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Assédio Moral põe em risco a produtividade docente



As exigências cada vez maiores no mercado de trabalho atualmente fomentam a competitividade entre os profissionais, assim como a proatividade e a superação ininterrupta de obstáculos. Itens como corresponder às expectativas da chefia ou as necessidades de um cargo preenchem a lista de critérios para que um trabalhador seja considerado um bom profissional. Mas o que fazer quando o empregador/chefe persegue, sobrecarrega ou coage o servidor ao desvio de função?

Lotada no Instituto de Saúde e Biotecnologia de Coari (ISB/Ufam), a mestre em Geologia, Maria Rosaria do Carmo conta que seu sonho de ser professora universitária começou a ser ceifado pelo assédio moral há sete anos, quando ingressou na Ufam, através de concurso público, e descobriu que não lecionaria disciplinas correlatas à sua área de especialização.

Com o processo nº 23105.001375 junto ao Conselho de Administração (Consad), datado de setembro de 2012, no qual solicita relotação onde possa desempenhar suas atividades de ensino, pesquisa e extensão, a professora, fora da sala de aula por não ceder às pressões da direção, afirma que já chegou a ser obrigada pela Universidade a ministrar, em 2007, a disciplina de Informática Básica para quatro turmas de Enfermagem, Nutrição, Fisioterapia, Ciências: Biologia e Química, mesmo declarando-se inapta para tal.

“O assédio começou desde o primeiro dia de trabalho. Em novembro de 2006 iniciei minhas atividades acadêmicas fora da minha área de formação. Era nova na instituição e acabei me sujeitando a lecionar Química Geral e Aplicada para três turmas, Saúde Ambiental para o curso de Enfermagem, assim como Informática Básica”, lembra, ressaltando que por falta de domínio do assunto, dava apenas conceitos gerais, sendo alvo de brincadeiras por parte dos alunos.

Segundo Rosaria, buscando evitar a continuidade do seu desvio funcional, interrompido apenas entre 2008 e 2010, durante seu afastamento para o mestrado, recorreu por meio de memorando à coordenação do curso de Ciências: Biologia e Química, relatando sua falta de preparo e conhecimento aprofundado para ministrar as disciplinas de Química Geral e Química Orgânica, lançadas como sua atribuição no portal do Professor, no primeiro semestre de 2011, porém, mais uma vez, foi vítima de assédio moral, tendo seu pedido ignorado durante 30 dias, sendo obrigada a reencaminhar o documento.

“Infelizmente após um longo desdobramento, incluindo consultas entre a coordenação e a Pró-Reitoria de Ensino de Graduação (Proeg), tive a informação de que as disciplinas não deveriam ficar sem professor para que as atividades não fossem prejudicadas, como se a presença do docente, desassociada ao seu conhecimento, fosse suficiente para garantir a plena formação do discente”, afirma.

Instruída por outros professores, que também sofrem assédio, a passar seminários aos alunos e assumir estágios em licenciatura, com o objetivo de mascarar sua falta de domínio do conteúdo e de didática, a professora não esconde a frustração por estar sendo impedida de aplicar e repassar seus conhecimentos em Geologia.

“A universidade deveria ser a primeira a fomentar e incentivar a aprendizagem. Passei em um concurso para minha área de conhecimento e o Consad mesmo assim insiste em manter o parecer contrário à minha transferência para a capital, onde posso desempenhar minhas atividades de ensino, pesquisa e extensão”, desabafou, esclarecendo que, no entendimento do Conselho, é necessário que um professor da capital assuma sua vaga em Coari.

Em Coari, apenas os cursos de Biologia e Química, ainda assim no 5º período, contam com uma disciplina ligada à Geologia.
Também atuando no ISB/Ufam, desde 2006, a doutora em Genética Molecular Humana, professora Izabel Heckmann conta que desde que chegou à unidade acadêmica passou a ser perseguida e “tratada de forma diferenciada” pela direção, frente a alguns colegas. Responsável pela criação do Laboratório de Genética Molecular Humana (LABGEN), a professora afirma que um parecer pondo em xeque a real necessidade do espaço e exigindo a sua destinação exclusiva ao ensino, apesar da pesquisa e extensão comporem o tripé da Universidade, deixou claro a onda de humilhações que estavam por vir.

“Fui informada por colegas que a intenção da direção era me tirar do laboratório, sendo sugerida inclusive a adição de um artigo por parte da comissão responsável, caso necessário”, afirma, ressaltando que as chaves do laboratório chegaram a ser trocadas para impedir seu acesso ao local de trabalho.

De acordo com a professora, os gritos, ofensas e ameaças começaram a se intensificar a partir de 2010, quando perdeu o direito de coordenar o LABGEN, chegando ao ponto de ser agredida fisicamente com um empurrão por um membro da direção da unidade, quando transitava por um corredor ao término do expediente.

