidade.
Desde que assumiu o governo em 2018, Bolsonaro interferiu diretamente na nomeação de reitores de, pelo menos, 20 instituições, entre universidades, institutos e Cefet. Em alguns casos, o governo ignorou o primeiro colocado nas consultas e, em outros, indicou para o cargo nomes de seu interesse que não participaram do processo. Diante deste panorama, o ANDES-SN intensificou a luta pela não intervenção como a exemplo da campanha “Autonomia e democracia: Reitor/a eleito/a é reitor/a empossado”.
O Sindicato Nacional defende, inclusive, o fim da lista tríplice prevista na lei nº 9.192, de 21 de dezembro de 1995, que regulamenta o processo de escolha dos dirigentes universitários das instituições federais. Pela legislação, o presidente da República deverá escolher como reitor(a) e vice-reitor(a) os nomes indicados nesta lista, porém a dependência dessa nomeação para a conclusão do processo abre caminho para a interferência e desrespeita a autonomia universitária.
Neste sentido, em defesa da democracia e da autonomia universitária prevista no artigo 207 da Constituição Federal, a ADUA se manifesta pela posse do reitor eleito e da vice-reitora eleita pela comunidade acadêmica da Ufam. “A consulta à comunidade faz parte da autonomia universitária, esperamos que o governo respeite a decisão e faça a nomeação do professor Sylvio Puga. Não aceitaremos autoritarismo”, enfatiza a presidente da ADUA, professora Ana Lúcia Gomes.
Processo remoto
No total, três chapas se inscreveram para concorrer à reitoria da Ufam. Para a presidente da comissão, isso demonstrou o interesse no processo e permitiu a avaliação de três propostas diferentes. “Acredito que isso é um indicador de que o pleito foi bem-sucedido”, avaliou. Os votos foram computados na modalidade individual, obedecendo a paridade entre os três segmentos da comunidade acadêmica.
Foi registrada, ainda, a participação expressiva da comunidade, mesmo fora do semestre letivo e com a realização, pela primeira vez, da consulta de forma totalmente virtual por meio dos sistemas Eletrônico de Informações da Ufam (SEI! UFAM), Aberto de Eleições Eletrônicas (Seale) e do ecampus.
No primeiro turno (10 e 11 de março), foram registrados 8.105 votos, sendo 1.575 de professores (as), 1.148 de Técnicos (as)-Administrativos(as) em Educação (TAEs) e 5.382 de discentes. Também foram computados 46 votos em branco e 73 votos nulos. No segundo turno (24 e 25 de março), foi computado um total de 9.405 votos, sendo 1.678 de docentes, 1.377 de técnicos e 6.350 de estudante, além de 50 votos em branco e 80 nulos.
Na avaliação da professora Iolete, a consulta identificou a necessidade de investir no uso das plataformas digitais que a universidade já disponibiliza. “Nós identificamos servidores que não tinham senha, estudantes que não tinham senha, e é um sistema que deve ser utilizado no cotidiano do trabalho; também há a necessidade de trabalhar a inclusão digital, em especial dos servidores que tem mais idade e que utilizaram pouco essas ferramentas ao longo da sua carreira profissional”, afirmou.
A consulta foi coordenada pela comissão formada por representantes docentes, discentes e TAEs. A divulgação das informações sobre o processo foi realizada amplamente pela ADUA, em conjunto com o Sindicato dos Trabalhadores do Ensino Superior do Estado do Amazonas (Sintesam), com o foco na transparência, inclusive com a realização de transmissões ao vivo de atividades como zerézimas, debates e apuração dos votos, disponibilizados no canal da ADUA no YouTube.
O esforço em realizar e participar da Consulta à Comunidade Acadêmica para a Escolha de Reitor (a) e Vice- -Reitor (a) da Ufam é mais uma demonstração efetiva da luta da categoria docente pela democracia. Em tempos de intensos e constantes ataques do governo à educação e à categoria docente, a comunidade acadêmica demonstra, por meio do voto, o engajamento em fazer valer o direito constitucional da autonomia das universidades públicas.
Foto: ADUFCG/REPRODUÇÃO
Fonte: ADUA - Boletim 28
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