Seu isolamento dos demais colegas, com o objetivo de fragilizar suas relações interpessoais, e o corte das listas de reagentes em 2009 e 2010, inviabilizando as atividades do LABGEN e gerando prejuízos à Ufam, também estiveram nas práticas de assédio moral vivenciadas em Coari, segundo Izabel.

“Quando houve a alocação dos professores nas novas salas, me senti punida ao ter minha mesa de trabalho instalada em um laboratório vazio, localizado em outro bloco. Devido o corte de reagentes, a Ufam arcou com as despesas de transporte e alimentação ao enviar os alunos finalistas para desenvolverem o estágio em Manaus, devido à falta do material em Coari”, lembra, destacando que também teve projetos de Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) reprovados, com pareceres alegando a existência de projetos já prontos, sem que uma única amostra tivesse sido processada.

De acordo com Izabel, a exposição pejorativa da sua imagem ultrapassou o ambiente universitário, ao ser intimada a comparecer à delegacia por ter, supostamente “passado por cima da autoridade da coordenadora” ao encaminhar seu projeto do Simpósio Multidisciplinar de Biotecnologia Aplicada à Saúde (SIMBIOTECS) diretamente a Pró--Reitoria de Extensão e Interiorização (PROEXT), por desconhecer a existência do Comitê de Extensão do Interior (COMEXI).

“Normalmente eram atribuídas a mim as disciplinas de outros cursos, que não os da biotecnologia”, relata.
Cansada das humilhações e perseguições, a professora conta que, no dia 17 de março de 2010 protocolou denúncia (nº23105.005248/2010) junto à Procuradoria, que sugeriu a abertura de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD). No entanto, a Comissão para o PAD não foi instaurada.

“Quase três anos se passaram e a Comissão não foi constituída, nada foi apurado, ao contrário, os problemas só aumentavam. Inclusive, a providência tomada pela Universidade foi aposentar meu perseguidor, dando a ele 24% de gratificação e agradecendo os bons serviços prestados durante o exercício do cargo. Para mim, um ato repugnante”, desabafa.

Aprovada em concurso público para ingresso na Ufam, em 1994, no Instituto de Ciências Humanas e Letras (ICHL/ Manaus) a doutora em linguística Sandra Campos revela que ainda hoje convive com os problemas de saúde acarretados pelo assédio moral sofrido ao longo de mais de uma década. Hipertensão, depressão, perda do interesse pelo trabalho e necessidade de utilização de remédios controlados estão entre os prejuízos trazidos pela perseguição exercida por superiores e colegas de trabalho do Departamento de Letras.

“O assédio começou assim que ingressei na universidade. Por não compactuar com as humilhações e perseguições exercidas contra outros docentes, acabei me transformando também em um alvo dessas pessoas que infelizmente dominaram por muito tempo o departamento”, conta.

Segundo Sandra, os assediadores adotavam a estratégia de expor a vida de seus desafetos em reuniões departamentais, ironizando condutas e torturando psicologicamente as vítimas. A professora destaca que a desqualificação do profissional frente aos alunos e aos demais professores também não era rara.

Lotada hoje no Departamento de Comunicação Social da Ufam (Decom/ Ufam), a professora afirma que realizou seu mestrado, em 2002, sem a disponibilização de bolsa auxílio por parte da instituição, tendo que custear o curso com recursos próprios e com ajuda de custo por intermédio da Fapeam.

De acordo com Sandra, que hoje se recupera das humilhações, tanto a reitoria como a vice-reitoria foram procuradas, à época, para solucionar o caso, mas o único retorno recebido foi a manifestação de solidariedade da Administração Superior.

Adua repudia assédio moral dentro da academia

Preocupado com as agressões sofridas pelos docentes, dentro da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), o presidente da Adua, José Belizario afirma que a entidade vem realizando um levantamento oral e documental sobre os casos de assédio moral ocorridos em cada uma das unidades acadêmicas da Ufam, de Manaus e fora da capital.

“Nossas visitas têm o objetivo de coletar todas as situações de assédio vividas dentro da Ufam, para que de posse das provas necessárias, a Adua agende uma audiência com a reitoria e exija a tomada urgente de providências para sanar essas ações nefastas”, disse.

A abertura de Processos Administrativos Disciplinares (PADs) contra os assediadores e, posteriormente a formalização de uma denúncia no Ministério Público Federal (MPF) estão entre as providências a serem tomadas pela Adua, caso a reitoria se recuse a solucionar o problema em tempo hábil.

Segundo Belizario, mesmo o assédio moral sendo uma prática tão antiga quanto as próprias relações de trabalho, sua existência é inaceitável no ambiente acadêmico, destinado a formação intelectual e que deveria ser o primeiro a dar exemplo à sociedade.
“Algumas pessoas se comportam dentro da Universidade como se ainda estivessem no período da Ditadura Militar, tendo como única diferença o modus operandi sutil e camuflado”, criticou.

Fonte: Adua



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